Pela segunda vez na história, conseguimos capturar em vídeo uma lula-gigante nadando em seu habitat natural.
A filmagem de 25 segundos foi registrada por um novo sistema de câmeras chamado “Medusa”, desenvolvido pela Dra. Edie Widder, fundadora da Associação de Pesquisa e Conservação dos Oceanos e parte da equipe de cientistas que gravou o primeiro vídeo de uma lula-gigante nadando ao largo do arquipélago Ogasawara, no Japão, em 2012.
Desta vez, o animal foi visto no Golfo do México.
Medusa
A cientista havia formulado a hipótese de que os sons e as luzes dos veículos e submersíveis operados remotamente estavam afugentando grandes criaturas do mar e impedindo os pesquisadores de observar a vida no fundo do oceano como ela realmente é vivida.
Então, para essa expedição – uma jornada de 15 dias pelo Golfo do México financiada pelo Escritório Nacional de Pesquisa e Exploração Oceânica da Administração Oceânica e Atmosférica dos EUA -, Widder criou a Medusa.
A câmera usada emprega luz vermelha que a maioria das criaturas do mar não consegue ver. Além disso, possui uma isca óptica na forma de um anel de luzes de LED que se assemelha a uma água-viva bioluminescente.
O esforço deu resultado. Cerca de 20 horas de gravação da quinta implantação da Medusa depois, o Dr. Nathan Robinson, diretor do Instituto Cape Eleuthera nas Bahamas, viu os tentáculos se infiltrando na visão da câmera e correu chamar a Dra. Widder.
O vídeo
No início, o animal ficou na beira da tela, sugerindo que uma lula estava perseguindo a isca LED, andando ao lado dela.
Aos poucos, a criatura inteira emergiu do centro da tela escura: um animal longo e ondulante que de repente se abriu em uma massa de braços e tentáculos retorcidos. Dois se estenderam e agarraram a isca.
Por um longo momento, a lula pareceu explorar a estranha “água-viva” em perplexidade. E então se foi, retornando ao escuro.
Para os cientistas, a filmagem foi empolgante. “As pessoas começaram a se aglomerar, gritando, ficando muito animadas, mas tentando não ficar muito animadas”, disse Widder. “Porque nós tínhamos que ter certeza de que era realmente o que achávamos que era”.
A confirmação
A equipe da expedição observou o clipe do ataque repetidas vezes, examinando os detalhes de como as ventosas estavam posicionadas e consultando os livros de identificação.
As lulas-gigantes não são as únicas lulas que vivem no fundo do mar, e esta tinha “apenas” cerca de 3 metros de comprimento: provavelmente um juvenil em uma espécie que pode atingir 12 metros.
A equipe procurou Michael Vecchione, especialista em cefalópodes no Museu Nacional de História Natural Smithsonian (EUA), para confirmar o que estavam vendo. O tamanho e a localização do avistamento deixavam apenas uma outra identificação possível: Asperoteuthis, uma lula com tentáculos muito mais longos e finos. Vecchione confirmou: tratava-se mesmo de uma lula-gigante, ou Architeuthis.
Essa foi apenas a segunda expedição a filmar uma lula-gigante em seu habitat de águas profundas, e a primeira filmada nos Estados Unidos.
Tão perto, tão longe
A lula foi observada perto de Appomattox, a maior plataforma flutuante de perfuração de petróleo da Shell no Golfo do México.
Para Sönke Johnsen, professor de biologia da Universidade Duke (EUA) e líder da expedição, a experiência é um lembrete de quão próximas estão as maravilhas naturais da infraestrutura e dos impactos humanos, desde vazamentos de petróleo até o escoamento agrícola que regularmente transforma partes do golfo em zonas mortas.
“Mesmo a apenas 160 quilômetros da costa, estamos vendo coisas que normalmente colocamos no canto dos mapas – ‘Aqui estão os monstros’. Você poderia estar aqui, e abaixo de você estão lulas-gigantes, coisas da mais selvagem imaginação. Elas fazem parte da nossa terra, fazem parte do nosso país”, argumenta.
Pesquisadores de águas profundas frequentemente apontam que a ciência sabe menos sobre o fundo do oceano do que sobre a superfície de Marte. A lula-gigante há muito é um exemplo desta realidade: uma criatura gigantesca conhecida apenas por espécimes que aparecem mortos em terra ou enormes bicos encontrados nos estômagos de baleias-cachalotes, o principal predador dos animais.
Chance rara
Segundo Vecchione, encontrar corpos mortos de lulas-gigantes “não nos diz nada sobre como elas ganham a vida em seu ambiente natural”.
O novo vídeo, gravado a uma profundidade de 759 metros, em um local onde o fundo do oceano fica a 2.200 metros, oferece pistas raras e úteis para o habitat do animal e seus métodos de caça.
A Dra. Widder projetou a isca óptica para emular a luz que uma água-viva emite quando está sendo atacada. De acordo com a teoria que os pesquisadores tinham, a luz do animal é destinada a atrair algum predador maior, que atacará o que estiver atacando a água-viva. O fato de uma segunda lula-gigante ter sido atraída para a isca parece reforçar essa hipótese.
Ainda assim, os cientistas têm pouca ideia de como a espécie como um todo está se virando no fundo do mar, especialmente porque os oceanos que ela chama de lar estão aquecendo e se acidificando rapidamente. “[A lula-gigante] poderia se extinguir sem que nós soubéssemos”, resumiu Robinson. [NYTimes]