Finalmente conseguimos ver como a água conduz eletricidade

Por , em 15.12.2016

Mais de 200 anos depois que os cientistas começaram a investigar como as moléculas de água conduzem a eletricidade, uma equipe finalmente testemunhou isso acontecendo pela primeira vez. Não é nenhuma surpresa que a água naturalmente conduz a eletricidade incrivelmente bem – na verdade nós sabemos disso desde os primeiros anos de escola. Mas apesar deste ser um processo fundamental, ninguém tinha sido capaz de descobrir como isso realmente acontece no nível atômico.

“Este processo fundamental da química e da biologia não tinha uma explicação firme”, diz Anne McCoy, da Universidade de Washington, nos EUA. “E agora nós temos a parte faltante que nos dá o retrato maior: como os prótons essencialmente ‘se movem’ através da água”.

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Os pesquisadores, liderados por Mark Johnson, da Universidade de Yale, também nos EUA, foram capazes de testemunhar prótons –  partículas subatômicas carregadas positivamente – sendo passados de molécula em molécula de água. Para isso, eles usaram algo chamado  espectroscopia, um processo que permite que os pesquisadores joguem luz em moléculas e vejam o que está acontecendo dentro delas.

Revezamento molecular

Curiosamente, embora a água que você veja no mundo ao seu redor seja um grande condutor de eletricidade, a água totalmente pura, que raramente é encontrada fora do laboratório, não conduz eletricidade, por causa de sua falta de elétrons livres.

Mas, na natureza, praticamente toda a água está misturada com sedimentos e minerais, que ionizam moléculas de água e permitem-lhes conduzir a corrente.

Até agora, tudo o que os pesquisadores realmente sabiam sobre esse processo era que o H2O passa prótons de molécula a molécula via seu átomo de oxigênio, como uma corrida de revezamento molecular.

Este processo é chamado mecanismo de Grotthuss, e foi descrito primeiramente pelo químico Theodor Grotthuss, em 1806.

“Os átomos de oxigênio não precisam se mover muito”, explica Johnson. “É como o pêndulo de Newton – o objeto formado por uma linha de bolas de aço, cada uma suspensa por uma corda. Se você joga uma bola para que ela atinja a linha, apenas a última bola do outro lado se afasta, deixando as outras imóveis”.

Você pode ver uma ilustração do mecanismo de Grotthuss no gif abaixo:

Mas, até recentemente, este gif era aproximadamente tão detalhado quanto nosso entendimento sobre o assunto. Embora os pesquisadores tivessem uma boa ideia de como esse mecanismo funcionava superficialmente, os detalhes de exatamente como isso acontecia permaneciam frustrantemente obscuros.

Fotografia embaçada

Assim, nos últimos 200 anos, os pesquisadores têm procurado uma maneira experimental de acompanhar as mudanças estruturais nas moléculas de água à medida que conduzem a eletricidade – algo que se provou ser incrivelmente desafiador.

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Nos últimos anos, os pesquisadores tentaram fazer isso usando a varredura infravermelha para monitorar o progresso, mas os resultados saíram parecendo uma fotografia embaçada, sem nenhum detalhe discernível. “Parecia que este embaçamento seria muito severo para permitir algum dia uma ligação convincente entre cor e estrutura”, explica Johnson.

Para descobrir isso de uma vez por todas, Johnson e sua equipe encontraram uma maneira de congelar rapidamente o processo químico, de modo que instantâneos momentos no processo podem ser isolados e congelados no tempo, permitindo-lhes obter um olhar mais atento.

Eles usaram cinco moléculas de “água pesada” – água feita a partir do isótopo de hidrogênio de deutério – e depois refrigeraram as moléculas para perto do zero absoluto (-273,15 graus Celsius).

Quando eles fizeram isso, tudo ficou mais devagar e, de repente, as imagens dos prótons em movimento se tornaram muito mais claras. “Em essência, descobrimos uma espécie de Pedra de Rosetta que revela as informações estruturais codificadas em cores”, disse Johnson. “Fomos capazes de revelar uma sequência de deformações combinadas, como os quadros de um filme”.

Mistérios da água

O novo entendimento fornecerá uma visão crucial sobre a condutividade da água – um fenômeno que nos mantém vivos, e é crucial para muitas reações químicas na Terra. Mas também pode ajudar a explicar outros mistérios, como o longo debate sobre se a superfície da água é mais ou menos ácida do que o resto do seu volume. Esta nova técnica de imagem poderia responder a essa pergunta de uma vez por todas.

Ela também pode lançar alguma luz sobre alguns dos outros recentemente descobertos comportamentos estranhos da água, como a presença de uma misteriosa segunda fase líquida, e sua capacidade estranha de congelar em ponto de ebulição quando confinada a nanotubos de carbono.

A equipe agora quer realizar os experimentos novamente com mais moléculas de água, bem como outras moléculas pequenas, para ver como a condutividade muda. Pode parecer inútil olhar tão profundamente em processos que já sabíamos que existiam, mas este tipo de investigação fundamental é a chave para a compreensão do mundo que nos rodeia.

Afinal de contas, é somente quando realmente sabemos como a matéria se comporta no menor nível que nós teremos uma chance de descobrir o resto do Universo. E a água, apesar do quão onipresente é, é uma das moléculas mais estranhas que existem. [Science Alert]

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