A matemática pode não existir “de verdade”. Gostando ou odiando-a, não dá para negar sua importância: como um sistema, ela é elegante, e até mesmo bela. Nas palavras de Eugene Wigner, ela é irracionalmente efetiva quando colocada a trabalhar nos outros campos científicos, mas o que ela estuda?
A biologia estuda os seres vivos, a física estuda o universo e suas forças, a química estuda os elementos químicos e reações, e a matemática estuda… a matemática.
Diferente de todas as outras ciências, a matemática não tem um componente empírico. Você não pode vê-la acontecer. Claro, se você pegar uma pessoa e fizer um clone dela, terá duas. Mas a ideia de contar, as parábolas, as subtrações, tudo isto é algo do universo, ou é o produto do cérebro humano, em todo seu gênio e esplendor? Em outras palavras, as pessoas descobriram a matemática ou inventaram a matemática?
A ideia de que as pessoas descobriram a matemática e que ela existe mesmo que não existissem pessoas para descobri-la é a mais popular entre os matemáticos.
Realismo matemático
O Realismo Matemático diz que a matemática é real, tem existência objetiva, como uma coisa. Nós, com nosso cérebro genial, descobrimos a matemática e criamos usos práticos para ela. Novos conceitos matemáticos seriam como espécies desconhecidas, só temos que encontrá-las e acrescentá-las à nossa caixa de ferramentas.
Os antirrealistas dizem que toda a matemática é criação do cérebro humano, uma invenção. Eles usam expressões como “matemática é uma metáfora” ou “matemática é uma linguagem”, ou ainda, “ficcionalismo”. O ficcionalismo afirma que todos os conceitos matemáticos, como raiz quadrada, o número 42, parábolas, etc., são uma ficção, ou seja, os elementos de uma história. A história da matemática seria cheia de ficções que teriam tanto valor quanto “James Bond matou o vilão”, que faz sentido dentro da história, e só dentro dela.
Eles acreditam que o que fazemos é usar a história da matemática para descrever coisas reais que não contém nem fazem matemática, como a andorinha, que não precisa de matemática para voar à 40 km/h. O filósofo Alain Badiou afirmou que a matemática é uma estética rigorosa.
É tudo uma conversa filosófica bacana, mas as coisas mudam quando consideramos as ramificações. Por exemplo, o que está em jogo quando consideramos a fonte da matemática? Só a matemática? Tudo?
Do ponto de vista dos realistas matemáticos, a matemática trata da verdade. Se você tiver cinco exemplares de uma coisa e juntar mais cinco, vai ter 10 destas coisas. Isto é considerado uma verdade, e pode ser provado. Para os antirrealistas, não há “cinco”, nem “dez”, nem mesmo “verdade matemática”.
Talvez seja só a matemática que esteja em jogo neste caso. Para os linguistas cognitivos George Lakoff e Rafael Nuñez, nós, humanos, tendemos a descrever, descobrir e testar as coisas, e a matemática é só um sistema para fazer isso. Ela é capaz de modelar regularidades dentro do universo caótico que vivemos. É a nossa maneira de encontrar um sentido nele. Se houvesse uma forma melhor de modelá-lo, nós a utilizaríamos.
Para completar a discussão, a matemática só pode ser provada pela matemática, o que cria uma tautologia: a única matemática conhecida pelos humanos é a que os humanos podem conhecer. Pode parecer óbvio, mas existem implicações importantes aí. Os realistas matemáticos acreditam que existe no universo mais conceitos matemáticos que ainda não conhecemos, que nunca conheceremos, e que não podemos conhecer. E na ausência de qualquer evidência observável, o realismo matemático acaba se apoiando em fé – a fé em uma entidade matemática, ou conjunto de entidades matemáticas, de que elas existem, estão por aí, aguardando serem descobertas, e estariam lá mesmo que não existíssemos.
Mas a ideia de que existe uma realidade matemática aí fora, que não podemos ver nem testar, e que tem que ser aceita por fé não se parece com ciência, mas o contrário dela. E isso significa que as ideias dos realistas matemáticos é falsa? O que nossos informados leitores acham: a matemática é uma construção do cérebro humano, ou é uma realidade objetiva – imperceptível e inobservável, mas objetiva?[Open Culture, Style.org]