A gente diz normalmente que “é o pensamento que conta”. É isso mesmo? Quantas vezes você recebeu um presente que odiou completamente mas ainda assim disse “muito obrigado, adorei”?
Em uma história de O. Henry de 1905 — um homem quer dar um presente de natal para a sua esposa e vice-versa, mas nenhum deles. A esposa então corta e vende seu belíssimo cabelo para comprar uma corrente para o relógio de bolso do marido: o bem mais valioso que ele tem. Só que ele vende o relógio para comprar um conjunto de pentes caros para ela. Cada presente anula o outro.
A realidade é que a ciência da psicologia moderna já descobriu muita coisa para solucionar esse problema antigo de como dar o presente perfeito.
Você com certeza lembra da emoção de abrir um presente e receber algo totalmente inútil. Dois presentes que eu ganhei quando criança que me marcaram muito um foi selos colecionáveis e um par de meias. Não to brincando, selos. E um par de meias. Quais são os ítens que deixaram você incrivelmente decepcionado? Escreva nos comentários. Escreva também algum presente que você amou e lembrou por um bom tempo.
O pesquisador Jeffrey Galak, da Carnegie Mellon, dos EUA, passou muito tempo pensando sobre presentes e como dar presentes.
Quando o presente desaponta aquilo nunca beneficiou ninguém e, se você pensar bem, diz Jeffrey, foi causado um dano ali. Foi sinalizado que você não tratou a pessoa com respeito ou carinho. Um presente também, muitas vezes deixa uma obrigação a reciprocidade, isto é, não apenas você ganhou um péssimo presente, mas tem a obrigação de responder.
Eu lembro uma vez quando trabalhava no comércio e na época logo antes do natal uma cliente entrou na loja, eu perguntei se ela procurava algo específico e ela disse que tinha dar um presente para uma pessoa que ela não gostava. Ela não estava procurando um presente ruim, mas era a obrigação que pesava nas palavras dela.
Além de um custo psicológico de dar e receber presentes também há a imposição econômica que dar um presente carrega. Uma pesquisa famosa chamada O Peso Morto do Natal de Joel Voegol em 1993 descobriu que se eu tenho, por exemplo, tem 100 reais e gasto esse dinheiro comigo mesmo a chance de comprar algo que eu considere que vale 100 reais é alta porque eu sei o que quero, conheço minhas preferências. Mas quando você for me dar um presente do mesmo valor a chance de você acertar minhas preferências é muito menor, obviamente. Então há uma perda. Portanto a utilidade dos 100 reais é menor para mim porque estou recebendo algo que me agrada menos.
A conclusão do pesquisador no artigo científico foi que “é provável que receber um presente deixa quem o recebe pior do que se ele tivesse feito sua própria escolha de consumo com a mesma quantidade de dinheiro. Descobri que dar presentes de natal destrói entre 10% e um terço (33%) do valor dos presentes.”
Dar presentes podem causar problemas financeiros também. Uma estatística recente nos EUA indica que estadunidenses gastam cerca de 800 dólares (algo perto de 4.300 reais) em presentes todo natal, um valor astronômico para muitas famílias lá. Mas as pessoas pensam que tem que participar desse costume mesmo que comprometa sua saúde financeira.
Mas como nos tornamos melhores em dar presentes?
O que Jeffrey descobriu é que os objetivos de quem dá presentes e de quem recebe estão completamente desalinhados. Quem dá um presente está focado exclusivamente no momento que o presente é aberto. A reação do Sheldon do The Big Bang Theory que você acabou de ver é a reação ideal que buscamos ao dar presentes: o maior sorriso do mundo.
Mas quem recebe o presente está focado também em gostar do que recebe no momento, claro, mas também estão pensando na utilidade, alegria e valor durante o tempo que você tem aquele objeto: felicidade em longo prazo com aquilo.
Quem dá presentes acha que é fundamental surpreender quando você dá um presente. PEnsam que você só vai valorizar se não espera receber especificamente aquilo. E frequentemente Jeffrey confirmou que isso não é verdade.
Quando a pessoa que você vai presentear quer algo, e você sabe o que é, e a pessoa sabe que você sabe que ela quer, nós tendemos a pensar que o presente não será tão valioso quanto dar algo totalmente inesperado. Quando a realidade é que se eu quero uma fruteira e digo que quero uma fruteira bonita eu vou amar receber uma fruteira. Mas as pessoas pensam que surpreender é o que faz um bom presente, mas isso não é verdade.
Quem dá o presente liga muito também sobre como o presente está embrulhado. Talvez por um curto período, mas o papel é jogado fora em seguida e não tem efeito de longo prazo.
Parte do motivo de quem dá presente também é ser visto como criativo. Quer silnaizar isso a si mesma e as pessoas a sua volta. As pessoas também não querem repetir os presentes. Dar o mesmo presente para pessoas diferentes ou dar o mesmo presente para a mesma pessoa todo ano, mesmo que seja um presente incrível que quem recebeu amou. Se eu te der seu vinho favorito possivelmente não vou dar o mesmo vinho no ano seguinte, mas você ia amar isso porque é seu vinho favorito!
Muitas vezes outras pessoas também estão olhando o que você está dando de presente e isso cria uma certa competição em que você não quer sair por baixo. Se eu te dei uma cerveja importada que você ama e o outro amigo te deu duas acho isso péssimo, porque eu não te dei o suficiente. Então eu tenho uma forte motivação para não ser colocado naquela posição. E quando Jeffrey apresentou para voluntários um cenário em que você sabe que outra pessoa dará duas garrafas de vinho e perguntou se eles gastariam mais para dar 3 garrafas, a esmagadora maioria das pessoas disse que sim.
As pessoas pensam que quanto mais gastam ou caso comprem algo de marca cara, o presente será melhor e não há boas evidências disso.
Mas o que a ciência diz sobre como dar o melhor presente?
1. Diálogo
A gente não tem a capacidade de ler a mente das outras pessoas e saber o que elas querem de presente. Se a gente considera que o melhor presente é algo que a pessoa quer a gente pode simplesmente conversar com a pessoa que vamos presentear para evitar a diferença entre o que eu penso que você quer e o que você realmente quer. É o mais perto de ler a mente que a gente vai chegar. Fazer isso não vai reduzir a mágica do momento e sim amplifica-la. O contrário é basicamente dizer: eu vou fazer o máximo para adivinhar o que você quer, mas em grande parte das vezes sabemos que erramos. E como a pessoa se sente na obrigação de ser educada e agradecer o presente ninguém aprende nada com a interação.
O próprio pesquisador tem uma técnica com a esposa para dar os presentes perfeitos. Eles tem uma planilha do google em que cada um vai relacionando coisas que gostaria de ganhar de presente. Um dos presentes que ele ganhou da esposa foi uma máquina de café expresso que ele usa muito e ama. Sempre que faz um café ele lembra dela com gratidão, várias vezes por dia. Eles sabem o que querem, mas não sabem quando e exatamente o que vão receber. Mas que vão receber algo que querem.
2. Presentes que não são objetos
A diferença de presentes que são experiência ao invés de presentes materiais: o que a literatura científica indica é que gastar o próprio dinheiro com experiências, como ingressos para um show, é melhor do que comprar um conjunto de canecas bonitas, por exemplo. No mundo dos presentes, quando você gasta o mesmo no presente material e no presente que é experiência a experiência tende a ganhar termos de trazer maior alegria para quem recebe.
Eu, por exemplo, levei meu filho, que nunca tinha segurado uma arma, para dar uns tiros no stand e ele amou a experiência, que deixou memórias (inclusive com fotos) que ele nunca vai esquecer. Mas o celular anterior que ele tinha já esqueceu quando ganhou o mais recente. Quando damos uma experiência estamos dando memórias para o futuro.
O pesquisador Jeffrey pede aos próprios pais para não darem presentes materiais. Como os pais deles vivem em outra cidade, tudo o que ele pede é para os pais ficarem com os netos enquanto ele e a esposa viajam para algum lugar por uns dois dias.
3. Presentes sentimentais
Presentes sentimentais são fantásticos! Presentes sentimentais podem parecer menos impressionantes do que presentes que custam muito dinheiro, mas o objetivo, a função é unir as pessoas. Presentear mesmo uma concha que você achou numa praia enquanto passeavam durante uma viagem, um porta retratos com uma foto com um amigo não vale muito em reais, tem pouquíssimo valor material mas representam muito. são lembretes especiais do relacionamento e muito valiosos para quem recebe.
Eu lembro quando meu filho tinha uns 9 anos e ganhou de presente de aniversário, de um amigo que não tinha grana para presentes, 4 desenhos de feliz aniversário com frases que ele escreveu para parabenizar. Meu filho decidiu colar esses desenhos na parede e eles ficaram ali por vários anos.
Se você já deu ou recebeu um presente sentimental muito legal, escreve ali nos comentários!
4. Presentear numa terça-feira aleatória
Dar presentes quando é menos esperado. Essa é a maior dica de dar presentes de Jeffrey: dar presentes em uma terça-feira aleatória. O valor de presentes que você recebe em uma ocasião nao especial é muito mais valioso porque não há nenhuma expectativa de receber presente. Quando você sabe que vai receber um presente suas expectativas são relativamente altas sobre a qualidade do presente. Mas numa terça qualquer não existe expectativa de nada. Você esta naquele dia, fazendo suas coisas sem esperar nada. E alguém que gosta de você te dá um presente, mesmo que valha muito pouco dinheiro, é um grande evento. Receber flores no dia dos namorados é esperado, mas receber em uma terça aleatória é incrível. É uma oportunidade de mostrar para aquela pessoa que voce liga para ela não apenas no dia que você deveria se importar com ela. Todo o momento, em qualquer momento. Estudos descobriram que a utilidade e valor dos presentes recebidos em não-ocasiões é muito, muito maior do que presentes recebidos em ocasiões especiais.
Com pouco dinheiro você pode causar muito mais impacto do que comprar um presente caro em uma data especial.
A história de O. Henri que mencionei no começo, em que o casal foi totalmente altruísta e se desfez do que tinha de mais valioso para comprar um presente para o outro — ela vendeu o cabelo para comprar um corrente para o relógio dele e ele vendeu o relógio para comprar pentes caros para ela — poderia ter sido totalmente evitada se o casal se comunicasse sobre o que gostariam de receber de presente no natal.
Simplesmente pergunte o que a outra pessoa quer. É a maneira mais fácil de acertar.