O mundo está cheio de babacas. Não importa onde você more ou o que você faça – todas as probabilidades indicam que estamos cercado por idiotas. A questão é o que fazer a respeito disso.
Robert Sutton, professor de psicologia da Universidade de Stanford, dedicou-se em busca de uma resposta a essa eterna pergunta. Ele publicou, recentemente, um novo livro – The Asshole Survival Guide – que é basicamente o que parece: um guia para sobreviver aos idiotas que aparecem em nossa vida.
Em 2010, Sutton lançou o livro “The No Asshole Rule”, que se volta à lida com idiotas a nível organizacional. Na publicação, ele oferece um plano para a gestão desse tipo de pessoa no nível interpessoal. Se você tem um chefe idiota, um amigo idiota ou um colega de trabalho idiota, este livro pode ajudá-lo.
A sobrevivência entre babacas, diz Sutton, é uma arte, não uma ciência, o que significa que se pode ser bom ou ruim nisso. Seu livro é sobre como se tornar cada vez melhor nessa habilidade.
O jornalista Sean Illing o entrevistou para falar sobre suas estratégias na lida com idiotas, o que ele quer dizer quando diz que devemos assumir a responsabilidade pelos babacas em nossas vidas e por que ele diz que a autoconsciência é fundamental para reconhecer que o babaca por perto pode ser você.
“Você precisa se conhecer, ser honesto consigo mesmo e confiar nas pessoas ao seu redor para lhe dizer quando você está sendo um idiota”, ele me disse. “E quando eles são gentis o suficiente para lhe informar isso, escute”.
Confira a íntegra da entrevista:
Sean Illing
Como um professor de Stanford decidiu gastar a maior parte de seu tempo pensando em idiotas?
Robert Sutton
Bem, há alguma lógica intelectual nisso. Eu fiz muitas pesquisas sobre a expressão de emoção na vida organizacional, incluindo como lidar com idiotas. Eu não usava essa palavra na época, mas é basicamente isso o que eu fazia. Até fiz um trabalho etnográfico cobrando contas de telefone, quando eu lidava com idiotas durante todo o dia. Eu também fazia parte de um departamento acadêmico que tinha uma regra muito séria: lá, não se podia ser idiota. E nós levávamos isso muito a sério.
Sean Illing
Espere, o quê? Como seria uma política de “proibido babacas” em um departamento acadêmico?
Robert Sutton
Falaríamos sobre isso explicitamente sempre que fosse a hora de contratar alguém. Stanford é um lugar bastante passivo-agressivo, então não estava realmente na cara. Mas se alguém agisse como um idiota, nós gentilmente iríamos abandoná-lo e tornaríamos a vida da pessoa mais difícil. A ideia era evitar a contratação de idiotas, se possível, e se alguém dentro da equipe se comportasse assim, lidar com ele ou ela de maneira coletiva.
Sean Illing
Antes que possamos conversar sobre a sobrevivência entre idiotas, precisamos de um conceito adequado para essa “idiotice”. Pode nos dar uma?
Robert Sutton
Há muitas definições acadêmicas, mas aqui está como eu a defino: um idiota é alguém que nos deixa sentindo degradado, desenergizado, desrespeitado e / ou oprimido. Em outras palavras, alguém que faz você se sentir como um lixo.
Sean Illing
Então, um idiota é alguém que não se preocupa com outras pessoas?
Robert Sutton
Eu faria uma distinção entre idiotas temporários e os certificados, porque todos nós nas condições erradas podemos ser idiotas temporários. Estou falando de alguém que se comporta constantemente assim, que de modo cotidiano trata outras pessoas dessa maneira. Eu acho que é mais complicado do que simplesmente dizer que um idiota é alguém que não se preocupa com outras pessoas. Na verdade, alguns deles realmente se importam – eles querem, intencionalmente, fazer você sentir magoado e chateado, e se divertem com isso.
Sean Illing
Quantas pessoas que procuram estratégias de sobrevivência entre idiotas não percebem que fazem parte do contingente de babacas?
Robert Sutton
Essa é uma ótima pergunta. A razão pela qual eu tenho essa definição de idiotas como alguém que faz você se sentir oprimido, desenergizado, e assim por diante, é que você tem que assumir a responsabilidade pelos idiotas em sua vida. Algumas pessoas realmente são tão melindrosas que acham que todos as estão ofendendo, quando não é nada pessoal. Então, o outro problema é o seguinte: pelo fato de a idiotice ser algo tão contagioso, se você é o tipo de pessoa onde, em todos os lugares que você vai, as pessoas tratam você de forma pior do que as outras, há grandes chances de que você esteja fazendo algo para provocar essa punição.
Pode-se ver isso com Donald Trump. Não quero falar muito sobre ele, mas acho que é parte do que acontece nesse caso. Se você insultar praticamente todo mundo que está ao seu redor, eles vão jogar merda de volta em você.
Sean Illing
Bem, não vou chamar o presidente de idiota aqui, mas eu diria que ele está verificando todas as definições de idiotice que você estabeleceu neste livro.
Robert Sutton
Sim, não vou chamá-lo também, mas concordo com sua avaliação.
Sean Illing
Qual é a maneira mais segura para alguém reconhecer que está sendo um idiota? Eu suponho que a maioria de nós é ocasionalmente assim, mas, em geral, prefere não ser.
Robert Sutton
Absolutamente. Há algumas evidências no livro sobre como poucas pessoas se reconhecem como idiotas em comparação a quantas pessoas dizem que são oprimidas por idiotas. Existe uma grande disparidade. A principal informação que esta pesquisa traz sobre autoconsciência é que a pior pessoa a identificar a idiotice de alguém é o próprio idiota, e as melhores pessoas para isso são as que estão ao redor dele ou que o conhecem, no mínimo, muito bem. O resumo da ópera: idiotas precisam de alguém em sua vida para lhes dizer como estão agindo.
Sean Illing
Ser um idiota não é a melhor estratégia para construir um relacionamento, mas parece se correlacionar com o sucesso profissional. Por que é assim, será?
Robert Sutton
Se você está em uma situação em que as pessoas jogam algo como “eu ganho e você perde” na empresa, então não é necessário nenhum tipo de cooperação entre os concorrentes. Num caso assim, fazer com que as pessoas se sintam feito um lixo pode valer a pena.
Mas há dois problemas nisso. Um deles é que, na maior parte das situações, você realmente precisa da ajuda de alguém. E temos muitas pesquisas que mostram que as pessoas que se doam mais, em vez de apenas receberem benefícios, tendem a um futuro melhor, a longo prazo. Se você estiver jogando um jogo de curto prazo, então, sim, ser um idiota pode trazer alguma vantagem – mas estou bastante convencido de que não funciona dessa maneira na maior parte das situações.
Sean Illing
E, para ser justo, há exemplos de idiotas nos negócios que tentam levar vantagem às custas da própria idiotice. Pensei no ex-CEO da Uber, Travis Kalanick.
Robert Sutton
Certo. Normalmente, há custos muito típicos de ser um idiota no mundo profissional. Quando você está subindo a “escada” corporativa com essa energia, por exemplo, você pode estar prejudicando a organização em que atua, afastando as melhores pessoas, afetando sua produtividade, criatividade e assim por diante.
Sean Illing
Vamos chegar à parte principal do livro, que trata de como lidar com idiotas. Então, me conte, qual a sua melhor estratégia de neutralização da babaquice?
Robert Sutton
Primeiro, depende da quantidade de energia que se possui. E, em segundo lugar, de quanto tempo se tem. Essas são as duas perguntas que precisam de respostas, antes que alguém seja capaz de decidir o que fazer. Supondo que você não tenha o poder Dirty Harry ou não seja o CEO e não pode simplesmente despedir pessoas de que não gosta, acho que é preciso fazer duas coisas em termos de estratégia.
Para começar, você deve definir seu caso. Você também deve construir uma coalizão. Um dos meus lemas é que é preciso conhecer os idiotas que nos rodeiam. Nós já conversamos sobre idiotas temporários X idiotas certificados, mas outra distinção que é realmente importante é que algumas pessoas, como você mencionou no início, são assim e não percebam, mas talvez sejam bem intencionadas.
Nessa situação, você pode ter conversas nos bastidores, informando gentilmente a essas pessoas que estão passando da linha. Esse é um trabalho simples, de persuasão. Mas, caso se trate de alguém que seja como um daqueles idiotas maquiavélicos, que trata os outros feito lixo por acreditarem que assim vão crescer na vida, nesse caso, é melhor sair de perto.
Sean Illing
Vamos tornar isso mais concreto. Supondo que você seja alguém que está lutando contra um chefe idiota. Obviamente, há uma assimetria de poder, então não é tão simples como dizer a ele algumas verdades. Imagino que esta é uma situação comum para muitos leitores interessados em seu livro. Qual é o seu conselho?
Robert Sutton
A primeira pergunta é: você pode sair ou pedir transferência para outro departamento? Se estiver preso à sombra de um idiota certificado, isso significa que você está sofrendo. E se for esse o caso, você deve se afastar – simples assim.
A segunda pergunta é se é necessário suportar: você vai lutar contra isso ou simplesmente aceitar a situação? Se você lutar, precisa de um plano, reunir provas e correr o risco. Em qualquer caso, eu digo às pessoas tentarem manter o menor contato possível com idiotas, e ofereço estratégias para isso em meu livro.
Uma das coisas mais simples – e certamente mais difíceis – que você pode fazer é simplesmente aprender a não se importar. Isso muda todo o ambiente do idiota. Quando ele for desagradável com você, ignore-o. Pense que você chegará em casa naquele mesmo dia e esse idiota não estará lá. Pense que dentro de um ano, talvez, ele não estará em sua vida, mas ainda será o idiota que sempre foi.
Sean Illing
E se o idiota for seu colega de trabalho ou parceiro? Isso exige uma estratégia diferente?
Robert Sutton
Suas chances de se livrar deles, nesse caso, são maiores porque você tem mais poder. Mas há uma maneira mais simples de lidar com uma situação como essa: apenas esfrie a relação. Eu, por exemplo, trabalho no meio acadêmico, o que significa que há muitos idiotas que não podemos mandar para longe, mas se pode dar um gelo. Não temos que convidá-los para eventos ou encontros. Podemos evitá-los educadamente e sorrir para eles, conforme necessário, mas além disso, simplesmente ignorar. É assim que lidamos com idiotas.
Mas há algumas situações em que você pode ter que ser um idiota para sobreviver, porque você não tem escolha a não ser o embate, o confronto. Não é o ideal, mas se é isso que você precisa fazer, então é o que deve ser feito.
Robert Sutton
Certo. Eu tento ver isso sob a perspectiva do leitor. Se alguém tem um longo histórico de assédio, e se o sujeito tem uma personalidade maquiavélica, a única coisa sobre a qual entende é a demonstração de força. Se for esse o caso, a melhor maneira de se proteger é recuar com tudo o que você tem.
Olha, algumas pessoas merecem ser maltratadas. Mais importante, elas precisam ser maltratadas. Às vezes é preciso falar com o idiota no único idioma que eles entendem, e isso significa que você tem que sujar as suas mãos.
Sean Illing
A maioria de nós não quer ser idiotas, mas às vezes somos. Quando acordo pela manhã, por exemplo, eu sou com frequência um idiota rabugento. Eu não quero me levantar por esse ou aquele motivo, então me levanto da cama e passo os primeiros 30 minutos do meu dia andando para cá e para lá feito um babaca. Nem todos os dias é assim, mas acontece e é embaraçoso. Então, acho que a minha pergunta é: como podemos verificar melhor as nossas próprias tendências de idiotice?
Robert Sutton
Primeiro, parece que você é autoconsciente e isso é bom. Mas olhe, há certas situações que transformam a maioria de nós em idiotas, e temos que estar cientes disso e trabalhar no desenvolvimento de técnicas para nos acalmar. A privação do sono, por exemplo, é uma das maneiras mais certeiras de se tornar um idiota. Se você está cansado e com pressa, é provável que você seja um idiota. Se você tem um excesso de poder em uma situação, você corre o risco de se tornar um idiota. Uma coisa que eu aprendi é que diferenças de poder trazem o pior para dentro de nós.
Em última análise, você precisa se conhecer, ser honesto consigo mesmo e confiar nas pessoas ao redor quando lhe dizem que você está sendo um idiota. E, se são gentis o suficiente para dizer isso, ouça.
Sean Illing
Platão argumentou em A República que um tirano, por mais poderoso que seja, sofre no final por corromper sua própria alma. É possível construir um argumento semelhante sobre idiotas – que eles podem ganhar na vida, mas ainda falham como seres humanos.
Robert Sutton
Uau, nunca ouvi a conexão de Platão. Essa não é uma pergunta que eu espero ouvir de um jornalista, mas acho que é o ex-teórico político falando. Devo admitir, eu amo essa conexão. Sabemos que os idiotas têm um efeito corrosivo sobre as pessoas ao seu redor. Existem estudos longitudinais que demonstram de modo bastante claro que as pessoas que, por exemplo, trabalham sob a companhia de idiotas por muitos anos acabam se tornando mais deprimidas, mais ansiosas e menos saudáveis.
Portanto, há provas convincentes de que idiotas são seres humanos corrosivos que prejudicam outras pessoas. Acho que o modo como você descreveu a analogia de Platão é muito mais elegante do que qualquer coisa que eu possa dizer.
No final do dia, se você é um idiota, você é um fracasso como ser humano, porque você promove sofrimento desnecessário. O que mais há a dizer? [Vox]