Em 1988, Richard Lenksi começou seu experimento simples, porém radical, para estudar como a evolução se desenrola. Ele queria saber se a evolução poderia se repetir se tivesse uma segunda chance, e se os organismos têm o que os biólogos chamam de “pico da forma”.
O projeto começou com 12 populações idênticas da bactéria E. coli colocadas em frascos cheios de glicose. Hoje, já são quase 60 mil gerações (o relatório publicado nesta semana na revista “Science Magazine” afirma que em julho eram 58 mil) que mostraram mudanças significativas.
Lenski, professor de Microbiologia e Genética Molecular da Universidade Estadual de Michigan (EUA), observou seu crescimento dia após dia, e quando as bactérias esgotaram a glicose, ele as transferiu para um novo frasco. A cada 500 gerações, algumas foram retiradas e congeladas para futuros estudos. Vinte e cinco anos mais tarde, com as bactérias passando por 6,6 gerações por dia, a sua experiência já evoluiu o equivalente a um milhão de anos de evolução humana.
Quando medido o quão rápido as bactérias evoluídas poderiam se reproduzir em relação aos seus antepassados (descongelados e ressuscitados), descobriu-se que a aptidão do descendente continuou a melhorar, sem sinais de estabilização. Isso aponta que não há um “auge evolutivo” para essas bactérias.
Michael Wiser, co-utor e estudante de graduação da Universidade no laboratório de Lenski, compara esta situação a caminhar. “Ao caminhar, é fácil começar a subir em direção ao que parece ser um pico, apenas para descobrir que o pico real está longe na distância”, exemplifica. “Agora imagine que você escalou por 25 anos e ainda está longe do pico”.
Só que os picos não são montanhas. Eles são o que os biólogos chamam de picos de forma – quando uma população encontra o conjunto ideal de mutações e por isso não pode ficar melhor. Qualquer nova mutação que vier depois, mandaria tudo por água abaixo.
As bactérias no laboratório de Lenski ainda estão se tornando mais aptas, mesmo depois de um quarto de século vivendo em um mesmo ambiente simples. Os biólogos sabem que os organismos continuam a evoluir se o ambiente está sempre mudando, contudo já se pensava que a adaptação acabaria por ficar paralisada se o ambiente permanecesse constante por um longo tempo.
Wiser tem centenas de amostras do congelador que contém registros fósseis de bactérias que remontam até a geração 0 na experiência de 25 anos. Elas voltam à vida intactas quando descongeladas. Assim, podem ser comparadas com amostras de diferentes gerações para medir a trajetória dest as bactérias ao longo das mais de 50 mil gerações.
“Não parece haver qualquer fim à vista”, afirma Lenski. “Nós costumávamos pensar que a forma das bactérias estava estabilizada, porém agora vemos que o ritmo está diminuindo, sem, contudo, parar”.
Wiser descobriu que as trajetórias correspondem a um tipo de função matemática chamada de lei de potência. Embora a inclinação da função da lei fique cada vez menos íngreme ao longo do tempo, nunca atinge um pico.
A linhagem original de E. coli levou cerca de uma hora para dobrar sua população. Mas a atual consegue fazê-lo em cerca de 40 minutos. A equipe de Lenski calcula que as futuras gerações irão reproduzir ainda mais rápido, prevendo que em cerca de um milhão de anos o seu tempo de duplicação poderia ser de cerca de 20 minutos. Ou seja, as bactérias continuarão a melhorar por tanto tempo quanto as leis da física permitirem, mas a um ritmo cada vez mais reduzido.
Noah Ribeck, outro coautor e pesquisador de pós-doutorado da Universidade, construiu um modelo usando alguns princípios bem compreendidos. “Foi surpreendente para mim que uma simples teoria pudesse descrever a totalidade de uma longa trajetória evolutiva, que inclui a adaptação inicialmente veloz e furiosa e que depois abrandou para um engatinhar”, relata Ribeck. “É encorajador que, apesar de todas as complicações inerentes aos sistemas biológicos, eles sejam regidos por princípios gerais que podem ser descritos quantitativamente”.
E quando isso vai acabar? “Eu chamo isso de uma experiência que continua a apresentar novos resultados”, garante Lenski. “Mesmo depois de 25 anos, ainda está gerando novas e excitantes descobertas. A partir dos modelos, podemos prever como as coisas vão evoluir – a que forma as bactérias vão chegar – se as futuras gerações de cientistas continuarem com a experiência muito tempo depois de eu ter partido”.
Lenski espera que uma doação seja feita para manter o experimento funcionando para sempre. Até agora, já participaram do estudo 30 estudantes de graduação e pós-doutorado e outros 40 colaboradores externos. São mais de 4 mil frascos congelados com bactérias ancestrais e evoluídas, armazenadas em 10 mil litros de uma solução e seis congeladores. Para manter tudo isso, até agora foi estimado um investimento de US$ 4 milhões (cerca de R$ 8 mi). [Science Magazine, io9, Scicasts]