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Um lago se materializou no deserto do Saara, exibindo o passado africano

Imagem de 29 de setembro de 2024. Crédito: NASA

12 a agosto de 2024. Crédito: NASA

Uma visão surreal de água em meio ao vasto mar de areia do Saara está provocando reflexões sobre o que esse deserto já foi. Recentemente, uma tempestade inusitada fez com que um lago temporário surgisse no coração da Argélia, oferecendo um raro vislumbre de como o clima dessa região pode ter sido muito mais hospitaleiro em épocas passadas.

Quando o Saara Ganha um Novo “Inquilino”

No mês passado, o deserto mais icônico do mundo recebeu um visitante incomum: um lago efêmero chamado Sebkha el Melah, que se formou após um ciclone tropical atingir o norte da África em setembro. A precipitação intensa que seguiu transformou o árido Saara temporariamente em um cenário quase aquático, revelando o que cientistas acreditam ser uma pista do passado ecológico da região. Estima-se que, há milhares de anos, o Saara poderia ter sido um ambiente significativamente mais úmido.

Os desertos, normalmente com precipitação inferior a 10 centímetros por ano, como aponta a National Science Foundation, tornam a formação desse lago uma oportunidade de ouro para pesquisadores estudarem como o Saara já se comportou climática e ambientalmente. A água acumulada é uma janela temporária para um tempo em que essa imensidão de areia abrigava algo muito mais vibrante.

Os Caprichos da Natureza Capturados do Espaço

O lago emergente, que em setembro cobriu aproximadamente 192 quilômetros quadrados com uma profundidade de 2,2 metros, é monitorado por satélites da NASA, como o Operational Land Imager-2 (OLI-2) a bordo do Landsat 9. Pesquisadores como Moshe Armon, da Universidade Hebraica de Jerusalém, estão acompanhando o fenômeno de perto e observam que esses eventos podem ser raros, mas não são inéditos. O que mais desperta interesse é a possível relação com o chamado Período Úmido Africano, ocorrido entre 11.000 e 5.000 anos atrás, quando o Saara era, curiosamente, muito mais verde do que conhecemos hoje.

Esse período foi marcado por uma oscilação na órbita terrestre, alterando drasticamente o clima e permitindo que humanos primitivos gravassem cenas de caça e animais em locais que hoje são completamente desérticos. Algumas hipóteses mais ousadas sugerem que chuvas intensas, como a que formou o Sebkha el Melah, poderiam ter sido mais comuns no passado, ajudando a manter lagos como esse parcialmente cheios por anos, talvez décadas.

Será Que Esse Lago Vai Durar?

Apesar de toda essa empolgação, a história da evaporação no Saara é rápida e implacável. No entanto, Sebkha el Melah pode contrariar as probabilidades, assim como fez em 2008, quando se encheu e resistiu até 2012 antes de evaporar completamente. Armon comenta que, na ausência de novas chuvas, o lago atual poderia durar cerca de um ano. E, dado que o verão é a estação que mais traz chuvas ao Saara — aproximadamente 30% dos eventos de chuva intensa registrados no deserto acontecem nessa época, segundo dados do Earth Observatory — há uma pequena chance de que o lago ainda se prolongue por um bom tempo.

Ciência Espacial Observa as Águas da Terra

A ciência espacial tem desempenhado um papel cada vez mais relevante na observação de eventos como esse. Em 2022, a NASA e o CNES, da França, lançaram uma missão chamada Surface Water and Ocean Topography (SWOT), com o objetivo de mapear o volume e o movimento das águas no planeta. Essa missão, junto com outras iniciativas como o Deep Space Climate Observatory (DSCOVR), está fornecendo uma quantidade sem precedentes de dados sobre como as mudanças no clima da Terra afetam a distribuição da água em regiões como o Saara.

Com esses avanços, o surgimento de lagos no deserto poderá continuar sendo monitorado e estudado. A cada nova inundação temporária, o deserto nos oferece um lembrete de que a Terra está em constante transformação, e que até mesmo os lugares mais secos têm histórias escondidas em suas areias.

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