Branqueamento sem precedentes de corais pode matar recifes pelo mundo todo

Por , em 13.04.2016
Tartaruga nada sobre coral branqueado perto de Heron Island, no sul da Grande Barreira de Corais

Tartaruga nada sobre coral branqueado perto de Heron Island, no sul da Grande Barreira de Corais

Kim Cobb, cientista marinha no Instituto de Tecnologia da Geórgia, nos EUA, esperava encontrar corais danificados quando mergulhou nas águas azuis profundas de Kiritimati Island, um atol remoto do Oceano Pacífico.

Ainda assim, ela ficou chocada com o que viu. “Todo o recife estava coberto com uma penugem marrom-avermelhada”, disse quando voltou para a superfície. “É outro mundo. Algas têm crescido ao longo do coral morto. Foi devastador”.

O dano em Kiritimati é parte de um branqueamento em massa dos recifes de coral em todo o mundo. Esse é o pior já registrado.

Os cientistas acreditam que o estresse térmico de vários eventos climáticos, incluindo o mais recente e severo El Niño, agravado pelas mudanças climáticas, tem ameaçado mais de um terço dos recifes do planeta. Muitos podem nunca se recuperar.

Crise que afeta uma grande população

Os recifes de coral são “incubadores” cruciais do ecossistema do oceano, fornecendo alimentos e abrigo a um quarto de todas as espécies marinhas, e apoiando populações de peixes que alimentam mais de um bilhão de pessoas.

Eles são compostos de milhões de animais minúsculos, chamados pólipos, que formam relações simbióticas com algas.

Estima-se que 30 milhões de pescadores e famílias dependam dos recifes para o seu sustento, mais de um milhão só nas Filipinas. Na Indonésia, peixes suportados pelos recifes são a principal fonte de proteína.

“Esta é uma enorme e ameaçadora crise planetária, e não estamos fazendo nada sobre isso”, disse Justin Marshall, diretor do CoralWatch na Universidade de Queensland, na Austrália.

[box type=”shadow”]O branqueamento ocorre quando calor elevado e o brilho do sol fazem com que o metabolismo das algas – que dão aos recifes de coral suas cores intensas – acelerem até saírem fora de controle, e comecem a criar toxinas. Os pólipos recuam.

Se as temperaturas caem, os corais podem se recuperar, mas alguns podem permanecer vulneráveis à doença. Se o estresse de calor continua, eles morrem de fome.[/box]

O perigo continua

Recifes danificados ou agonizantes foram encontrados a partir de Réunion, ao largo da costa de Madagascar, até East Flores, na Indonésia, e de Guam e Havaí, no Pacífico, até Florida Keys no Atlântico.

O maior branqueamento, na Grande Barreira de Corais da Austrália, foi confirmado mês passado. Em uma pesquisa com 520 recifes individuais que compõem a parte norte da barreira, cientistas encontraram apenas quatro sem sinais de branqueamento. Quase mil quilômetros de recifes, muitos que anteriormente estavam em bom estado, tinham sofrido branqueamento significativo.

Em pesquisas de acompanhamento, os cientistas notaram que metade do coral que tinham visto havia morrido. Terry Hughes, da Universidade James Cook, em Queensland, na Austrália, que participou da pesquisa, advertiu que mais coral pode sucumbir se a água não se refrescar em breve.

Eventos confluentes

Os cientistas dizem que o branqueamento global é o resultado de uma confluência incomum de eventos, que aumentaram as temperaturas das águas já elevadas pelas mudanças climáticas.

Por exemplo, no Atlântico Norte, um bloqueio do fluxo normal do ar polar para o sul em 2013 deu início ao primeiro de três invernos mais quentes do que o normal, fenômeno que chegou até o Caribe.

Além disso, uma grande onda de calor formada no Pacífico no início de 2014, que se esticou ao longo da costa oeste da América do Norte, aumentou em quatro graus centígrados a temperatura das águas circundantes, e tem sido responsabilizada por uma série de fenômenos estranhos, incluindo o encalhe de leões-marinhos na Califórnia e o avistamento de um peixe tropical, gaiado, no Alaska.

2015 ainda viu o mais poderoso ciclo climático El Niño em um século, que espalhou calor através do Pacífico, branqueando recifes de Kiritimati à Indonésia, e atravessando o Oceano Índico até Réunion e Tanzânia.

Pior branqueamento mundial já registrado

“Estamos vivendo o mais longo evento de branqueamento mundial já observado”, disse C. Mark Eakin, coordenador do Coral Reef Watch na Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos EUA. “E vamos perder um monte de recifes durante este evento”.

Recifes que levam séculos para se formar podem ser destruídos em semanas. Corais individuais podem sobreviver a um branqueamento, mas branqueamentos repetidos podem matá-los.

Prever a duração deste branqueamento ou o próximo é difícil. Dr. Eakin acredita que continue por mais nove meses. Os cientistas não serão capazes de medir a extensão total dos danos até que o evento esteja terminado.

O que está claro é que esses branqueamentos estão acontecendo com frequência e ferocidade cada vez maiores. Eventos anteriores, em 2010 e 1998 (que matou cerca de 16% dos corais do mundo), não parecem ter sido tão extensos ou prolongados.

Mudança climática

Recifes branqueados em 2014, como na Flórida e no Caribe, não tiveram tempo de se regenerar antes de sofrer mais estresse térmico no ano passado. Eles estão prestes a entrar em um terceiro ano consecutivo de branqueamento, algo que nunca aconteceu antes.

Ove Hoegh-Guldberg, diretor do Instituto de Mudança Global da Austrália, observou que 2015 foi o ano mais quente já registrado, tanto em terra quanto nos oceanos – quebrando o recorde estabelecido apenas no ano anterior.

“O aumento das temperaturas devido às alterações climáticas têm empurrado os corais além de seus níveis de tolerância”, decretou.

No caso de Kiritimati, em 2015, a água no atol ficou 10 graus mais quente do que o normal, e nunca se resfriou o suficiente para permitir que o coral se recuperasse. “O pior aconteceu”, disse Kim Cobb. “Isso mostra como as mudanças climáticas e de temperatura estão afetando estes recifes no longo prazo. Este nunca mais será o mesmo”. [NYTimes]

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