Cientistas finalmente descobriram um campo de energia invisível e fraco que envolve nosso planeta.
Esse campo é conhecido como “campo ambipolar” — uma ideia que surgiu há mais de 60 anos. Sua descoberta, no entanto, pode mudar como entendemos a Terra e sua história de constante transformação.
“Todo planeta com atmosfera deve ter um campo ambipolar”, afirma o astrônomo Glyn Collinson, do Centro de Voo Espacial Goddard da NASA. “Agora que conseguimos medi-lo, podemos entender melhor como ele afetou a Terra e outros planetas ao longo do tempo.”
A Terra, por mais que pareça apenas um enorme pedaço de rocha flutuando no espaço, está cercada por diversos campos invisíveis. Entre eles está o campo gravitacional, aquele que não entendemos completamente, mas sem o qual não estaríamos por aqui para questionar sua existência. A gravidade também ajuda a manter nossa atmosfera firmemente presa ao planeta.
Outro campo importante é o magnético, gerado pelo movimento do interior da Terra. Este campo protege nosso planeta dos efeitos do vento solar e da radiação, evitando que nossa atmosfera seja varrida para o espaço. Graças a ele, podemos curtir uma brisa na praia sem flutuar.
O Polo Norte da Terra, visto pela missão Endurance. As listras no céu são reflexos na lente. (NASA)
Em 1968, os cientistas começaram a desconfiar de um fenômeno curioso. Durante a era espacial, espaçonaves que sobrevoavam os polos da Terra detectaram partículas supersônicas fugindo da atmosfera. A explicação mais plausível? Um campo elétrico invisível estava puxando essas partículas.
“Esse é o tal campo ambipolar. Ele desafia a gravidade e arrasta partículas para o espaço,” explica Collinson em um vídeo. “Só que nunca conseguimos medi-lo antes porque, bem, não tínhamos a tecnologia certa. Então, construímos a nave Endurance para caçar essa força invisível.”
A expectativa era que o campo começasse a funcionar a cerca de 250 quilômetros de altitude, em uma região chamada ionosfera. Nessa camada, a radiação ultravioleta e solar transforma átomos em íons, separando seus elétrons negativos dos íons positivos.
Os elétrons, sendo mais leves, tendem a tentar escapar para o espaço, enquanto os íons mais pesados preferem descer em direção à Terra. No entanto, o plasma que forma essa parte da atmosfera tenta manter a neutralidade de carga, resultando em um campo elétrico entre as duas partículas para mantê-las conectadas.
O campo ambipolar é chamado assim porque trabalha em duas direções: os íons puxam para baixo e os elétrons empurram para cima.
O efeito disso é que a atmosfera se “infla” como um balão, permitindo que alguns íons escapem para o espaço, o que explica o “vento polar” que vemos.
Esse campo é incrivelmente fraco, o que exigiu que Collinson e sua equipe criassem um equipamento de medição bastante sensível. A missão Endurance, lançada em maio de 2022, alcançou uma altitude de 768 quilômetros, trazendo de volta informações preciosas.
E deu certo! A missão detectou uma mudança de apenas 0,55 volts no potencial elétrico. Pode parecer quase nada – mais fraco que a bateria de um relógio de pulso –, mas é a quantidade exata para explicar o vento polar.
Esse pequeno empurrão de energia é suficiente para lançar íons de hidrogênio ao espaço com uma força 10,6 vezes maior que a da gravidade, fazendo-os viajar a velocidades supersônicas.
Íons de oxigênio, por serem mais pesados, também são elevados, aumentando a densidade da ionosfera em até 271%, comparado ao que seria sem o campo ambipolar.
E o melhor de tudo é que essa descoberta é só o começo. Ainda há muito que não sabemos sobre o campo ambipolar: quanto tempo ele está por aqui, qual o seu real impacto e como ele moldou a atmosfera e a vida na Terra ao longo do tempo.
“Esse campo é uma peça fundamental do funcionamento da Terra,” diz Collinson. “Agora que o medimos, podemos começar a fazer aquelas perguntas mais interessantes e empolgantes.”
O estudo foi publicado na revista Nature.