Hubble descobre que um feixe de buraco negro promove erupções estelares
Em uma descoberta inesperada, astrônomos que utilizam o Telescópio Espacial Hubble, fruto de colaboração entre a NASA e a Agência Espacial Europeia (ESA), observaram que o jato de plasma lançado por um buraco negro supermassivo no centro de uma galáxia parece estar provocando erupções estelares em seu caminho. As estrelas afetadas, conhecidas como novas, não estão diretamente no jato, mas encontram-se perigosamente perto, numa região vizinha hostil.
Esse fenômeno foi documentado por meio de uma pesquisa publicada no arXiv. A equipe de cientistas, liderada por Alec Lessing da Universidade de Stanford, admitiu estar perplexa com o que encontraram. Eles acreditam que ainda falta algo crucial em nossa compreensão sobre como esses feixes energéticos interagem com as estrelas ao seu redor. E quem pode culpá-los? Afinal, buracos negros são famosos por não jogar limpo com as leis da física que conhecemos.
No caso das novas, essas explosões estelares acontecem em sistemas binários onde uma estrela anã branca morta recebe hidrogênio de sua companheira, que é uma estrela inchada e envelhecida. Quando a anã branca acumula o suficiente dessa substância, ocorre uma explosão massiva, semelhante a uma bomba nuclear. Curiosamente, a anã branca sobrevive ao processo e recomeça o ciclo, sugando mais combustível de sua parceira até a próxima erupção.
Ao analisar a galáxia M87, o Hubble detectou duas vezes mais novas próximas ao jato do buraco negro do que em outras regiões da galáxia. Esse jato, que se estende por cerca de 3.000 anos-luz, é disparado por um buraco negro com uma massa 6,5 bilhões de vezes maior que a do Sol. O plasma lançado viaja quase à velocidade da luz, e qualquer estrela azarada o suficiente para cruzar esse feixe seria inevitavelmente fritada. No entanto, até mesmo a proximidade do jato já parece perigosa o suficiente para desencadear essas explosões estelares.
Os cientistas ainda debatem como o jato está interferindo com os sistemas estelares próximos. Uma das hipóteses é que o jato, ao passar, empurra hidrogênio em direção às anãs brancas, fazendo com que elas entrem em erupção com maior frequência. Há também a possibilidade de que a pressão da luz emitida pelo jato esteja acelerando o processo de transferência de massa para as anãs brancas, resultando em mais explosões. Outra ideia envolve o aquecimento da estrela companheira, mas os cálculos indicam que esse efeito não seria grande o suficiente para explicar as erupções adicionais.
Michael Shara, do Museu Americano de História Natural, lembrou que essa não é a primeira vez que observações de M87 sugerem um aumento na atividade próxima ao jato, mas desta vez o Hubble forneceu dados bem mais consistentes, com uma quantidade maior de eventos registrados e uma análise estatística robusta.
O Telescópio Hubble, desde seu lançamento em 1990, já observava comportamentos estranhos ao redor do buraco negro de M87, mas sua primeira geração de câmeras tinha um campo de visão estreito demais para oferecer uma visão abrangente. Somente com câmeras mais modernas, e após um esforço coordenado de nove meses para monitorar a galáxia a cada cinco dias, os cientistas conseguiram coletar dados suficientes para traçar um panorama mais completo.
Os novos dados indicam que, em apenas um terço da galáxia M87, o Hubble conseguiu identificar 94 novas em erupção. Ao mapear sua distribuição, ficou evidente que elas se concentram ao longo do caminho do jato. Esse padrão é claro o suficiente para ser notado sem grandes complicações estatísticas—basta olhar para as imagens. E embora os cientistas tenham ficado surpresos com a descoberta, as análises confirmaram o que já era visível.
Chiara Circosta, pesquisadora da ESA, reforça que essa é uma observação intrigante, pois ajuda a entender melhor como os jatos de buracos negros podem influenciar as galáxias em que estão localizados, possivelmente afetando até a formação de novas estrelas. Ela acrescenta que essas observações detalhadas são extremamente valiosas, já que a maioria dos telescópios terrestres não tem a precisão necessária para enxergar tão profundamente na galáxia M87, devido ao brilho intenso ao redor do buraco negro. Por enquanto, apenas o Hubble é capaz de detectar as novas em meio ao brilho ofuscante do núcleo da galáxia.
A cada dia, uma nova erupção ocorre em algum lugar da galáxia M87, mas com cerca de 100 bilhões de galáxias no universo observável, podemos imaginar que a cada segundo, em algum canto do cosmos, um milhão de novas estão explodindo como fogos de artifício cósmicos. É um espetáculo que só o Hubble poderia nos proporcionar com tanta clareza.