A inovação das bactérias que produzem oxigênio

Por , em 21.10.2023
Imagem de microscopia das bactérias alojadas na tinta. (Krings et al., Universidade de Surrey)

Bactérias que prosperam em ambientes desérticos, capturando a luz solar, absorvendo o dióxido de carbono e emitindo oxigênio, podem ser incorporadas a uma substância semelhante a tinta para melhorar a atmosfera em um possível habitat em Marte. A responsável por essa descoberta é a Chroococcidiopsis cubana, e uma equipe de pesquisa liderada pela microbiologista Simone Krings, da Universidade de Surrey, no Reino Unido, desenvolveu com sucesso um revestimento biológico especializado que libera consistentemente oxigênio, ao mesmo tempo em que reduz os níveis de dióxido de carbono ao seu redor. Essa descoberta tem implicações não apenas para a exploração espacial, mas também para enfrentar desafios ambientais aqui na Terra.

Suzie Hingley-Wilson, bacteriologista da Universidade de Surrey, destaca a necessidade urgente de materiais inovadores e sustentáveis em resposta ao aumento dos níveis de gases de efeito estufa, especialmente o dióxido de carbono, e às preocupações com a escassez de água devido ao aquecimento global. O conceito da equipe de “tintas vivas” ou revestimentos biológicos mecanicamente duráveis poderia desempenhar um papel crucial na mitigação desses desafios, reduzindo o consumo de água geralmente associado aos processos baseados em biorreatores.

Chroococcidiopsis é um gênero resiliente de bactérias conhecido por sua capacidade de se adaptar a ambientes aparentemente inóspitos na Terra. Ela utiliza uma forma única de fotossíntese que prospera em condições de luz extremamente baixa, tornando-a adequada para locais com iluminação mínima, como cavernas ultra profundas e a crosta oceânica subterrânea da Terra.

Chroococcidiopsis cubana, em particular, é encontrada em condições semelhantes ao deserto, que se assemelham ao ambiente hostil de Marte. Como outras cianobactérias, ela exibe valiosas propriedades metabólicas: ela captura e fixa o dióxido de carbono por meio da fotossíntese, convertendo-o em compostos orgânicos enquanto libera oxigênio como subproduto.

Krings e sua equipe de pesquisa buscaram aproveitar essas propriedades para criar um revestimento biológico que funcionasse como uma “tinta viva” contendo bactérias incorporadas. O desafio foi garantir a durabilidade do revestimento biológico sem comprometer o bem-estar das bactérias que ele abriga. Isso envolveu o design de uma matriz porosa, mas mecanicamente robusta, alcançada por meio da mistura de látex com partículas de nanoclay, para encapsular as bactérias com segurança.

Para validar a eficácia de seu revestimento biológico, a equipe o monitorou por 30 dias, conduzindo medições da produção de oxigênio e absorção de dióxido de carbono. Eles descobriram que o revestimento biológico liberava consistentemente oxigênio a uma taxa de até 0,4 gramas de oxigênio por grama de biomassa diariamente, mantendo essa taxa ao longo do mês. Isso equivale a aproximadamente 400 gramas de oxigênio por quilograma de tinta. Além disso, o revestimento biológico absorvia dióxido de carbono. Os pesquisadores deram o nome apropriado para sua criação: “Tinta Viva Verde”.

Embora a produção de oxigênio dessa tinta possa não ser suficiente por si só para um habitat em Marte (uma missão de um ano em Marte requer aproximadamente 500 toneladas métricas de oxigênio), cada pequena quantidade de oxigênio gerada no local reduz a quantidade que precisa ser transportada da Terra para o planeta vermelho a bordo de espaçonaves.

Krings enfatiza a notável capacidade de resiliência das bactérias fotossintéticas Chroococcidiopsis em sobreviver a condições extremas, incluindo secas e exposição a níveis elevados de radiação ultravioleta, o que as torna candidatas promissoras para uma possível colonização de Marte.

Este avanço na criação de uma “Tinta Viva Verde” à base de bactérias desertas poderia revolucionar a forma como abordamos a habitação em ambientes hostis e também oferecer soluções inovadoras para desafios ambientais em nosso próprio planeta. Além disso, ao reduzir a necessidade de transporte de grandes quantidades de oxigênio para missões espaciais, poderíamos estar um passo mais perto de tornar a exploração de Marte uma realidade concreta. À medida que continuamos a desvendar os segredos das bactérias do deserto, o potencial para futuras aplicações na Terra e no espaço parece emocionante e promissor. [Science Alert]

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