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Por esta causa devemos ouvir os criacionistas sobre a evolução

Será que podemos aprender com os criacionistas, aquelas pessoas que negam a evolução? Segundo o professor emérito de química da Universidade de Glascow, na Escócia, e anti-criacionista convicto, Paul Braterman, a resposta para essa pergunta é sim. “Não basta dizer, como Richard Dawkins notoriamente o fez, que “se você encontrar alguém que afirma não acreditar na evolução, essa pessoa é ignorante, estúpida ou insana”. Isso é um beco sem saída”, diz ele. “Conversas são vias de dois sentidos, e se eu quero que um criacionista aprenda comigo, então eu devo pelo menos, a princípio, estar pronto para aprender com ele”, argumenta.

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Mas como fazer isso? Braterman diz que, após escrever recentemente um artigo sobre a evolução, trocou várias correspondências com vários criacionistas e, por isso, disse acreditar que seria útil examinar seus argumentos sobre seus méritos, apenas para aprimorar os nossos próprios.

“Os criacionistas sempre perguntam sobre a origem de sistemas complexos, isto é, sistemas que exigem muitas partes interagindo. Como uma parte poderia ter evoluído a menos que as outras já estivessem no local? Pense no olho com a necessidade de retina, lente e pupila; flores e polinizadores; masculino e feminino; e assim por diante”. Para responder este questionamento, ele diz ser preciso pensarmos em três níveis.

Dentro da mente de um criacionista

“No nível mais geral, os criacionistas estão dizendo que, quando não entendemos como algo poderia ter acontecido por meios naturais, devemos atribuí-lo a uma intervenção sobrenatural. Considero isto um argumento tóxico, que impede uma investigação mais aprofundada”, critica.

“Subindo um nível, esses argumentos assumem que um sistema complexo não funcionaria, a menos que todas as suas partes já estejam em vigor e funcionando plenamente. Bem, talvez não funcione tão eficazmente, ou da mesma forma, mas mesmo um sistema incompleto servirá como ponto de partida para a evolução, com as outras partes adicionadas mais tarde”, argumenta o especialista.

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“Considere, por exemplo, o sistema de coagulação do sangue, que envolve a operação de um grande número de etapas sucessivas para parar o sangramento, e o flagelo bacteriano, um tipo de “motor” usado por algumas bactérias para impulsionar-se, através da ação combinada de muitas moléculas de proteínas diferentes”.

Braterman diz que criacionistas mostram esses sistemas como exemplos de design inteligente, pensado e executado por um ser superior. Ao fazer isso, entretanto, eles ignoram o quanto já sabemos sobre como esses sistemas evoluíram a partir de sistemas mais simples.

O pesquisador diz que, em última instância, o que os criacionistas estão fazendo ao levantar essas questões é impulsionar os estudos. “Finalmente, indo até as especificidades, o que as perguntas dos criacionistas estão realmente fazendo é estabelecer uma série de excelentes programas de pesquisa, muitos deles (como estudos de coagulação do sangue e flagelo bacteriano) já bem encaminhados”.

Ele admite, inclusive, ter sido influenciado por esses questionamentos em suas próprias pesquisas.

“Minha própria leitura certamente se beneficiou de questões sobre o olho, a aparência de novas espécies, a evolução dos parasitas e se toda a evolução é progresso (a resposta, surpreendentemente, é “não”, uma vez que a maioria das mutações são aleatórias e o fato de uma mutação ocorrer ou não, não está relacionado com a quantidade de uso que ela pode ter. Por isso, algumas são benéficas, algumas são neutras e algumas podem sobreviver por acaso, mesmo que sejam prejudiciais ao organismo)”, esclarece.

Grandes questões

“Outra questão comum: se evoluímos dos macacos, por que ainda existem macacos? Resposta: nós não evoluímos dos macacos atuais. Nosso último antepassado comum com os macacos viveu há mais de 25 milhões de anos, e todos nós mudamos um pouco desde então. E quanto aos laços que faltam entre nós e os macacos, e outras lacunas no registro fóssil? O próprio Darwin não descreveu a pobreza do registro fóssil em seu tempo como a mais grave objeção a sua teoria?”, responde Braterman.

“No entanto, as coisas já estavam mudando em sua vida, com a descoberta de um fóssil de Archaeopteryx, um gênero de dinossauro semelhante a um pássaro, a tempo da 4ª edição de Origem das Espécies”, aponta.

O professor diz que ainda existem links ausentes, e sempre haverá. “Mas agora temos centenas de milhares de fósseis, todos no lugar certo em sua sequência geológica, e se, como os criacionistas, rejeitarmos a evolução, cada um desses deve ser interpretado como um ato de criação separado. O registro é, inevitavelmente, incompleto, mas a criação separada não deveria ter deixado nenhum registro”, argumenta.

“Considere, por exemplo, o nosso conhecimento da evolução humana. Um século atrás, as únicas espécies fósseis relevantes eram o homem de Java (agora conhecido como Homo erectus) e, é claro, nossos primos Neanderthais. Então, em 1924, veio a descoberta do crânio Taung Child, agora classificado como Australopithecus africanus, e desde então um fluxo constante, não mostrando uma, mas três ou quatro linhagens, das quais somos os únicos sobrevivente.

Os criacionistas levantam inúmeras outras questões, e questões importantes, tanto científicas quanto filosóficas.

Por exemplo, eles dizem que nós não percebemos a evolução acontecendo ao nosso redor – mas nós vemos, na verdade, o tempo todo – a única razão pela qual precisamos de uma nova vacina contra a gripe todos os anos é que o vírus da gripe está evoluindo rapidamente.

Questões ainda maiores

Como nosso último antepassado comum com os chimpanzés era, eles perguntam. E como nossa diferença considerável para os chimpanzés pode ser alcançada com tão pouca diferença em nosso DNA? “Boas perguntas”, diz Braterman, “e ainda estamos no processo de descobrir as respostas. A origem da vida? Não sabemos, mas há muito trabalho interessante. Note, no entanto, que esta não é realmente uma questão sobre a própria evolução biológica, mas sobre o que teve que acontecer antes que a evolução começasse”.

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“E quanto à ciência histórica (o estudo do passado) versus a ciência operacional que podemos repetir no laboratório – os filósofos têm muito a dizer sobre isso e explicar por que é equivocado reivindicar, como fazem os criacionistas, que a ciência histórica é inferior”.

Se o registro nos diz que algo aconteceu, defende o professor, devemos aceitar que aconteceu, mesmo que não possamos explicar como. Um exemplo chave para ele é a antiguidade do sistema solar, estabelecida a partir do registro rochoso em um momento em que parecia fisicamente impossível para o Sol ter gerado tanta energia por tanto tempo.

“E, finalmente, os criacionistas se queixam, a evolução não explica a consciência, define a moral ou dá sentido e propósito às nossas vidas. Mas devíamos esperar que ela fizesse isso? Há muito para pensar aqui; muito para aprender”, garante.

“Com a evolução, como com todo o resto, somos cegos para o nosso próprio viés de confirmação. Vemos o que queremos acreditar, e evitamos dúvidas que possam nos deixar desconfortáveis. Mas tais perguntas são, de longe, as mais instrutivas, e devemos agradecer aqueles que as criam, quer que eles desejem nossos agradecimentos ou não”, finaliza. [Science Alert]

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