Um novo estudo liderado pelo geneticista Taosheng Huang, do Hospital Infantil de Cincinnati (EUA), descobriu que o DNA mitocondrial humano pode ser herdado paternalmente durante um caso histórico que começou com o tratamento de um menino doente de quatro anos de idade.
Reescrevendo os livros didáticos
Enquanto a maioria do nosso DNA reside no núcleo da célula, parte do nosso código genético é armazenado dentro da mitocôndria, que fornece energia à célula.
Todos nós aprendemos na escola que esse DNA mitocondrial (ou mtDNA) é herdado apenas das nossas mães. Isso vai ter que mudar: novas evidências sugerem que existem exceções.
A criança, que apresentava sinais de fadiga, dores musculares e outros sintomas, foi avaliada por médicos e testada para verificar se tinha um distúrbio mitocondrial.
Os resultados chocaram a equipe; tanto que os cientistas os executaram novamente para ter certeza do que estavam vendo. O garotinho exibia uma mistura, chamada de heteroplasmia, em seu DNA mitocondrial, composto de contribuições mais do que apenas maternas.
mtDNA misturado
Embora haja evidência de transmissão de mtDNA paterno em outras espécies, a existência do fenômeno em humanos tem sido debatida.
Sendo assim, a equipe liderada por Huang resolveu estudar a família toda, descobrindo que as irmãs e a mãe do menino também mostravam evidências de heteroplasmia.
Isso levou os pesquisadores a analisar o mtDNA dos pais da mãe, concluindo que o mtDNA desta última era composto de aproximadamente 60% do código genético da mãe e 40% do pai.
“Nossos resultados sugerem que, embora o dogma central da herança materna do mtDNA permaneça válido, existem alguns casos excepcionais em que o mtDNA paterno pode ser passado para a prole”, explicam os autores em seu artigo, publicado na revista científica PNAS.
Os fatos vão se acumulando
Embora esses casos possam ser excepcionais, não são necessariamente tão raros quanto poderíamos imaginar.
No total, os pesquisadores identificaram três famílias multigeracionais não relacionadas que mostraram um alto nível de heteroplasmia de mtDNA – variando de 24 a 76% – em 17 indivíduos separados.
Antes disso, dois relatos de casos separados do início do século sugeriram que a transmissão de mtDNA biparental poderia ser possível. Agora, sabemos que esses resultados não eram isolados.
À medida que a tecnologia de sequenciamento se torna progressivamente mais avançada, nos fornece uma ferramenta melhor para entender exatamente o que está acontecendo e como a transmissão paterna do mtDNA pode ocorrer.
Consequências
Segundo os pesquisadores, nossa visão anterior sobre o assunto pode significar que muitos casos de transmissão biparental eram negligenciados anteriormente como erros técnicos.
“Esta é uma descoberta realmente inovadora”, disse o biólogo Xinnan Wang, da Universidade de Stanford (EUA), que não esteve envolvido na pesquisa. “Poderia abrir um campo totalmente novo e mudar a forma como procuramos a causa de certas doenças [mitocondriais]”.
Seja como for, a nova evidência “clara e provocativa” deve iniciar uma avaliação mais ampla das possibilidades do mtDNA, apesar de a transmissão materna continuar sendo a norma.
“A herança materna permanece absolutamente dominante em uma escala evolutiva. Eventos ocasionais de transmissão paterna parecem não ter deixado nenhuma marca detectável no registro genético humano. Ainda assim, esta continua sendo uma oportunidade sem precedentes no campo”, concluem os cientistas. [ScienceAlert]