Após mais de um século de busca, um avanço significativo foi alcançado no campo da saúde pública: o desenvolvimento de uma vacina confiável contra a malária, capaz de proteger pelo menos dois terços das crianças vacinadas contra essa doença mortal.
Surpreendentemente, agora existem duas vacinas disponíveis para esse fim. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recentemente endossou uma vacina chamada R21/Matrix-M, desenvolvida pela Universidade de Oxford e pelo Instituto Serum da Índia. Os resultados da Fase 3, embora ainda não revisados por pares, demonstraram uma eficácia variando de 68 a 75 por cento. Essa notícia vem apenas três meses após a aprovação de outra vacina chamada RTS,S/AS01, desenvolvida pela GlaxoSmithKline, com uma taxa de eficácia de 55 por cento, em outubro de 2021.
A distribuição da vacina RTS,S já começou em 12 países africanos, enquanto a vacina R21 deve estar disponível no próximo ano, após procedimentos regulatórios. Juntas, essas vacinas têm o potencial de reduzir significativamente a mortalidade infantil nas regiões tropicais. No entanto, os especialistas enfatizam que ferramentas tradicionais de controle da malária, como redes mosquiteiras, não devem ser abandonadas prematuramente, pois desempenharam um papel crucial no controle da doença até o momento.
A malária tem representado um desafio formidável devido à natureza complexa do parasita responsável pela doença. Esse parasita passa por múltiplas etapas de transformação dentro do corpo, tornando-o mais difícil de ser combatido em comparação com vírus ou bactérias. Criar vacinas eficazes contra a malária tem sido um processo longo.
Ambas as vacinas recém-desenvolvidas visam combater o parasita conforme ele entra no corpo e antes de se esconder no fígado para se reproduzir. Elas utilizam montagens sintéticas da proteína circumsporozoíta (CSP), expressa pelo parasita em suas fases iniciais, para educar o sistema imunológico e permitir que ele reconheça e combata o parasita.
Ambas as vacinas foram projetadas para serem administradas a bebês em uma série de três doses, com um reforço um ano depois. Parece que elas fornecem proteção por vários anos, embora não seja esperado que seja vitalícia. A durabilidade a longo prazo da vacina mais antiga permanece incerta, enquanto a mais recente ainda está passando por testes clínicos.
Dada a quantidade de doses necessárias para proteger uma única criança, a demanda por essas vacinas deve ser substancial. Enquanto 1,7 milhão de crianças em três países já receberam quase 5 milhões de doses da vacina RTS,S por meio de um programa piloto, a OMS estima que a demanda anual por ambas as vacinas variará de 40 a 60 milhões de doses inicialmente, podendo chegar a 100 milhões até 2030.
Para atender a essa demanda, esforços estão em andamento para aumentar a capacidade de produção. A GSK planeja transferir a produção do RTS,S para a empresa farmacêutica indiana Bharat Biotech, o que pode expandir a capacidade de fabricação. Além disso, o Instituto Serum da Índia, parceiro de fabricação do R21, prevê que a OMS certificará a vacina em breve, permitindo o início da produção no próximo ano.
No entanto, garantir o acesso equitativo a essas vacinas para países de baixa renda apresenta um desafio. Esforços serão necessários para estimular a produção por vários fabricantes e, ao mesmo tempo, construir capacidade de produção nas regiões mais afetadas pela malária.
Embora a chegada dessas vacinas seja aguardada com entusiasmo, os especialistas enfatizam que os métodos tradicionais de controle da malária, incluindo a pulverização de inseticidas, a distribuição de redes mosquiteiras tratadas e a oferta de medicamentos preventivos acessíveis, devem continuar sendo utilizados. Esses métodos fizeram progressos significativos na redução das taxas de malária, embora o progresso tenha estagnado recentemente.
As novas vacinas são principalmente direcionadas a crianças menores de cinco anos e não são 100 por cento eficazes. Para alcançar uma cobertura abrangente, elas devem ser combinadas com outras ferramentas de controle da malária.
A implementação dessas vacinas também enfrentará desafios logísticos, como a distribuição de doses em áreas remotas e a manutenção das condições adequadas de temperatura. Além disso, obter apoio e financiamento de doadores, filantropos e nações ricas será crucial para sustentar campanhas de vacinação contra a malária.
Os defensores dessas vacinas esperam destacar os benefícios econômicos delas, não apenas seu impacto humanitário. Em alguns países de baixa renda, a prevenção da malária consome uma parte significativa do orçamento de saúde. O custo para a produtividade global é estimado em US$ 12 bilhões por ano. No entanto, atualmente, o financiamento para a malária não atinge o necessário, destacando a importância do apoio financeiro contínuo para combater essa ameaça persistente e em constante evolução à saúde pública.
Com a malária como uma ameaça persistente à saúde pública, essas novas vacinas representam uma esperança significativa para reduzir a carga da doença e salvar vidas em todo o mundo. Com esforços contínuos para garantir o acesso equitativo e a sustentabilidade dessas vacinas, pode ser possível finalmente virar a maré contra essa doença devastadora. [Wired]