Não é preciso nenhum estudo para demonstrar a capacidade humana de se deixar enganar por “besteiras pseudoprofundas” – principalmente quando se trata de algo que envolva ciência.
Mas como vamos saber que estamos sendo enganados quando lemos uma citação sobre a teoria quântica se não sabemos absolutamente nada sobre a mecânica quântica?
Em uma palestra dada por Richard Feynman em 1966, o físico teórico contou uma história sobre a diferença entre saber o nome de algo e realmente entender do assunto: “Esse menino uma vez me disse: ‘Tá vendo aquele pássaro de pé naquela árvore? Qual é o nome dele?’. Eu disse, ‘Eu não tenho a menor ideia’. E ele respondeu: ‘É um Turdus ruficollis. Seu pai não te ensina muito sobre ciência’. Eu sorri para mim mesmo, porque meu pai já tinha me ensinado que o nome não me dizia nada sobre o pássaro. Ele me disse ‘Você está vendo aquele pássaro? É um Turdus ruficollis, mas na Alemanha ele é chamado de halsenflugel, e em chinês eles chamam de chung ling e mesmo se você souber todos os nomes dele, você ainda não sabe nada sobre o pássaro. Mas ele canta, e ensina seus filhotes a voar, e voa muitos quilômetros de distância durante o verão, e ninguém sabe como ele encontra o seu caminho’, e assim por diante. Há uma diferença entre o nome da coisa e o que ela faz. O resultado disso é que eu não consigo lembrar o nome de ninguém, e quando as pessoas discutem física comigo muitas vezes elas ficam exasperadas quando dizem, ‘o efeito Fitz-Cronin’ e eu pergunto:’Que efeito é esse?’, eu não me lembro o nome”.
O que é ciência?
Feynman prosseguiu: “Tem um livro de ciência de primeiro grau que, na primeira lição, começa de uma forma infeliz a ensinar ciência. Há uma imagem de um cão de brinquedo, uma mão aparece e, em seguida, o cão é capaz de se mover. Sob a última foto, o livro diz: ‘O que o faz se mover?’ Mais tarde, há uma imagem de um cão real e a pergunta: ‘O que o faz se mover?’. Depois, há uma imagem de uma moto e a mesma pergunta e assim por diante.
A princípio pensei que eles estavam se preparando para dizer sobre o que seria a ciência – física, biologia, química – mas não era isso. A resposta estava na edição do professor do livro: a resposta era ‘a energia faz as coisas se moverem’.
Mas a energia é um conceito muito sutil. É muito, muito difícil de compreender. O que eu quero dizer é que não é fácil de entender energia bem o suficiente para usá-la de maneira correta, de modo que você posa deduzir algo corretamente usando a ideia de energia – isto está além do primeiro grau. Seria igualmente bom dizer que ‘Deus faz as coisas se moverem’, ou, ‘Espíritos as fazem se mover’, ou, ‘a mobilidade faz’ (na verdade, pode-se igualmente bem dizer, ‘a energia faz as coisas pararem’).
Podemos dizer quando algo se move que aquilo tem energia, mas não que o que o faz se mover é energia. Esta é uma diferença muito sutil. É a mesma coisa com a proposição da inércia.
Se você perguntar a uma criança o que faz mover o cachorro de brinquedo, você deve pensar sobre o que um ser humano comum iria responder. A resposta é que você dá corda; o brinquedo tenta afrouxar e empurra a engrenagem.
Que ótima maneira de começar um curso de ciências! Vá para além do brinquedo; veja como ele funciona. Veja a esperteza das engrenagens; veja as catracas. Aprenda algo sobre o brinquedo, a forma como o brinquedo é montado, a inventividade das pessoas que fizeram as catracas e as outras coisas. Isso é bom. A questão é boa. A resposta é um pouco lamentável, porque o que eles estavam tentando fazer é ensinar uma definição do que é energia, mas nada estava sendo ensinado ou aprendido.
Suponha que um aluno dissesse, ‘Eu não acho que a energia faz ele se movimentar’. Onde é que a discussão iria dar?”.
Ideia x Conceito
Feynman finalmente descobriu uma maneira de testar se você ensinou uma ideia ou se você só ensinou uma definição. Faça um teste: tente reformular o que você acabou de aprender sem usar a palavra “energia”. O que você sabe agora sobre o movimento do cão? Você não pode dizer nada? Então você não aprendeu nada sobre ciência.
“Eu acho que para a lição número um, aprender uma fórmula mística para responder perguntas é muito ruim. O livro tem algumas outras citações: ‘a gravidade faz cair’; ‘as solas dos seus sapatos se desgastam por causa do atrito’. Simplesmente dizer que é por causa do atrito é triste, porque não é ciência”, diz Feynman.
A parábola de Feynman sobre o significado da ciência é uma forma valiosa de testar se realmente aprendemos alguma coisa ou se nós só achamos que aprendemos alguma coisa, porque ouvimos alguma frase de efeito ou o nome de algum conceito. Mas é igualmente útil para testar as reivindicações dos outros.
Se alguém não pode explicar algo em uma linguagem comum, então deveríamos questionar se esta pessoa realmente entende o que professa. Se a pessoa em questão está se comunicando ostensivamente para um público não especialista usando termos específicos fora de contexto, a primeira pergunta em nossos lábios deveria ser: “Por quê?”.
Nas palavras de Feyman, “é possível seguir um manual e chamar isso de ciência, mas isso é pseudociência”. [Big Think]