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Pavlov, memristores e máquinas que aprendem

Por Mustafá Ali Kanso

O fisiologista Ivan Petrovich Pavlov premiado com o Nobel Medicina de 1904, por suas descobertas sobre a fisiologia dos processos digestórios ganhou notoriedade, no entanto, por suas descobertas em Psicologia elucidando o que se denominou reflexo condicionado.

Foi na década de 1920 quando estudava a produção de saliva em cães expostos a diversos tipos de estímulos alimentares que Pavlov percebeu que além dos reflexos inatos, relacionados aos instintos básicos, os animais poderiam também desenvolver reflexos condicionados através de estímulos diversos oriundos do ambiente.

A ideia básica do condicionamento clássico consistia em que algumas respostas comportamentais seriam reflexos incondicionados, ou seja, inatas em vez de aprendidas, enquanto que outras seriam reflexos condicionados, aprendidos através do emparelhamento com situações agradáveis ou adversas simultâneas ou imediatamente posteriores.

Observou-se, no entanto, que através da repetição consistente desses emparelhamentos seria possível criar ou remover respostas fisiológicas e psicológicas em seres humanos e animais. Essa descoberta abriu caminho para o desenvolvimento da psicologia comportamental, fundamentada no conceito de estímulo e resposta cujo reforço é efetuado pela repetição.

No exemplo do cão de Pavlov, condicionou-se o animal com a repetição de um procedimento: Sempre antes de ser alimentado soava-se uma campainha. Depois de se estabelecer uma rotina, testou-se apenas a aplicação do estímulo – o som da campainha. Observou-se que a resposta digestória acabou sendo a mesma. O animal havia sido condicionado pelo som da mesma.

Recentemente, uma equipe de cientistas da Universidade de Kiel ( Alemanha) coordenada pelo professor Hermann Kohlstedt projetaram uma versão eletrônica do experimento de Pavlov, elaborando um circuito eletrônico capaz de ser condicionado por estímulos.

A base desse conceito de hardware apoia-a na aplicação do quarto componente eletrônico passivo – o memristor (que abordaremos com detalhes em um próximo artigo).

Enquanto um resistor simplesmente se opõe à passagem de uma corrente elétrica, o memristor é capaz de se “lembrar” da última corrente elétrica que o circulou, alterando sua própria resistência a cada passagem desse sinal eletrônico. É exatamente esse efeito “memória” que foi utilizado para criar circuitos similares às conexões existentes entre as sinapses cerebrais.

Segundo a equipe pesquisadora, o objetivo é transferir a plasticidade sináptica para os circuitos eletrônicos, com o intuito de recriar eletronicamente as habilidades cognitivas.

Sabemos que o processamento digital e o neuronal seguem princípios muito diferentes. Enquanto computadores e robôs são programados, o cérebro humano, por exemplo, desenvolve um aprendizado estimulado pela interação.

A reprodução do comportamento do cão de Pavlov em escala eletrônica possibilita a arquitetura de circuitos eletrônicos que emulem a forma como se dá o aprendizado animal e quem sabe num futuro não muito distante se conseguirá finalmente a tão buscada “cognição eletrônica”, ou seja, a construção de “máquinas capazes de aprender”.

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[Imagem: “Chip” por Iurikothe]

Bibliografia: An Electronic Version of Pavlov’s Dog
Martin Ziegler, Rohit Soni, Timo Patelczyk, Marina Ignatov, Thorsten Bartsch, Paul Meuffels, Hermann Kohlstedt
Advanced Functional Materials
Vol.: Early View
DOI: 10.1002/adfm.201200244

 

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Foi premiado com o primeiro lugar no Concurso Nacional de Contos da Scarium Megazine (Rio de Janeiro, 2004) pelo conto Propriedade Intelectual e com o sexto lugar pelo conto Singularis Verita.

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