Poesia é traduzida em DNA e implantada em bactéria
O que poesia e DNA microbiano têm em comum? À primeira vista, pouca coisa. Porém, o artista alemão Christian Bök não pensa assim. Ele é o autor de “O Xenotexto”, um poema que foi “traduzido” para DNA, para ser inserido em uma bactéria. Bök concedeu esta entrevista na exposição de sua obra, no Festival de Texto em Bury, Reino Unido.
Seu novo projeto, O Xenotexto, baseia-se em inserir poesia em cadeias de DNA em bactérias. Como o conceito surgiu?
Eu li um artigo científico descrevendo como a letra da canção “It’s A Small World After All” foi traduzida para uma sequência de nucleotídeos genéticos e então implantada em uma bactéria. Eu achei isso incrível e pensei que seria uma excelente ideia para uma experiência poética. Mas, assim como todas as vezes em que cientistas ou artistas implantaram mensagens em códigos genéticos, foi apenas um caso de republicação de textos existentes.
Então, como O Xenotexto se difere do que já havia sido feito antes?
Em primeiro lugar, é um trabalho original, eu mesmo o escrevi. Além disso, o texto foi feito de tal forma que, quando for traduzido para a sequência do gene e, em seguida, implantado, o organismo onde ele foi colocado vai produzir uma proteína viável em resposta – uma proteína que é em si um poema completamente diferente. Então, eu estou criando uma bactéria que vai não apenas arquivar meu texto em seu DNA, como também se tornar uma máquina de escrever poemas como resposta.
Qual foi o verso que você codificou em DNA?
É um poema muito curto, uma visão masculina sobre a criação estética da vida. O organismo lê o poema e escreve como resposta um texto muito melancólico e feminino – um poema sobre a perda estética da vida – num tom quase surreal. Os dois poemas estão em diálogo um com o outro.
Como você codificou o seu verso em DNA?
Há um padrão para atribuir certas letras para alguns aminoácidos, mas essa convenção é arbitrária. Eu atribuo um códon de DNA para uma determinada letra do alfabeto. Mas há uma série de “licenças poéticas”. Tendo em vista que tenho o objetivo de que a sequência genética do meu poema seja capaz de produzir uma proteína que também seja um novo poema, tem de haver uma relação mútua entre essas duas sequências. Por isso, estou produzindo uma espécie de criptograma, uma mensagem significativa que tende a ser decifrada em uma outra mensagem significativa. Isso é o que torna este projeto tão desafiador.
Há espaço para o seu poema mudar?
Devido às restrições de bioquímica que controlam a relação entre o DNA e os ácidos, meu poema sempre produz o mesmo resultado. O organismo não consegue fazer o que ele bem quiser. Em certo sentido, eu não quero que o texto mude. Produzir um artefato permanente faz parte do projeto.
Você fala muito cientificamente, mas você não é um cientista, certo?
Não. Eu tenho três diplomas de Inglês, mas para fazer esse projeto eu me dediquei inteiramente a um curso de bioquímica molecular. Eu aprendi sozinho habilidades de programação de computador. Todo o trabalho de engenharia genética fui eu que fiz. Acho parte da prática artística adquirir essas habilidades.
Como os cientistas reagem ao trabalho?
Quando eu propus a ideia anos atrás, fui recebido com ceticismo. Mas uma vez que eles se acostumaram com o projeto, ficaram satisfeitos. Aliás, é uma oportunidade para mostrar seu próprio trabalho para um público mais amplo. Meu projeto proporcionou-lhes uma oportunidade de superar a divisão entre as áreas de ciência e de humanas.
O que o projeto significa para a poesia e a ciência em uma escala mais ampla?
Historicamente, a poesia e a ciência estão em lados completamente opostos no campo do conhecimento. A poesia considera a ciência o discurso menos poético que existe, enquanto a ciência pensa a poesia como a área menos racional. Fico decepcionado ao perceber que os poetas não estão interagindo com a ciência – que é provavelmente a atividade cultural mais importante que nós, seres humanos, desempenhamos. Acredito que a alfabetização científica faça parte do que chamam ser “culturalmente alfabetizado”. Este projeto é uma tentativa de deixar essa ligação mais fácil de ser compreendida.
Qual será o próximo passo do projeto O Xenotexto?
Meu trabalho científico ainda não está concluído: estou tentando implantar o poema no organismo alvo, o Deinococcus radiodurans – que é o último grande passo. Depois, eu espero publicar um livro que mostre a poesia e as sequências do gene, descrevendo todos os dados e as experiências. Quero também incluir uma amostra real do organismo em uma exposição aberta ao público.[NewScientist]
4 comentários
Legal! Vou codificar a matéria da faculdade, colocar na bactéria, e me contaminar com ela quando chegarem as provas! 😛
seré que se eu contrair essa bactéria eu viro uma pessoa mais sensivel? =P
Fantástico!!! Quem imaginaria esse resultado?!?
Que resultado? Oo’