Implante cerebral faz homem paralisado voltar a usar a mão

Por , em 15.04.2016

Graças a um implante cerebral, Ian Burkhart pode usar a mão para jogar videogame pela primeira vez desde o acidente em que quebrou o pescoço há seis anos. A descoberta, publicada na revista Nature, é o primeiro exemplo de uma pessoa que vive com paralisia e recupera a capacidade de mover uma parte do corpo com o pensamento.

Burkhart tinha 18 anos quando mergulhou inesperadamente em águas rasas enquanto estava de férias com os amigos. O impacto danificou severamente a sua medula espinhal e o deixou paralisado do peito para baixo. Mas um chip colocado no lado esquerdo do seu cérebro agora permite que o jovem de 24 anos de idade leve os sinais de retransmissão de seu cérebro para para seu braço direito.

A tecnologia, que ainda não está disponível para outros pacientes, permitiu que Burkhart agarrasse copos e até mesmo movesse seus dedos independentemente um do outro para jogar um jogo que se assemelha ao famoso Guitar Hero. Por causa do sucesso de Burkhart, os pesquisadores acreditam que a tecnologia poderia um dia ajudar pessoas tetraplégicas a recuperar alguma autonomia.

“Eu sei em primeira mão o que foi tirado de mim depois da minha lesão”, disse Burkhart a repórteres durante uma conferência de imprensa. “Pela primeira vez, quando eu fui capaz de abrir e fechar a mão, isso realmente me deu essa sensação de esperança para o futuro”.

Contornando a paralisia

Estima-se que existam 130 mil pessoas com lesões medulares só no Brasil. No caso de Burkhart, o prejuízo para a sua coluna o deixou incapaz de andar e movimentar os braços abaixo do bíceps. Do ponto de vista neurológico, isso significa que quando ele tenta mover um dedo, os sinais que o cérebro envia para a sua mão estão bloqueados. Para os pesquisadores que estudam a paralisia, essa desconexão é difícil de corrigir. É por isso que alguns cientistas pensam que pode realmente ser mais fácil redirecionar esses sinais e lesões e contornar a paralisia. Foi exatamente isso que eles fizeram – usando um implante do tamanho de uma borracha.

O sistema que permite que Burkhart mova os dedos consiste em três partes principais: o chip minúsculo no cérebro, um computador e uma manga cheia de eletrodos colocados em seu antebraço. Quando Burkhart pensa em um movimento da mão, o implante detecta os sinais em seu cérebro e os envia para um computador. Em seguida, o computador os decifra e retransmite as informações para a manga em volta do seu braço direito. A partir daí, a manga utiliza impulsos elétricos para provocar contrações musculares que permitem a Burkhart realizar o movimento na mão em que ele está pensando. Então, de certa forma, o computador funciona como um tradutor que retransmite informações do cérebro para os músculos do paciente.

Aperfeiçoar a tecnologia foi um processo de anos que começou antes mesmo de Burkhart receber o implante. Nos primeiros estágios, há três anos, os pesquisadores passaram muito tempo captando imagens do cérebro de Burkhart conforme ele se visualizava realizando movimentos de mão que os pesquisadores projetavam em uma tela. Durante estas sessões, os cientistas registraram os sinais cerebrais e tentaram associá-los a movimentos manuais correspondentes.

Em abril de 2014, Burkhart passou por uma longa cirurgia de três horas para colocar o implante em seu cérebro. Dois meses mais tarde, ele moveu os dedos pela primeira vez, embora na época, os movimentos não o tenham ajudado a fazer muita coisa. Agora, Burkhart pode pegar um telefone e manter uma colher em sua mão. Para praticar o movimento dos dedos, Burkhart joga Frets on Fire, um videogame que se assemelha a Guitar Hero, mas modificado para ser jogado com uma mão só.

“Ele não apenas pega objetos, mas está sendo capaz de manipulá-los. Ele pode alternar entre um aperto com energia, como para pegar um copo e então pode mudar para um aperto menor para pegar um pequeno objeto, como uma vareta, e realmente manipular isso e desempenhar algumas habilidades motoras mais sofisticadas”, diz Chad Bouton, neurocientista do Instituto Feinstein de Investigação médica, coautor do estudo (a tecnologia foi inventada pelo Battelle Memorial Institute, empregador anterior de Bouton). “Isto é algo pioneiro; é a primeira vez que algo assim foi feito e é um grande passo em frente neste campo”.

Mais eletrodos

Mesmo que Burkhart possa executar algumas tarefas complexas, ele ainda não pode espalhar seus dedos para digitar em um teclado, por exemplo, e tem muito pouco controle sobre a força que os dedos aplicam atualmente em um determinado objeto. Isso porque o chip em seu cérebro contém apenas 96 eletrodos, o que não é suficiente para traduzir os movimentos das mãos de forma precisa. Para corrigir isso, os pesquisadores querem aumentar o número de eletrodos para dois mil.

Eles também gostariam de comprimir o computador para fazê-lo caber inteiramente dentro do implante e se livrar dos fios. Se eles puderem fazer tudo isso, as pessoas que vivem com paralisia podem realmente ser capazes de usar o sistema em movimento, afirma Bouton. E isso pode fazer com que seja possível usar a tecnologia para ajudar as pessoas a recuperar algum movimento em suas pernas também.

Dito isto, o sistema ainda é experimental. Bouton não quis dizer qual é o custo do sistema atual, mas é bastante claro que a melhoria não vai sair barato. Há também algumas questões que cercam o tempo que o implante pode ser capaz de permanecer dentro do cérebro sem ser rejeitado. “Para ser honesto não houve ainda um número suficiente de pessoas com ele em seus cérebros para saber quanto tempo realmente vai durar”, diz Nick Anetta, da Battelle Memorial Institute, que também participou do estudo. “Mas achamos que pode permanecer no cérebro durante cinco anos”.

Devido a isso, o sistema provavelmente não estará pronto para uso fora do laboratório tão em breve. Mas isso não significa que Burkhart vai ser a primeira e última pessoa a usar o implante; um segundo paciente está programado para ser estudado neste verão, dizem os pesquisadores.

“Neste momento estamos apenas no ambiente clínico, mas com número suficiente de pessoas trabalhando e com atenção suficiente, é algo que eu vou ser capaz de usar na minha casa”, disse Burkhart. “Isso é algo que está funcionando, eu vou ser capaz de usar minha mão de novo”, alegra-se. [The Verge]

1 comentário

  • EvandroJGC:

    Caraca, deve que servirá até pra quem tem ALS, como Jason Becker (ou Stephen Hawking)”

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