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Produtos químicos perigosos nas embalagens de alimentos estão migrando para nossos corpos

Você sabia que aquele embrulho de plástico em volta dos pepinos no mercado, ou a lata de refrigerante que você bebe durante o almoço, podem conter mais do que apenas o alimento ou bebida? Segundo pesquisadores, milhares de substâncias químicas usadas em embalagens alimentares estão, na verdade, migrando para o que comemos, e, inevitavelmente, para dentro de nós.

Jane Muncke, toxicologista de Zurique, alerta que a contaminação pode vir de lugares que muitas vezes não imaginamos: da caixa de papelão das batatas fritas, dos utensílios de plástico que usamos na cozinha e até das frigideiras antiaderentes. Ela também explica que o problema não se limita às embalagens de alimentos no varejo, mas inclui todo o processo de produção e o equipamento utilizado na fabricação.

Um estudo recente publicado no Journal of Exposure Science & Environmental Epidemiology estimou que mais de 3,6 mil substâncias químicas usadas nas embalagens de alimentos também foram detectadas em amostras de sangue, urina e leite materno de seres humanos. O levantamento, liderado por Muncke e sua equipe do Food Packaging Forum Foundation, analisou dados de diversas fontes e identificou que cerca de 80 dessas substâncias apresentam sérios riscos à saúde.

Agora, imagine guardar molho de tomate em um pote de plástico e, depois, perceber uma mancha vermelha que parece nunca sair. Essa reação ocorre porque os componentes do molho se infiltram no plástico. De acordo com Muncke, o contrário também acontece: os produtos químicos das embalagens acabam se misturando aos alimentos que consumimos. E, para piorar, esse processo pode ser acelerado por fatores como o calor, a acidez ou o teor de gordura do alimento, além do tempo de exposição ao material.

Embora nem todos os 3.600 produtos químicos tenham sido estudados a fundo, cerca de 80 já são conhecidos por estarem relacionados a problemas de saúde graves, como cânceres, transtornos no desenvolvimento e doenças cardíacas e metabólicas. O Dr. Robert Sargis, endocrinologista da Universidade de Illinois, destaca que substâncias como ftalatos, bisfenóis e alguns metais possuem evidências sólidas de seus efeitos adversos. Os ftalatos, por exemplo, são usados para dar flexibilidade ao plástico, como aquele que encontramos em volta dos pepinos no supermercado, mas também são conhecidos por interferir no sistema endócrino, afetando nossos hormônios.

Para complicar ainda mais, os consumidores não conseguem facilmente identificar quais produtos contêm essas substâncias. Como o Dr. Sargis diz, é difícil saber com certeza onde essas substâncias estão presentes ou como estamos sendo expostos a elas.

O Dr. Leonardo Trasande, pediatra e diretor do Center for the Investigation of Environmental Hazards da NYU Langone Health, explica que o acúmulo dessas substâncias no corpo pode levar ao desenvolvimento de doenças crônicas, como obesidade e diabetes. Ele ainda estima que os problemas de saúde relacionados à exposição a produtos químicos nocivos custam cerca de US$ 250 bilhões (R$ 1,22 trilhão) por ano aos Estados Unidos, levando em consideração tanto os custos médicos diretos quanto a perda de produtividade devido a incapacidades. E embora seu estudo não tenha focado exclusivamente nas embalagens alimentares, ele acredita que elas são uma peça importante desse quebra-cabeça.

A boa notícia é que, segundo Trasande, é possível reverter alguns dos efeitos negativos dessas substâncias, desde que interrompamos a exposição. Ele menciona que químicos como BPA e ftalatos podem começar a ser eliminados do corpo em poucos dias após a interrupção do contato. Em poucas semanas, os níveis hormonais já mostram melhoras, e os perfis de doenças podem mudar em questão de meses.

Para minimizar os riscos, Trasande sugere evitar o uso de recipientes plásticos no micro-ondas ou na lava-louças, já que o calor pode acelerar o processo de contaminação. Recipientes de vidro e aço inoxidável são opções mais seguras.

Pesquisadores também argumentam que seria útil se os reguladores exigissem rótulos mais claros nas embalagens de alimentos, permitindo aos consumidores tomar decisões mais informadas. Além disso, proibir o uso de substâncias químicas comprovadamente perigosas na produção e embalagem de alimentos ajudaria a reduzir os riscos. Trasande ressalta que focar apenas em sacolas plásticas não vai resolver o problema da exposição ao plástico em nossa dieta. O verdadeiro desafio está nas embalagens de alimentos.

A FDA (Administração de Alimentos e Medicamentos dos EUA) reconhece a gravidade da situação e se prepara para discutir melhorias na supervisão de produtos químicos em embalagens alimentares em uma reunião pública que ocorrerá em 25 de setembro. O comissário adjunto para alimentos humanos da FDA, Jim Jones, afirmou recentemente que a indústria alimentícia é responsável por garantir a segurança dos produtos químicos que utiliza e que a FDA depende das informações fornecidas por essas empresas para fazer suas avaliações.

Enquanto isso, talvez seja uma boa ideia começar a repensar o que estamos colocando no prato… ou melhor, em que estamos colocando nossa comida. [NPR]

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