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A arte de ensinar e a arte de aprender

O texto a seguir foi reproduzido, com permissão da editora, do livro Introdução ao conhecimento logosófico, de González Pecotche.

Entre a arte de ensinar e a arte de aprender existe uma grande diferença, não obstante acharem-se ambas intimamente vin­culadas. Em geral, quem começa a aprender o faz sem saber por quê; pensa que é por necessidade, por uma exigência de seu temperamento, por um desejo ou por muitas outras coi­sas, às quais costuma atribuir esse porquê. Mas quando já co­meça a vincular-se àquilo que aprende, vai despertando nele o interesse e, ao mesmo tempo, reanimam-se as fibras ador­mecidas da alma, que começa a buscar, chamando ao estudo, os estímulos que irão criar a capacidade de aprender.

Porém, que é o que o ser aprende, e para que aprende? Eis aqui duas indagações às quais nem sempre se podem dar res­postas satisfatórias. Aprende-se e continua-se aprendendo, ad­quirindo hoje um conhecimento e amanhã outro, de igual ou de diversa índole, Primeiro se aprende para satisfazer às ne­cessidades da vida, tratando de alcançar, por meio do saber, uma posição, e solucionar ao mesmo tempo muitas das situa­ções que a própria vida apresenta. Quando se completa a me­dida do estudo, parece como se na mente se produzisse uma desorientação: o universitário, ao conquistar seu título, aquele outro ao culminar sua especialização. Enfim, quando essa vi­da de estudos está terminada, começam as atividades nas dife­rentes profissões, o que paralisa a atividade anterior da mente dedicada ao estudo; muitos até chegam a esquecer aquela cons­tante preocupação que antes tinham, de alcançar cada dia um conhecimento a mais, encontrando-se como os que, tendo fi­nalizado o percurso de um caminho, não sentem a necessidade de dar um passo além, por não acharem o incentivo de um obje­tivo capaz de o propiciar. Eis aí uma das causas de onde pro­vém tanta desorientação nos seres humanos.

De outra parte, os que, além dos estudos da profissão aprendem outras coisas, o fazem muitas vezes sem ter disso verdadeira consciência. Acumulam este, esse e aquele conheci­mento, mas depois – salvo exceções – não sabem o que fa­zer com eles; não sabem usá-los em seu próprio bem, nem no bem dos demais. Assim é como vêm aprendendo ao acaso, em uma e outra parte, sem ter um guia que os leve para uma meta segura e lhes permita fazer de tudo uma aprendizagem útil pa­ra si mesmos e para seus semelhantes.

Ao dar a conhecer seus ensinamentos, a Logosofia mani­festa que existe uma imensidão desconhecida para o homem, na qual este deve penetrar. Dá a conhecer, além disso, que enquanto se interna nessa imensidão que é a Sabedoria, isto é, enquan­to aprende, pode também ensinar, porque a arte de ensinar consiste em começar ensinando primeiro a si mesmo, ou, dito de outro modo, enquanto de uma parte o ser aprende, aplica de outra esse conhecimento a si mesmo e, ensinando a si mes­mo, sabe depois como ensinar aos demais com eficiência.

Dissemos no começo que a arte de ensinar é muito dife­rente da arte de aprender. Com efeito, tratando-se do conheci­mento transcendente, que é o que guia para o aperfeiçoamen­to, não se pode ensinar o que se sabe, se, ao fazê-lo, não vai refletida, como uma garantia do saber, a segurança que cada um deve dar com seu próprio exemplo. Eis aí, justamente, on­de começa a tornar-se difícil a arte de ensinar, porque não se trata de transmitir um ensinamento, ou de mostrar que se sa­be isto ou aquilo; quem assim fizesse, se converteria em um simples repetidor do ensinamento, em um autômato, e seu la­bor careceria de toda eficácia. Já é outra coisa, quando atra­vés da palavra de quem ensina, coincidente com seus atos, vão se descobrindo qualidades relevantes; e outra coisa é, também, quando, no que escuta e aprende, vai se manifestando a capa­cidade de assimilação; então, o que aprende, aprende de ver­dade, e quem ensina, ensina com consciência.

Um ensinamento pode ser transmitido bem ou mal pelo que ensina, mas, o fato de transmiti-lo mal não tem porque implicar má intenção ou má vontade; comumente é transmiti­do de forma errônea, por não o haver entendido bem, vivido e incorporado a si mesmo. Quem faz isto não possui, certa­mente, o domínio do ensinamento, que permite não esquecê­-lo mais; e está longe de ser como aquele que, de posse de uma fórmula, pode reproduzir a qualquer momento o conteúdo da mesma. Esquece o ensinamento quem não teve consciência de­le e, por tal causa, acha-se na mesma situação do que apren­de. Estas particularidades da arte de ensinar e da arte de apren­der devem ser tidas sempre muito em conta.

Para cultivar estas artes, quando se aprende deve-se sem­pre situar a si mesmo na posição mais generosa, qual seja a de aprender sem mesquinhez, a de aprender para saber dar, para saber ensinar, e não com objetivos egoístas, fazendo-o para usufruto próprio, exclusivo, que é, em último termo, a negação do saber.

A Sabedoria logosófica prodigaliza-se, por isso, aos que mais tarde saberão ensinar, aqueles que terão em conta, ao fazê-lo, todos os detalhes que, correntemente, passam inad­vertidos e depois travam o entendimento dos seres.

Quem é generoso ao aprender, é generoso ao ensinar; mas nunca terá que se exceder nessa generosidade, pretendendo en­sinar antes de haver aprendido.

É mister conhecer a fundo a psicologia humana, para des­cobrir todos os subterfúgios que existem no complexo e miste­rioso mecanismo mental do homem.
Quando se inicia a heróica empresa do próprio aperfeiçoa­mento, é necessário acostumar-se a caminhar com firmeza, sem vacilações nem desacertos, buscando sempre a segurança no próprio conhecimento, e, quando aquela não existir, este deve ser cultivado, para que se consiga obter esses frutos que fa­zem, depois, a felicidade interna.

Falando já do conhecimento logosófico, deve-se advertir que, ainda que pareça, este não é igual, nem de longe, ao co­nhecimento comum. Tem uma particularidade que o distingue e que cada um adverte, comprova e confirma, à medida que vai realizando seu processo de evolução consciente. A referida particularidade manifesta-se no fato de que estes ensinamen­tos servem para ser usados na própria vida; aplicando os co­nhecimentos que deles emanam em uma observação diária de si mesmo, obtém-se uma superação constante, que leva a com­preender, mais tarde, o caráter universal do Saber logosófico. Isto deve ser recordado a todo momento, a fimde tratar o ensinamento logosófico como ele é: algo novo para o próprio saber individual, algo que deve tomar-se com todo carinho, com toda dedicação, sem descuidar jamais nenhuma de suas indicações.

O conhecimento transcendente, ou seja, o logosófico, ex­pressa tudo quanto pode o homem conhecer, ao internar-se nos arcanos da Sabedoria. É a tocha convertida em luminária que passando de mão em mão, através das gerações, continua­rá iluminando a vida dos que buscam no aperfeiçoamento de si mesmos a própria inspiração; inspiração que também surge observando os sábios e nobres exemplos que a história tem re­gistrado e que, igualmente, o coração humano registra, quan­do presencia todos aqueles casos em que um homem surge aci­ma dos demais, mostrando os caracteres inequívocos de uma estirpe superior.

A Logosofia tem, pois, a missão de arrancar o homem dos planos inferiores de consciência em que se encontra, para levá-lo gradualmente, passando por processos alternados de supera­ção, a conquistar o domínio consciente de suas possibilidades humanas. É então quando deixa de ser um homem comum, um ser comum, para converter-se em ser superior, capaz de transmitir seus conhecimentos aos demais e auxiliar aos que carecem de vontade para poder sobreviver às penúrias que de­vem suportar na vida.

Quantas vezes não temos ouvido um ser ou outro dizer que desejaria encontrar a si mesmo? Acaso, estas palavras, um tanto angustiadas, não dão a entender que se perderam de vista ou que se extraviaram, desde o momento em que não po­dem encontrar-se? Nestas ou em condições parecidas acodem muitos à fonte logosófica. Não seria o caso de perguntar aqui, como pensam encontrar-se? Os que buscam a si mesmos têm sequer uma vaga suspeita do que em verdade são? Reconhecer-se-iam ao encontrar-se? Teriam formado uma imagem exata daquele a quem buscam? Porque tem sucedido, mais de uma vez que, quando chega a oportunidade de apresentar-lhes o ausente, exclamam ante ele: “Este não sou eu, que esperan­ça!”, e continuam logo a busca, cada vez mais infrutífera. O que acontece, simplesmente, é que forjaram para si uma falsa imagem do que pessoalmente crêem ser, e o resultado é que cada um busca, em vão, ao que sua ilusão adornou generosamente de qualidades e virtudes. Ninguém quer ser, pois, aqui­lo que é na realidade; daí a desilusão ao encontrar-se.

Em presença desta realidade, a Logosofia permite, com seus conhecimentos, realizar um claro discernimento do problema, e auxilia, com elementos de juízo de grande valor, a quem anela superar-se, inclinando-o para a tarefa de realizar um processo consciente que culminará ao converter-se naquilo que antes ha­via imaginado, sem que na realidade o fosse. Desse verdadeiro encontro consigo mesmo surge o despertar promissor de uma vida fecunda, destinada a cumprir altos desígnios de bem.

A vida é o campo experimental onde têm lugar as lutas e onde cada um vence ou é derrotado; mas é, também, o cená­rio onde o espírito se tempera verdadeiramente e onde, pouco a pouco, com vontade e entusiasmo grandes, vai se lavrando um novo e elevado destino.

Tudo isto, naturalmente, convida a refletir com serenida­de. Cada um terá que tomar a decisão de seguir firmemente sob a direção do conhecimento logosófico, ou desistir dele por inércia, arrastado para outros caminhos. Se se toma a decisão de seguir, é necessário caminhar sem se deter, estu­dando, analisando, observando e tirando sempre, de cada ob­servação, felizes conclusões.

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