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Há mais calorias nos alimentos do que as embalagens afirmam

Fazer dieta nem sempre é fácil, especialmente porque exige que contemos as calorias de tudo que ingerimos. É bem simples: se você queimar mais calorias do que consome, vai perder peso. Sendo assim, a caloria é a métrica que vai definir o que você deve comer.

Por conta disso, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) brasileira exige rotulagem nutricional obrigatória de alimentos e bebidas embalados. O descumprimento desta resolução constitui infração sanitária. O mesmo ocorre nos EUA, país no qual a Administração de Drogas e Alimentos (FDA, na sigla em inglês) requer que produtos embalados listem suas calorias, entre outros dados, nos pacotes.

Para ajudar a combater a obesidade em Nova York, o Departamento de Saúde americano passou a exigir também que restaurantes fast food listassem o conteúdo de calorias em seus cardápios. Leis similares estão sendo implementadas pelo Brasil. Em 2011, a Assembleia Legislativa de São Paulo aprovou o projeto de lei que obriga as redes de fast food a informar aos consumidores os valores calóricos e nutricionais das refeições, e em 2012, a Assembleia Legislativa do Paraná aprovou um projeto que define regras para estabelecimentos do setor alimentício, como especificação das calorias dos alimentos oferecidos em cardápios de bares, restaurantes, hotéis, fast foods e similares.

Tanto no Brasil como nos EUA, os restaurantes que não cumprirem tal ordem estão sujeitos a multas, mas há um problema evidente: a falta de fiscalização. Aparentemente, não há verificação da precisão destas listagens de calorias.

O sistema depende essencialmente da honra e honestidade dos vendedores de alimentos, que podem listar os números que quiserem, até que alguém (de alguma forma) perceba algum erro e faça uma reclamação.

Se você, por acaso, tem uma desconfiança natural de redes de fast food e não acredita na sinceridade incondicional dos restaurantes, está certo.

Mentiras calóricas

O cineasta americano Casey Neistat fez um documentário opinativo chamado “Calorie Detective” (em português, “detetive de calorias”) sobre a listagem de calorias em cadeias de fast food e produtos embalados.

Levando em conta que temos que confiar nos restaurantes e empresas para saber as calorias do que consumimos, ele quis verificar se produtos que comprava regularmente estavam atendendo as exigências da FDA.

Então, selecionou cinco itens que consumiria em um dia médio: um muffin, um sanduíche de tofu, um sanduíche da rede Subway, um Frappuccino da rede Starbucks e um burrito da rede Chipotle.

Em seguida, dois cientistas de alimentos do Centro de Pesquisa e Nutrição para Obesidade de Nova York (EUA) no Centro Hospitalar St. Luke’s-Roosevelt cuidadosamente testaram o conteúdo calórico de cada item, usando um dispositivo chamado de calorímetro. Foi um processo lento, mas preciso.

Resultado: quatro dos cinco itens testados tinham mais calorias do que os seus rótulos relatavam. Se alguém dependesse dessa contagem, ingeriria, sem saber, cerca de 550 calorias extras todos os dias, ganhando até 226 gramas em uma semana.

Neistat contatou as empresas fabricantes dos itens para tentar obter explicações sobre as diferenças encontradas. A empresa Morrisons Pastry, que faz os muffins vendidos em variados locais em Nova York, disse que não tinha comentários. Segundo eles, um muffin deve ter 640 calorias, mas os cientistas descobriram que tem na verdade 734.

Um funcionário da empresa do sanduíche de tofu, cujo produto tinha quase o dobro do número de calorias que constava no rótulo (em vez de 228, tinha na verdade 548, o mesmo de um Big Mac do McDonald’s), disse que não tinha certeza de como a companhia havia chegado àqueles dados, e que iria revê-los. Se encontrasse resultados semelhantes aos de Neistat, alteraria as informações em seus rótulos.

Tanto a Starbucks quanto a Chipotle explicaram que, uma vez que seus produtos são feitos à mão em suas lojas, muitas vezes há pequenas variações de calorias. Nenhuma delas mede calorias em laboratório, como Neistat fez. Em vez disso, as empresas somam as calorias de cada ingrediente. Os cientistas explicam que esse processo pode ser especialmente impreciso, já que os valores de calorias de cada ingrediente estão muitas vezes desatualizados. No caso, o Frappuccino deveria ter 370, mas tinha 392 calorias, e o burrito, em vez 1.175, tinha 1.295.

Por fim, o Subway afirmou que realiza em laboratórios próprios e “independentes” estudos para fundamentar a sua informação de calorias. Um porta-voz da empresa destacou enfaticamente que a precisão dos dados nutricionais é importante para eles. Deve ser verdade, já que o sanduíche testado tinha menos calorias do que as listadas: 350, versus a informação do rótulo de 360 (vale notar que consumidores já processaram a rede por vender sanduíches menores do que o anunciado).

Neistat conclui que, por testar apenas cinco itens, sua pesquisa é pouco conclusiva. “Fiquei com mais perguntas do que respostas. Portanto, seria injusto tirar conclusões mais amplas sobre a indústria de alimentos ou apontar o dedo para empresas específicas”, explicou.

Mas ele acredita que uma coisa pode ser dita com certeza: o sistema atual de regulação de calorias é totalmente inadequado e falho. “Com toda a atenção voltada para o que o nosso governo pode fazer para conter a epidemia de obesidade, por que não começar pelo policiamento dos dados nutricionais?”, questiona.

Abaixo, você pode assistir o minidocumentário de 5 minutos e 50 segundos (em inglês).[NYTimes, Estadao, Anvisa, G1]

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