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O teste do espelho de Darwin tem algo a ver com a consciência?

Uma ideia de Darwin se tornou, ao longo dos anos, um teste psicológico bastante controverso. Uma lista aparentemente aleatória de animais “passa” neste teste, mas algumas descobertas recentes colocam em causa o que isso realmente significa.

O teste é simples: consiste no que você vê quando você olha em um espelho.

Se você passa por um espelho e vê uma mancha estranha em seu rosto, você tenta limpá-la, certo? Parabéns, você acabou de passar em um teste simples de autoconsciência. Talvez.

O teste do espelho começou como um pensamento casual de Darwin, quando ele registrou as travessuras de um orangotango em um zoológico brincando com um espelho que ele tinha dado ao animal. Logo, o cientista se perguntou o que exatamente o orangotango achava da imagem de si mesmo: será que ele se reconhecia no espelho? E se assim fosse, o que isso significaria?

Gordon Gallup se perguntou a mesma coisa em 1970, e resolveu criou um teste para ver se os animais eram capazes de autorreconhecimento. Usando chimpanzés acostumados a espelhos, ele anestesiou os animais e colocou uma mancha de tinta sem cheiro em uma de suas sobrancelhas.

Os chimpanzés foram revividos e receberam espelhos no qual podiam observar sua imagem. Gallup então observou o comportamento dos animais a fim de ver se eles notavam a mancha em seus próprios corpos – o que a maioria fez.

Para Gallup, qualquer animal que pudesse entender que a imagem no espelho era um reflexo de si mesmo mostraria autoconsciência. Os chimpanzés, então, eram conscientes de si mesmos como indivíduos separados de seus arredores.

Com o tempo, a lista de animais autoconscientes cresceu. Golfinhos, pegas (espécie de pombo), orcas, todos os grandes símios, e, eventualmente, elefantes passaram no teste. Macacos não. Os seres humanos, em geral, passam no teste, mas leva um tempo. Os bebês começam a notar sua imagem em torno de 18 meses, e quase nenhum ser humano falha no teste após a idade de 24 meses.

…ou assim nós pensávamos. Apesar de um estudo feito em 1986 mostrar que até mesmo crianças criadas em culturas sem espelhos notavam uma mancha em sua sobrancelha, a maioria desses estudos foi realizada na América e na Europa.
Pesquisas recentes feitas em Fiji e no Quênia mostraram que crianças de cerca de 6 anos de idade não passam no que Gallup considerou o teste do espelho.

As crianças dessas pesquisas pareciam despreocupadas com a mancha, e se mostraram desconfortáveis com o teste como um todo. Embora indicassem claramente, através de movimentos, que sabiam que o espelho refletia a sua própria imagem, a maioria delas congelou quando olhou para sua reflexão (ao invés de apontar para ou limpar a mancha). Em um dos estudos, apenas duas das 82 crianças “passaram” no teste.

Autoconsciência ou prioridade?

Ninguém pode argumentar que uma criança de 6 anos de idade não tem autoconsciência. Então, a questão que fica é: o que o teste realmente testa?

Se não é autoconsciência que estamos medindo, então o que bebês americanos e europeus poderiam ter em comum com elefantes que não têm em comum com outros bebês da mesma idade? E o que bebês de partes do Quênia têm a ver com bebês de Fiji que eles não compartilham com os americanos?

É possível que as crianças que não respondem ao teste da mancha veem seu reflexo no espelho como uma “terceira coisa” – tecnicamente, não é ela mesma e nem uma outra pessoa.

Enquanto os bebês que passam no teste são como os chimpanzés e orcas, os bebês que não passam também podem ter seus próprios grupos na natureza. Alguns estudos mostram que, embora os macacos-prego falhem no teste da mancha, eles estão cientes de seus reflexos no espelho como sendo diferentes de si mesmos e diferentes de outros macacos. Eles podem estar pensando na imagem como algo abstrato.

Ao mesmo tempo, essas crianças podem diferir de outras em algo tão tecnicamente simples quanto uma preocupação com uma mancha em seu rosto. O teste do espelho pressupõe que a coisa mais importante que você pensa quando vê o seu reflexo é uma mancha desconhecida, e que a coisa mais sensata a se fazer é corrigi-la imediatamente, ou pelo menos investigá-la.

Por algum tempo, os cientistas não pensavam que os gorilas tinham autoconsciência com base nessa suposição. Foi só quando eles observaram o comportamento dos gorilas após o teste que perceberam que eles estavam se escondendo antes de tentar limpar a mancha em particular – o que significa não só que eles têm consciência de si mesmos, mas como um sentimento de vergonha social.

Em 2004, época dos estudos no Quênia e em Fiji, os elefantes não tinham passado no teste também. Em 2006, os pesquisadores descobriam que um a cada três elefantes asiáticos passava no teste. Eles atribuem a variação nos resultados ao fato de oferecerem aos elefantes um grande espelho que eles foram capazes de tocar, em vez de um pequeno espelho que não podiam investigar.

Quanto aos elefantes que falharam, os pesquisadores acreditam que um animal que se cobre de lama não vai necessariamente se preocupar com uma pequena marca no seu rosto.

Estudos recentes também concluíram que embora macacos não toquem na mancha em seus rostos, eles usam reflexos para estudar áreas de seus próprios corpos difíceis de ver, como seus órgãos genitais.

O teste, ao que parece, tem mais variáveis do que pensávamos. Claramente, há uma ampla gama de resultados possíveis, além dos indicados anteriormente. De certa forma, o considerado teste de autoconsciência pode ser mais um teste de prioridades – prioridades definidas tão cedo que aparecem mesmo em bebês.[io9]

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