Estudo: precisamos repensar a definição de vida para desvendar os mistérios de sua origem

Por , em 12.12.2012

Encontrar vida fora da Terra tem se mostrado um grande desafio. Tudo bem que só conhecemos poucos dos planetas, satélites e estrelas que existem no universo, mas, ainda assim, tudo que encontramos parece estéril considerando o padrão – e a diversidade – de vida encontrado no nosso planeta.

Talvez esse seja então o problema: nós queremos encontrar vida exatamente como a conhecemos. Mas o que é, exatamente, vida? Somos só nós, os outros animais, as bactérias?

Parte do nosso problema em encontrar vida é que não temos uma boa definição do que é a vida. “Normalmente, nossa forma de identificar a vida na Terra é através da presença de DNA no organismo”, disse Sara Walker, astrobióloga da Universidade do Arizona (EUA).

Porém, essa é uma definição química que pode limitar a busca de vida extraterrestre, além de incluir, erroneamente, sistemas não vivos nessa classificação, como uma placa de Petri cheia de DNA autorreplicante.

“Neste momento, estamos nos concentrando na busca de vida que seja idêntica a nós, com as mesmas moléculas”, afirmou Chris McKay, astrobiólogo da NASA. “Essa abordagem potencialmente estabelece uma estrutura que nos permite considerar outras classes de moléculas orgânicas que poderiam ser a base da vida”.

Por décadas, cientistas tentam recriar os acontecimentos que deram origem à vida no planeta. Na famosa experiência de Miller-Urey relatada em 1953, os cientistas carregaram eletricamente uma sopa primordial de elementos químicos que imitavam a composição química dos oceanos no início do nosso planeta, e descobriram que vários aminoácidos simples, os blocos mais primitivos de vida, se formaram como resultado.

Mas, desde então, os cientistas não avançaram muito na compreensão de como simples aminoácidos podem ter, eventualmente, se transformado em simples, e depois em complexos, seres vivos.

“Na tentativa de explicar como a vida veio a existir, as pessoas têm se concentrado em um problema de química, como se criar vida fosse como fazer um bolo, para o qual nós precisamos de um certo conjunto de ingredientes e instruções para seguir”, disse Paul Davies, físico teórico e astrobiólogo também da Universidade do Arizona. “Essa estratégia não capta a essência do que é a vida”.

Davies e Walker, juntos em uma nova pesquisa, afirmaram que estamos olhando errado para o mistério da origem da vida. Em vez de tentar recriar os blocos de construção químicos que deram origem à vida 3,7 bilhões anos atrás, eles acreditam que devemos usar as principais diferenças na forma como os seres vivos armazenam e processam informações para desvender esse mistério.

Mão dupla

A equipe de cientistas criou um modelo matemático simples para capturar a transição de um ser não vivo para um ser vivo. Segundo os pesquisadores, todos os seres vivos têm uma propriedade que objetos inanimados não têm: fluxos de informação em duas direções. Todos os sistemas vivos são caracterizados por duas vias ou fluxos de informação, tanto de baixo para cima quanto de cima para baixo, em termos de complexidade.

Por exemplo, quando uma pessoa toca um fogão quente, as moléculas de sua mão sentem o calor, transmitem essa informação ao cérebro, e o cérebro, então, diz que para as moléculas da mão se moverem.

Enquanto esse fluxo de informações em dois sentidos governa o comportamento de formas de vida simples e complexas da mesma forma, das menores bactérias às baleias, organismos não vivos não apresentam tal fluxo. Se você colocar um bolo no fogão, o calor pode queimar o bolo, mas ele não vai fazer nada para responder.

Outra característica dos seres vivos é que eles têm diferentes locais físicos para armazenar e ler informação. Por exemplo, o alfabeto de letras no DNA carrega as instruções para a vida, mas outra parte da célula, chamada de ribossomo, é que deve traduzir essas instruções em ações dentro da célula.

Um probleminha desta definição é que, através dela, computadores que armazenam dados em um disco rígido e os lê usando uma unidade de processamento central teria as características de vida – embora isso não signifique que eles estão vivos.

O novo modelo proposto pela equipe ainda está em seu começo e não aponta para novas moléculas que poderiam ter gerado vida em outros planetas, mas estabelece o comportamento necessário que um sistema precisa ter para ser considerado vivo.

“Este é um manifesto”, disse Davies. “É uma maneira de dizer que temos de reorientar e redefinir o assunto, e olhar para ele de uma maneira diferente”.

Vida = processos de informações

Essa não é a primeira vez que um estudo sugere que repensemos a definição de vida sem utilizar elementos químicos.

Uma pesquisa de Christoph Adami afirmou que a vida pode ser definida em termos de processos de informações. Entendendo processos fundamentais que não se referem a um substrato em particular, podemos procurar por vida em outros mundos.

Mesmo na Terra, alguns organismos não se comportam da maneira que definiríamos como vida. Por exemplo, um ser vivo é todo ser que um dia morre. Bom, exceto por um pólipo que pode retroceder para sua forma de embrião e crescer de novo, nunca morrendo. Nesses casos, a vida não é definida através de conceitos com os quais estamos acostumados, mas somente através de processos.

Adami chegou a conclusão de que existe uma certa distribuição de elementos (alguns em alta frequência, porque são úteis, outra em baixa frequência, porque são prejudiciais e só existem no nível do acaso) que é robusta e vista em qualquer situação onde há um sistema vivo. Existe um outro tipo de distribuição visto constantemente onde não há vida.

Essa distribuição não tem a ver com quais elementos estão presentes nela, mas no próprio padrão da distribuição. Em resumo, ele sugere que podemos encontrar vida que não se parece com a nossa usando um “padrão universal de não vida”, e procurando por grandes desvios desse padrão.[LiveScience]

11 comentários

  • Wangles MReis:

    Dizer que seres vivos são aqueles com consciência, que tem medo, que sabe sua existência é algo totalmente sem nexo. Uma vez que temos exemplares perfeitamente “vivos” que simplesmente estão ali seguindo seus instintos sem ao menos possuir uma faísca de consciência, por mais que se tente crer nisso!

    Vida pode ser definida de inúmeras formas, mas definitivamente não se limita a consciência… pra falar a verdade, isso é até ignorância!

    • Lucas Noetzold:

      Mas qual a diferença entre uma célula auto replicante e um vírus de computador além da complexidade?

  • D. R.:

    Excelente artigo!

    Eu também tenho a minha própria definição de vida que tem um pouco a ver com o artigo e com os demais comentários.

    Para mim, os três maiores mistérios do mundo são a origem do universo, a origem da vida e a origem da consciência.

    Se definirmos a vida como tudo que um dia nasce, evolui e morre; então, teremos de considerar que o próprio universo, as galáxias, as estrelas e os planetas são seres vivos também. Até mesmo uma pedra, se analisarmos desse modo a longo prazo, se encaixaria de certa forma nesta definição.

    Porém, toda a formação do universo, das estrelas, das galáxias, dos planetas, etc., pode ser matematicamente prevista (desde o Big Bang até os dias de hoje e futuros também) pelas leis rígidas da física e da química. Ou seja, até o surgimento da vida, tudo no universo pôde ser descrito e previsto por equações matemáticas; pois as partículas físicas não têm vontade própria, não podem escolher aonde vão, são simplesmente guiadas pelas leis da física; e, por isso, toda a sua trajetória, interação e evolução podem ser previstas através de cálculos matemáticos simples ou complexos; como, por exemplo, o nascimento e a morte de uma estrela. Daí, deduzimos que vivemos num mundo físico, lógico e matemático.

    Por isso, para mim, uma definição de ser vivo seria aquele que tem algum tipo mínimo de inteligência (como bem disse o Lucas), que pode tomar algum tipo de decisão lógica sem depender unicamente das leis da física ou de meras reações químicas; ou seja, são seres capazes de processar informações (como a tese defendida no artigo). Nesta definição de vida, poderíamos considerar seres vivos desde bactérias, autômatos celulares, até robôs ou programas de computador; ficando de fora dessa definição as estrelas, os planetas, as galáxias, etc.; que nascem e morrem, mas seguem somente as leis da física e são totalmente previsíveis.

    Por outro lado, é difícil de acreditar que um robô ou programa de computador pode ser considerado algo realmente vivo; já que ele não tem nenhum tipo de consciência e sentimento e de vontade própria. Aí, que penso em um outro tipo de definição de vida onde podemos considerar um ser vivo todo aquele que tem algum tipo de consciência e sentimento; seria aquele que tem vontade própria, que sofre, que sente dor, medo, etc.

    Mesmo um inseto, por menor que seja, parece lutar pela sua sobrevivência, parece ter medo da morte quando ameaçado. Será que uma simples bactéria pode sentir medo? Será que uma planta tem algum tipo de sentimento, será que fica triste quando a maltratamos e sofre quando a destruímos, mas não pode reagir? Será que até uma estrela, mesmo seguindo as rígidas leis da física, tem algum tipo de consciência, será que tem uma alma?

    É difícil saber a verdade; logicamente, se existe somente a matéria, isso seria algo impossível; mas, se existe uma dimensão espiritual, um mundo dos sentidos e dos sentimentos totalmente distinto do nosso mundo físico, lógico e matemático em que vivemos, aí sim seria possível a alma (como bem disse o Costa: a ‘anima’, a essência da vida) habitar a matéria.

    Por isso, penso:

    Será que a matéria, ao longo da evolução, criou a vida, a consciência e os entes espirituais; ou os entes espirituais é que criaram a matéria e a vida para habitar em nós?

    Será que o nosso cérebro criou o amor, ou o Amor nos criou para habitar em nós; conforme, estraaanhameeente, afirma a Bíblia quando diz que Deus é amor?

    Eis a questão!

    Seja qual for a verdade, no fim das contas, a vida ainda continua sendo um ESPANTOSO MISTÉRIO!!!

  • Orlando Rios:

    Os pesquisadores precisam deixar de lado os festivais de alienigenas mascarados dos filmes Star Wars e Star Trek.

    Os tecnologos da Nasa, precisam reprojetar e reorientar os sensores de seus jipes espaciais que procuram vida biologica baseada apenas em carbono, ou procuram traços de água ou oxigenio.

    A vida pode estar acontecendo em diferentes formas e formatos, como nos subterraneos, em planetas flamejantes ou gelados, no vacuo espacial ou mesmo em campos eletro-magnéticos.

  • Alberto Campos:

    Os tres mistérios da natureza: Criação do universo, da vida e da inteligencia. O mais dificio dos tres é a vida. Sobre o universo, o pai de todos, temos noções e várias teorias e estamos mais próximos de saber da verdade. Sobre a vida estamos engatinhando. Falta muito. Sobre a inteligencia sabemos que só depende do tempo e da evolução. Acredito que nunca saberemos como foi a primeira vida. Na verdade nem li o artigo todo. Acho sem solução para tão breve. Aproveito para apresentar tres definições:
    Universo = Energia + espaço e tempo
    Vida = Energia + aminoácidos e água
    Inteligencia = Vida + evolução e tempo

  • Décio Luiz:

    Olá menina. Saudações.
    O fato é que a Ciência começa a se deparar com a insuficiência dos parâmetros para a descriptibilidade do existente.

  • Costa:

    Admiro a honestidade de admitirem que a vida ainda é um mistério. Mas a essência da vida é a ‘anima’ (alma), o que anima uma máquina biológica. Se compararmos uma pessoa com um automóvel, sabemos que a ciência já estudou, esmiuçou, e catalogou, praticamente todas as peças do carro. Só falta achar o motorista, ou seja, o ser que anima a máquina e a dirige.

    • Lucas Noetzold:

      Aí você precisa definir a animação. Uma estrela funciona sem ninguém a “animando”, o vento sopra assim também.

    • Costa:

      Ledo engano meu caro Lucas,
      A mesma animação ocorre do reino mineral, vegetal e animal terrestres, às maiores e mais longinguas estrelas e nenhum vento sopra por acaso.

    • Fernando Allan:

      Comparar estrela com vida humana, fica complicado.

  • Lucas Noetzold:

    Creio que a melhor definição de vida seria: algo que tenha um certo nível de de raciocínio (a definir-se), junto com tendência a autopreservação e tendência a evolução (mental, isto é, aprender para se adaptar).Quanto a este último item não tenho tanta certeza.
    Isto excluiria bactérias e alguns animais muito simples da lista de vivos, mas se olharmos bem, são apenas maquininhas moleculares extremamente complexas.

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