Quando oito bizarras formigas soldado, com cabeças gigantes, foram coletadas em uma colônia selvagem de Nova York, os cientistas sabiam que tinham achado algo interessante. A descoberta dessas versões gigantes, cujo trabalho é defender o ninho, levou os pesquisadores a criar suas próprias formigas super soldados com a ajuda de hormônios, e assim entender como as formigas, e possivelmente outros insetos sociais, adquirem formas específicas para trabalhos únicos nas colônias.
O que aconteceu é que essas formigas anormais estavam em um estado ancestral, um que não aparece a não ser, aparentemente, em casos acidentais. Esse fenômeno ocasionalmente acontece em alguns lugares, como em baleias que desenvolvem membros ancestrais ou humanos com caudas.
“Já sabemos a um bom tempo que esse tipo de erro acontece”, afirma um dos cientistas do estudo, Ehad Abouheif. “O que estamos mostrando pela primeira vez é que existe um potencial ancestral, e quando provocado pelo ambiente esse potencial pode ser liberado para aumentar a evolução”.
Conheça os super soldados
A espécie Pheidole morrisi, coletada em Nova York, possui normalmente dois tipos de formiga operária: as menores, responsáveis por cuidar da saúde, buscar comida, alimentar ovos e larvas e cuidar da rainha; e as soldado, que defendem o ninho e usam suas grandes mandíbulas para quebrar sementes trazidas pelas outras.
Essa espécie não tem super soldados, mas as cabeçudas lembram formigas desse tipo que existem em oito espécies na América do Sul e norte do México. Todas as nove espécies pertencem ao gênero Pheidole, que abriga cerca de 1100 espécies.
Então faz sentido que as “aberrações” revelem algo sobre a origem dos super soldados entre as outras oito espécies.
Fabricando um super soldado
Para revelar esse mistério, os pesquisadores, liderados por Rajendhran Rajakumar, observaram o desenvolvimento das larvas de super soldados em duas das oito espécies que normalmente os produzem. (Os pesquisadores pretendiam estudar o comportamento das P. morrisi coletadas, mas elas foram mortas no laboratório por outras formigas).
O papel de uma formiga na colônia é determinado por mudanças no ambiente, durante o desenvolvimento larval. Formigas adultas podem manipular essas mudanças, por exemplo, aplicando certos hormônios, chamados de feromônios, na larva.
No primeiro período de desenvolvimento, essa mudança determina se o ovo vai virar uma rainha ou operária, e num segundo momento, determina se vai ser um soldado ou trabalhador menor.
Um pouco antes da segunda mudança, os cientistas aplicaram um químico que age como um hormônio juvenil nas larvas de três espécies que não produzem super soldados. Esse tipo de hormônio está envolvido na transcrição de dados do ambiente, como a nutrição, para a identidade da larva. Ao aplica-lo artificialmente, os pesquisadores cruzaram as barreiras naturais e criaram super soldados.
Mas essas cópias de laboratório não eram iguais às formigas naturais. Quando adultos, os super soldados de laboratório continuaram com vestígios de asas, algo que os comuns perdem quando amadurecem. “O potencial de ser um super soldado está lá, mas um pouco cru”, afirma Abouheif.
Os pesquisadores também analisaram a expressão de um gene envolvido no desenvolvimento das asas, e encontraram similaridades entre os soldados induzidos no laboratório e os naturais. Eles também encontraram mudanças similares em duas espécies naturais de super soldados, o que indica que contam com o mesmo mecanismo de desenvolvimento.
Então, para que os super soldados? Eles parecem ter uma função óbvia de defesa. Durante um ataque, usam suas grandes cabeças para bloquear os túneis do ninho, mantendo os invasores fora. Moreau sugere outra razão para existências desses grandes soldados: moer sementes. Eles conseguem moer algumas maiores do que os soldados comuns.
Um mistério da árvore genealógica
A pesquisa pode ajudar a resolver o mistério da origem desses super soldados. Um estudo passado, de Corrie Moreau, revelou que uma das espécies com super soldados está perto da base da árvore genealógica da família Pheidole, muito perto da formiga ancestral. As outras espécies com os soldados alternativos estão espalhadas pela árvore.
De acordo com Moreau, há duas explicações possíveis para esse arranjo: ou cada uma desenvolveu suas próprias formas de criar super soldados, ou o mecanismo evoluiu de um ancestral comum, entre 35 e 60 milhões de anos atrás. O trabalho da equipe de Abouheif aponta para a segunda, de que os super soldados datam da base da árvore.
As implicações vão além das formigas. “A questão se torna: ‘todos os insetos usam um caminho similar ao das formigas com cabeça gigante ou é especial desse grupo’”, afirma. “Isso sugere que devemos olhar para caminhos conservados da evolução, através da árvore da vida”. [LiveScience]