Astrofísica brasileira ganha prêmio internacional por pesquisa sobre buracos negros
A astrofísica brasileira Thaisa Bergmann, professora da Universidade do Rio Grande do Sul, ganhou recentemente o prêmio “Para Mulheres Na Ciência” (“For Women In Science”), da Fundação L’Oréal em parceria com a UNESCO, por conta de sua pesquisa sobre buracos negros.
Atualmente na 17ª edição, essa premiação internacional é destinada a reconhecer e apoiar a contribuição científica de cinco laureadas, uma de cada canto do globo, anualmente. Thaisa representa a América Latina, e é a sexta brasileira a se juntar ao time de vencedoras.
“A visibilidade que o prêmio dá é incrível. É muito gratificante saber que todo meu esforço é valorizado”, diz Thaisa.
Além do prêmio principal, 15 pesquisadoras promissoras receberam o prêmio “Talentos Internacionais em Ascensão” (em inglês, “International Rising Talents”), que tem o objetivo de acelerar o avanço dessas mulheres na ciência.
Esses talentos foram escolhidos entre mais de 230 bolsas de estudo concedidas a cada ano nas edições regionais do programa, e a farmacêutica brasileira Carolina Andrade, da Universidade de Goiás, foi uma das reconhecidas por sua pesquisa para o tratamento da leishmaniose.
A pesquisa premiada
A pesquisa que levou ao reconhecimento internacional de Thaisa foi fundamental para o entendimento de buracos negros supermassivos.
Antes mesmo do advento do telescópio espacial, através de observações, a astrofísica detectou um disco de gás girando em torno do núcleo de uma galáxia. Esse objeto tinha velocidades muito altas – 10.000 quilômetros por segundo –, era compacto e possuía uma massa muito grande.
Thaisa notou que ele circulava um buraco negro supermassivo, em uma galáxia na qual um buraco negro não era esperado no seu núcleo. O estudo foi capital para a conclusão de que um desses objetos provavelmente existe no centro de cada galáxia.
Além disso, a assinatura de gás que Thaisa encontrou serve para identificar outros buracos negros supermassivos no universo. Hoje, ela continua estudando esses “monstros espaciais”, além da ejeção de massa que ocorre do disco de gás em volta deles toda vez que o buraco negro faz uma refeição.
O que os buracos negros dizem sobre as galáxias
A pesquisa da astrofísica também levou a outra descoberta importante: a de que os buracos negros precisam ser levados em conta nos modelos de evolução do universo, uma vez que influenciam o tamanho das galáxias.
“Geralmente, esses modelos contabilizavam apenas fatores como sua expansão e a força da gravidade, que de fato afetam o desenvolvimento do universo. No entanto, galáxias muito maiores do que as que conhecemos resultavam desses modelos”, explica a pesquisadora.
Durante a fase de atividade desses objetos, os discos de acreção em volta dos buracos negros, que ejetam massa quando eles consomem matéria, acabam liberando grandes quantidades de energia, o que por um certo tempo interrompe o crescimento da galáxia. Isso, por sua vez, limita o tamanho total dessa galáxia a longo prazo.
Hoje, para que os modelos prevejam com sucesso a evolução do universo, precisam considerar os buracos negros espécies de “reguladores das galáxias”, como Thaisa os chama.
A mulher na ciência
O “Para Mulheres na Ciência” é o primeiro prêmio criado para incentivar mais jovens a entrarem na profissão e construírem carreiras de sucesso na área científica.
Se você está pensando que não é tão importante ter uma premiação destinada a esse fim, pense de novo.
A discrepância com relação ao equilíbrio de sexos na ciência é gigantesca. As mulheres representam apenas 30% dos pesquisadores do mundo, sendo que detêm apenas 10% dos mais altos cargos acadêmicos da área. Além disso, a maioria dos prêmios de ciência é conquistado por homens. Das 575 pessoas agraciadas com o Prêmio Nobel de Medicina, Química e Física, apenas 16 eram mulheres.
[box type=”shadow”]No Brasil, segundo o CNPQ (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), há um equilíbrio entre homens e mulheres no início da carreira científica que diminui com o passar dos anos, com participação feminina de apenas 30% em pesquisas científicas vinculadas ao final de carreira.
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A L’Oreal e a UNESCO pretendem mudar isso. Somente no Brasil, a premiação completa dez anos em 2015, tendo beneficiado 61 jovens cientistas e distribuído aproximadamente R$ 3 milhões em bolsas-auxílio (US$ 1,2 milhão). No mundo todo, 2.170 cientistas receberam bolsas para continuarem projetos de pesquisa promissores, e 87 foram laureadas.
Pela igualdade na ciência
Thaisa conta que, durante grande parte de sua carreira, se sentiu dividida entre sua pesquisa e sua família. “Senti culpa por não estar em casa com meus filhos enquanto fazia minhas observações, mas acho que a mulher precisa ter esse tempo dedicado à profissão, igual ao que os homens possuem”, diz.
Segundo a astrofísica, é mais esperado da mulher do que do homem que esteja presente na vida familiar, mas elas merecem tanto quanto eles uma chance de ter realização profissional. Para ela, o prêmio chama a atenção das pessoas para o trabalho que as mulheres são capazes de desempenhar, e mostrando que elas são recompensadas por isso.
“A mídia precisa valorizar mais a ciência. As crianças pequenas não têm exemplos de cientistas, e quando são perguntadas do que gostariam de fazer da vida, respondem coisas como modelo e jogador de futebol, porque é à isso que são expostas todos os dias”, diz.
“A educação também precisa de transformar. Os professores, se tivessem mais atrativos para dar aula, como um salário melhor, poderiam incentivar mais as crianças a gostar de ciência, com experimentos e classes divertidas que demonstrassem como a carreira científica pode ser”, complementa.
Próximo passo
Thaisa quer continuar fazendo descobertas e afirma que, para isso, o Brasil precisa de instrumentos mais potentes para a observação do céu, de nova geração.
Os maiores telescópios as quais nossos cientistas têm acesso são os do Observatório Gemini, que possuem 8 metros de diâmetro e operam no óptico e no infravermelho.
Thaisa e sua equipe buscam a adesão do Brasil ao programa do ESO, o Observatório Europeu do Sul. A rede de telescópios ALMA é a mais poderosa do mundo atualmente, com instrumentos maiores que possibilitam muito mais observações e, consequentemente, descobertas para os cientistas que os utilizam.