O Colossal Dinossauro Roubado do Brasil que Foi Parar na Alemanha

Por , em 27.05.2023
Uma interpretação artística do Irritator challengeri movendo sua mandíbula inferior estendida na água. (Crédito da imagem: Olof Moleman/Universität Greifswald)

Imagine isso: um colossal dinossauro carnívoro semelhante ao Spinosaurus tendo seu lanche “ao estilo pelicano”, estendendo sua mandíbula inferior para agarrar a comida. Esta teoria divertida, mas intrigante, foi proposta por uma equipe de pesquisadores europeus. No entanto, seu entusiasmo acadêmico foi recebido com caras feias, já que alguns fãs de dinossauros alegaram que os fósseis, supostamente contrabandeados do Brasil, deveriam ser devolvidos à nós.

A raiz de todo esse alvoroço é o Irritator challengeri, um membro de destaque da família Spinosauridae – um fascinante conjunto de dinossauros bípedes carnívoros que exibem focinhos alongados e semelhantes aos de crocodilos. Esta espécie superstar, com um impressionante comprimento de 6,5 metros, foi inicialmente detalhada em 1996, graças a fósseis desenterrados na Bacia do Araripe, no nordeste. Esses relíquias depois encontraram seu caminho para a Alemanha, e agora moram o Museu de História Natural de Stuttgart, situado no estado de Baden-Württemberg.

Nossos astutos pesquisadores, utilizando as mais recentes técnicas digitais, embarcaram em uma missão de detetive, investigando o fóssil do I. challengeri em Stuttgart. Sua investigação levou-os a uma revelação chocante – a mandíbula inferior dessa espécie poderia se abrir para os lados, o que permitiria ao dino ampliar sua faringe, a área escondida atrás do nariz e da boca. Este comportamento é surpreendentemente semelhante a um pelicano estendendo seu bico para agarrar pequenos peixes para o almoço. A declaração dos pesquisadores insinua que o I. challengeri possivelmente tinha um hábito alimentar semelhante.

O trabalho da equipe também descobriu que o posicionamento dos olhos da criatura levava a uma inclinação natural de 45 graus de seu focinho, permitindo mordidas rápidas, porém relativamente fracas. Estas observações combinadas sugerem que o focinho do dinossauro foi feito sob medida para rapidamente capturar presas em corpos d’água rasos como beira de rios e lagos.

É aqui que o drama se intensifica: a aventurada jornada dos fósseis do Brasil para a Alemanha levanta algumas suspeitas. Os fósseis foram desenterrados por escavadores comerciais e vendidos ao Museu de Stuttgart antes de 1990, quando o Brasil passou a controlar melhor as exportações científicas.

Entre em cena Juan Carlos Cisneros, um paleontólogo e jurista que não participou do estudo. Ele apontou uma lei brasileira pré-existente de 1942 que declarava os fósseis brasileiros como propriedade federal, proibidos de serem vendidos. Ele argumentou que tecnicamente os fósseis foram roubados pelos escavadores que os exportaram, acrescentando, “comprar algo roubado não transforma magicamente você no legítimo proprietário”.

Uma réplica do esqueleto do I. challengeri em exibição no Museu Nacional de Natureza e Ciência em Tóquio. (Crédito da imagem: Wikimedia)

Cisneros e alguns de seus colegas veem esta questão como um exemplo clássico de colonialismo científico. O dinossauro é um tesouro nacional do Brasil explorado para o progresso científico em uma nação europeia. Isso grita colonialismo – usando recursos preciosos de países mais pobres para beneficiar os mais ricos. Estudos como esses, baseados em fósseis potencialmente ilícitos, dão credibilidade a esta abordagem colonialista, tornando mais difícil para os países menos afluentes contribuírem para a ciência, acrescentou Cisneros.

Assim que o artigo foi publicado, uma enxurrada de fãs de fósseis e paleontólogos começaram a usar a hashtag #IrritatorBelongsToBR nas redes sociais, resultando na revista Palaeontologia Electronica removendo temporariamente o artigo devido ao alvoroço.

Paul Stewens, um estudante de direito não envolvido com o estudo, vê o tumulto online como um surto atrasado contra o colonialismo científico há muito tempo sem controle no campo da paleontologia. Stewens esclareceu seus seguidores no Twitter com um tópico detalhado discutindo os dilemas éticos ligados ao estudo.

Os pesquisadores europeus, no entanto, incluíram em seu artigo uma declaração de ética reconhecendo o “status potencialmente delicado” dos fósseis. Ainda assim, Cisneros e Stewens acreditam que esta declaração não aborda completamente a controvérsia.

Co-autor do estudo, Serjoscha Evers, expressou que eles sabem que alguns consideram o fóssil ilegal, mas argumentou que essa questão requer uma clarificação legal, algo que eles não puderam acessar antes de iniciar o estudo. Evers continuou, dizendo que eles simplesmente adicionaram novo conhecimento a um fóssil de dinossauro conhecido desde 1996 e não acreditavam que tais fósseis deveriam enfrentar um embargo à publicação.

Apesar disso, críticos argumentam que revelações científicas não deveriam ser uma justificativa para o uso de fósseis contenciosos. Cisneros enfatizou que uma equipe de pesquisa brasileira poderia ter chegado aos mesmos resultados.

Uma saga semelhante já se desenrolou em torno de fósseis do dinossauro carnívoro Ubirajara jubatus, descobertos no Brasil e vendidos ao Museu Estadual de História Natural de Karlsruhe, na Alemanha. O museu desde então decidiu devolver o U. jubatus para o Brasil.

Tanto Cisneros quanto Evers concordam que os fósseis do I. challengeri devem “definitivamente” ser devolvidos ao Brasil. Independentemente de qualquer decisão legal, Evers acredita que é o melhor resultado, já que “o spinosaurídeo mais completo desse país merece uma vitrine local”.

Cisneros insiste que é crucial continuar destacando essas questões, apesar de possíveis conflitos entre os pesquisadores. Colonialismo científico é uma dor persistente que amplifica as desigualdades sociais nos países de origem”, afirmou. [Live Science]

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