Hipótese da universalidade dos idiomas é testada baseada na biologia

Por , em 17.04.2011
Uma ideia antiga de que as línguas humanas compartilham características universais ditadas pela estrutura do cérebro humano tem sido posta em dúvida. Um estudo publicado na revista Natureza emprestou métodos da biologia evolutiva para traçar o desenvolvimento da gramática de várias famílias linguísticas.

Os resultados sugerem que características compartilhadas entre famílias de línguas evoluíram de forma independente em cada linhagem. Os autores chegaram à conclusão de a evolução cultural – e não do cérebro – é o fator principal que impulsiona o desenvolvimento da linguagem.

Na base da pesquisa está um método conhecido como estudos filogenéticos.

O autor principal, Michael Dunn, linguista evolucionista do Instituto Max Planck de Psicolinguística, na Holanda, disse que a abordagem é semelhante ao estudo de plantas de ervilhas feita por Gregor Mendel, que levou à idéia de hereditariedade de traços.

“Ao olhar para a variação entre os descendentes das plantas e saber como eles se relacionavam entre si, Mendel pôde estudar os mecanismos que devem controlar essa variação”, explica Dunn.

“Ele deduziu a existência de algum tipo de transferência de informação apenas a partir do conhecimento de árvores genealógicas e da observação da variação. Isso é exatamente a mesma coisa que estamos fazendo”, compara.

Estudos filogenéticos (que lidam com hipóteses de evolução) modernos se concentram nas variações entre animais que são conhecidos por terem de alguma forma uma relação. A partir daí, eles podem estudar quando surgiram as estruturas específicas que os diferenciam.

Para seus estudos, a equipe pesquisou as características da ordem das palavras em quatro famílias de línguas: indo-europeias, uto-astecas, bantos e austronésias.

Eles consideraram se as preposições ocorrem antes ou depois de um substantivo (“no barco” ou “barco no”)  e se a ordem das frases segue o padrão sujeito + objeto ou o contrário (“eu coloco o cão no barco” ou “eu o cão coloco barco no”).

O método começa usando dados linguísticos bem estabelecidos de palavras e da gramática dentro dessas famílias – e construindo uma “árvore genealógica” desses idiomas.

“Uma vez prontas essas árvores, observamos a distribuição dessas diferentes ordens de palavras sobre as línguas descendentes, e construímos modelos evolutivos, que deve reproduzir mais ou menos a diversidade linguística que observamos no mundo,” explica Dunn.

O modelo revelou que, enquanto estruturas diferentes das línguas na árvore genealógica podem ser vistas como uma evolução, como e quando elas evoluíram depende de qual ramos elas pertencem.

“Nós mostramos que cada uma dessas famílias de línguas evolui de acordo com seu próprio conjunto de regras, não de acordo com um conjunto de regras universal”,explica Dunn.

“Isso vem de encontro às teorias de universalidade da gramática. Sugere que a linguagem não é parte de um módulo especializado distinto do resto da cognição, mas faz parte das amplas habilidades cognitivas humanas”.

O estudo ainda afirma que “a evolução cultural é o principal fator que determina a estrutura linguística. O estado atual de um sistema linguístico define e restringe os estados futuros”.

Steven Pinker, cientista cognitivo da Universidade de Harvard, chamou a obra de “um estudo importante e bem-vindo”.

Entretanto, Pinker acha que detalhes sobre o método necessitam ser melhores justificados a fim de obter mais apoio à hipótese de que as fronteiras culturais impulsionam mais o desenvolvimento de uma linguagem do que as limitações biológicas.

“Os autores sugerem que a mente humana tem uma tendência a generalizar ordens em frases de diferentes tipos, o que não ocorreria se a mente trabalhasse cada tipo de frase com uma regra única e isolada”, ressalta.

“A tendência pode ser parcial, e pode ser elaborada de diferentes maneiras em diferentes famílias de línguas, mas precisa-se de uma explicação em termos do funcionamento da mente dos falantes da língua”, completa. [BBC]

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