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Novas evidências: a vida na Terra favorece a evolução ou o criacionismo?

Esqueça Brasil X Argentina, Lady Gaga X Katy Perry, Harry Potter X Crepúsculo. A maior briga do nosso tempo – e de outros, muitos outros – é aquela entre criacionistas e evolucionistas. Enquanto religiosos em todo mundo levantam a sua bandeira, aqueles que acreditam em Darwin respondem à altura nesta batalha que parece longe de acabar.

A teoria da evolução de Charles Darwin, publicada pela primeira vez em 1859, ofereceu uma nova e corajosa explicação para como animais e plantas se diversificaram e até hoje serve como a base que sustenta toda a pesquisa médica e biológica. Mas a teoria permanece sob ataque por criacionistas em várias partes do mundo, particularmente nos EUA, Turquia, Indonésia e Oriente Médio.

Talvez três dos mais poderosos meios para testar a evolução sejam através de genômica comparativa, genes homeobox e fósseis de transição. Coletivamente, eles fornecem evidência sólida para a evolução como uma teoria robusta o suficiente para dar conta da diversificação de toda a vida. Assim, vamos explorar algumas descobertas recentes nestes campos.

Genomas e evolução


O genoma é o material genético de um organismo, compreendendo os genes e as sequências não codificantes de DNA e RNA. O primeiro organismo sequenciado em todo o seu genoma – um bacteriófago (um vírus bacteriano) – foi estudado em 1976 e só em 1995 o primeiro genoma de uma bactéria foi concluído.

Em 2003, o genoma humano foi sequenciado no maior projeto científico colaborativo do mundo. Verificou-se que ele é composto de 3 bilhões de pares de bases de DNA que codificam 20.500 genes, o mesmo número de camundongos. Hoje, uma nova geração de sequenciadores de genes significa que o genoma humano pode ser sequenciado individualmente por cerca de US$ 1.000 (mais de R$ 2 mil).

Os humanos compartilham 98,8% de seus genes com os chimpanzés. Estimamos que o último ancestral comum entre os seres humanos e os chimpanzés viveu entre 6 e 8 milhões de anos atrás. Este dado é apoiado por evidências fósseis conhecidas de espécies humanas antigas e macacos pré-históricos.

Já a origem dos animais terrestres é estimada através do estudo do celacanto. Pensava-se que ele tinha sido extinto junto com os dinossauros. No entanto, ele foi capturado vivo na África do Sul em 1938. Esse peixe primitivo de nadadeiras lobadas possui um genoma que lança luz sobre a evolução inicial dos animais que vivem na terra.

No ano passado, todo o genoma do celacanto (Latimeria chalumnae) foi sequenciado. É uma relíquia viva de uma variedade de antigos peixes de barbatanas lobuladas que atingiram o apogeu da diversidade cerca de 300 milhões de anos atrás. Este genoma tem 19.033 genes. Dentre estes, 251 genes comuns a todos os vertebrados com mandíbulas foram selecionados e as 100.583 posições de aminoácidos foram analisadas ​​para ver quais sequências tinham mais similaridades.

A filogenia resultante (história evolutiva de uma espécie), mostrando as relações evolutivas inferidas, está alinhada com a evidência do registro fóssil. Provou-se que os celacantos divergiram da árvore dos vertebrados bem antes dos peixes pulmonados e tetrápodes (espécies de quatro membros).

Recentemente, foram concluídos os genomas inteiros do peixe-zebra, baiacu, peixe chato, tubarão elefante, chimpanzé, rato, ornitorrinco, galinha, cão, cavalo, wallaby e gambás, bem como uma variedade de animais invertebrados (como moscas de frutas) e microorganismos.

Cada vez que um conjunto do genoma de um organismo é sequenciado, a sua diversidade genética e sua complexa padronização proteica pode ser comparada a outros organismos cujos genomas são conhecidos. Assim, uma hipótese evolutiva pode ser gerada com base no grau de semelhança entre eles.

Até agora, todos estes resultados têm apoiado a teoria de evolução existente a partir do que já sabíamos sobre a anatomia desses organismos. Esta é uma poderosa evidência a favor da evolução, uma vez que bastava um caso estar fora da posição filogenética prevista para desafiar a teoria, o que ainda não aconteceu.

Os genes homeobox e evolução

Homeobox (ou “genes Hox”) estão envolvidos no desenvolvimento de padrões dentro de um organismo. Eles são, basicamente, o modelo e conjunto de ferramentas que permite que um corpo seja construído, ligando ou desligando o funcionamento de outros genes na sequência correta, conforme necessário.

Os genes Hox são organizados ao longo do cromossomo na mesma ordem que as partes do corpo que eles controlam e a importância evolutiva deles é profunda. Os mesmos genes Hox ocorrem dentro de uma vasta gama de organismos, fazendo mais ou menos o mesmo trabalho.

Se você é um inseto e precisa desenvolver uma perna, o seu gene sonic hedgehog (SHH) será usado. Se você é um vertebrado, seja um peixe ou humano, o gene SHH é colocado em ação da mesma forma para desenvolver uma barbatana ou um braço. Isso mostra que, quando os peixes evoluíram em animais terrestres, cerca de 370 milhões de anos atrás, a transformação da barbatana do peixe em um membro de animal terrestre foi controlada pelos mesmos processos biológicos.

Também descobriu-se que o gene SHH é ativo em tubarões no desenvolvimento das nadadeiras pares, demonstrando que é ele reservado ao desenvolvimento dos membros na evolução dos vertebrados com mandíbulas.

Foi descoberto recentemente que os peixes também têm os genes necessários e o quadro regulamentar para formar dígitos (dedos das mãos e pés), mas não os desenvolvem. Portanto, este passo, o do desenvolvimento de dígitos, só é ativado como um recurso único para tetrápodes.

Fósseis de transição e evolução

Fósseis de transição ou “elos perdidos” são fósseis que mostram um mosaico de personagens que os colocam como filogeneticamente entre dois grandes grupos de organismos.

O primeiro destes fósseis foi o Archaeopteryx, que ficou famoso e foi muito saudado como o primeiro “pássaro”, pois tinha penas, mas mantinha um esqueleto reptiliano. Com cerca de 150 milhões de anos, ele apareceu mais cedo no registro fóssil do que qualquer outra ave conhecida.

Hoje sabemos, depois de extensos novos estudos do Archaeopteryx e de dinossauros terópodes carnívoros, que ele é apenas mais um dinossauro predador com penas. O Aurornis é outro dinossauro aviário com penas descoberto recentemente semelhante ao Archaeopteryx.

Existem atualmente oito famílias de dinossauros terópodes conhecidos por terem possuído os mais diversos tipos de penas. É claro a partir desta evidência fóssil que as aves evoluíram a partir de pequenos dinossauros terópodes em algum momento entre 180 milhões e 160 milhões de anos atrás.

O mais novo e espetacular fóssil que fecha uma lacuna muito grande na evolução dos vertebrados é o Entelognathus. Este placodermo de 425 milhões anos tem uma mandíbula inferior e placas gulares (par de placas frontais abaixo da cabeça) exatamente iguais as de um peixe ósseo.

Estudos desde 2009 vem mostrando que os placodermos não eram um grupo coerente (ou monofilético), mas tinham vários nós em sua árvore evolutiva. O Entelognathus aparece muito mais cedo no tempo do que a maioria dos placodermos, implicando que a maior diversificação do grupo ocorreu logo após a sua aparição inicial, cerca de 440 milhões de anos atrás.

Apenas cinco anos atrás, foi anunciado o mais antigo peixe ósseo conhecido do mundo, o Guiyu, a partir dos mesmos depósitos em Yunnan, na China, onde o Entelognathus foi encontrado. Porém, a verdadeira surpresa foi que os peixes ósseos antigos tinham espinhos na frente de suas barbatanas e placas ósseas que formavam uma armadura rígida em torno de seu corpo. Estas são as duas características de placodermos e outros dos primeiros vertebrados com mandíbula.

Agora estamos aprendendo com tais fósseis que as barbatanas de peixes lobulados (sarcopterígios) apareceram antes dos primeiros peixes com nadadeiras sustentadas por “raios” (actinopterígeos).

Outro fóssil de transição verdadeiramente espetacular encontrado nos últimos anos foi o peixe de nadadeiras lobolares Tiktaalik, que viveu cerca de 375 milhões de anos atrás no que hoje é o Ártico do Canadá. Ele era um peixe de quatro patas, que tem um crânio idêntico ao de um tetrápode precoce (anfíbio), contudo tinha nadadeiras com raios ao invés de dígitos nas extremidades dos seus membros. Como o Archaeopteryx e todos os outros fósseis de transição, é uma questão de ponto de vista classificar onde o Tiktaalik fica na árvore da vida. É possível vê-lo tanto como um “peixe com pernas” ou um precoce “anfíbio com barbatanas”.

O Tiktaalik demonstra bem uma condição evolutiva intermediária quando peixes com barbatanas lobulares avançados já tinham adquirido a maioria das características anatômicas necessárias para se tornarem tetrápodes.

Por último, há a evidência fóssil

Talvez a mais forte evidência a favor da evolução, hoje, seja simplesmente as centenas de milhões de fósseis encontrados em museus e outras coleções em todo o mundo. No Page Museum, em Los Angeles, há 3,5 milhões de ossos fósseis em um prédio, e isto é apenas uma das muitas centenas, senão milhares de museus, universidades, pesquisas geológicas e coleções privadas contendo fósseis em todo o mundo.

Se apenas um destes fósseis fosse encontrado fora de sua posição estratigráfica prevista, poderia ter refutado a evolução. Encontrar um mamífero no Período Cambriano ou um dinossauro no Período Devoniano poderia contestar imediatamente a teoria. Entretanto, dos centenas de milhões de espécimes fósseis coletados e estudados até o momento, nenhum foi encontrado em uma camada da rocha onde não deveria estar de acordo com a hipótese da evolução.

Isso é prova irrefutável da confiabilidade da evolução. Se ela não fosse confiável, nós não seríamos capazes de depender de fósseis de núcleos de perfuração para localizar os depósitos de petróleo e gás natural que usamos em nossa vida cotidiana. Dá para imaginar como as coisas seriam diferentes se isso não se comprovasse?

E aí, já escolheu para quem você vai torcer nesta briga? [Science20, The Conversation]

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