Refrigerantes sem calorias são associados a aumento do risco de AVC e demência

Por , em 28.04.2017

Um estudo, publicado no site da revista “Stroke” no último dia 20, levantou um novo alerta sobre o consumo de refrigerantes dietéticos. A pesquisa mostra que o consumo de uma lata de refrigerante diet ou mais por dia foi associado com um risco três vezes maior de acidente vascular cerebral e demência. Os dados são referentes a um período de 10 anos de acompanhamento, em comparação com indivíduos que não consumiam bebidas adoçadas artificialmente.

“Há muitos estudos que sugerem os efeitos prejudiciais de bebidas açucaradas, mas eu acredito que nós também precisamos considerar a possibilidade que as bebidas dietéticas podem não ser alternativas saudáveis”, declarou o autor principal, Matthew P. Pase, da Faculdade de Medicina da Universidade de Boston, nos Estados Unidos, ao portal Medscape. “Não podemos mostrar [a relação de] causa e efeito neste estudo já que ele tem a proposta de ser observacional, mas dada a popularidade das bebidas dietéticas, precisamos desesperadamente de mais pesquisas sobre essa questão”.

O pesquisador afirma não recomendar cortar absolutamente as bebidas dietéticas do cardápio, mas pede cautela, especialmente aqueles que consomem muitas bebidas dietéticas diariamente. “Eu acredito que precisamos repensar o lugar dessas bebidas”, disse.

Causalidade reversa?

Pase também aponta que é possível que o resultado possa ser devido à causalidade reversa. Ou seja, ainda não está claro se os refrigerantes dietéticos fazem com que as pessoas tenham mais derrames e demência ou se pessoas que não estão saudáveis procuram mais esses produtos.

“Se você já tem fatores de risco cardiovascular, é provável que tenha sido aconselhado a diminuir sua ingestão de açúcar e assim pode se afastar de bebidas açucaradas para bebidas dietéticas”, explica Pase. “Nós descobrimos que uma maior ingestão de refrigerante dietéticos estava ligada ao diabetes na linha de base, mas não sabemos o que veio primeiro. As bebidas dietéticas aumentam o risco de desenvolver diabetes, ou diabéticos escolhem bebidas dietéticas já que têm que limitar sua ingestão de açúcar?”

Adoçantes artificiais são melhores do que açúcar?

A ligação entre as bebidas dietéticas e a demência se tornou não significativa quando foram ajustados os fatores de risco vascular. O pesquisador sugere que isso pode acontecer porque a associação pode ser mediada por fatores de risco vascular – adoçantes artificiais poderiam estar aumentando fatores de risco vascular. “Ou poderia ser apenas que as pessoas com fatores de risco vascular bebem mais refrigerantes dietéticos, o que é perfeitamente possível já que elas poderiam ter sido aconselhadas a reduzir o [consumo de] açúcar”.

A ligação com o acidente vascular cerebral isquêmico continuava presente em todos os modelos após o ajuste para todos os outros fatores de risco.

Cuidado com a dieta

Bebidas adoçadas com açúcar não foram associadas com risco de acidente vascular cerebral ou demência, mas os autores dizem que isso não deve ser tomado como prova de que as bebidas açucaradas são seguras. “Existem muitos outros estudos que sugerem efeitos nocivos de bebidas açucaradas e não tivemos grandes números de pessoas que consomem bebidas açucaradas em nosso estudo atual para obter informações confiáveis a respeito”, disse Pase. “Nós tivemos um número muito maior de indivíduos que relatam a ingestão de bebidas artificialmente adoçadas”.

Outro estudo do mesmo grupo, publicado on-line no mês passado em “Alzheimer’s and Dementia”, mostra uma ligação entre o consumo de ambas as bebidas – adoçadas com açúcar e artificialmente – e a redução do volume cerebral em um grupo de meia-idade. No estudo transversal, as bebidas açucaradas, que incluíam tanto refrigerante quanto suco de fruta, também estavam associadas a uma memória episódica pior.

“A maior ingestão de bebidas açucaradas, sucos de frutas e refrigerantes foi associada com características da doença de Alzheimer pré-clínica”, concluíram os autores. “Estudos adicionais são necessários para confirmar os nossos achados e avaliar se as bebidas açucaradas estão associadas longitudinalmente com piora da doença de Alzheimer subclínica e com a doença de Alzheimer incidente”.

Alerta científico

“Ambos os estudos são difíceis de interpretar – as conclusões são um pouco diferentes entre si – mas dados epidemiológicos são confusos”, afirmou Keith Fargo, diretor de programas científicos e divulgação na Alzheimer’s Association, dos EUA, em entrevista ao Medscape.

Ainda assim, ele acrescentou: “Esses dois artigos devem certamente servir como sinos de aviso, mas nenhum deles sugere que podemos apenas tomar uma providência simples, ao cortar refrigerantes ou sucos, para reduzir o risco de acidente vascular cerebral ou demência. Nós devemos olhar todo o quadro da dieta e do exercício, dos quais elas [as bebidas açucaradas] são apenas uma parte muito pequena”.

Para Fargo, ambos os artigos apontam que a ingestão elevada de açúcar não faz bem para o cérebro, mas que também há cada vez mais evidências na literatura científica de que as bebidas dietéticas “não são necessariamente a panacéia que alguns poderiam ter acreditado”.

“Não podemos dizer a partir desses dados que alguém que bebe um pouco de [bebidas] dietéticas terá um risco significativamente maior de demência.É tudo apenas especulação”, garante. “A melhor coisa que podemos fazer é conduzir mais estudos para saber mais. É improvável que as recomendações de saúde sejam simples, mas talvez não seja a melhor ideia substituir uma bebida açucarada por uma bebida adoçada artificialmente. É uma ideia melhor ignorar ambas e apenas beber água”.

Análise de dados

No estudo publicado na “Stroke”, os pesquisadores analisaram dados da Offspring Cohort do Framingham Heart Study sobre a ingestão de bebidas açucaradas e artificialmente adoçadas e a incidência de um primeiro acidente vascular cerebral ou diagnóstico de demência. A coorte de AVC incluiu 2888 participantes com idade superior a 45 anos (média de idade: 62 anos) e a coorte de demência incluiu 1484 participantes com idade superior a 60 anos (média de idade: 69 anos).

Todos os participantes haviam preenchido regularmente questionários sobre ingestão de alimentos. Para o presente estudo, os pesquisadores se concentraram na ingestão de bebidas de 1991 a 2001 e a ocorrência de acidente vascular cerebral ou demência nos 10 anos seguintes. Houve 97 casos de acidentes vasculares cerebrais incidentes (82 isquêmicos) e 81 casos de demência incidental (63 compatíveis com a doença de Alzheimer).

Veja a quantidade de açúcar presente em diferentes alimentos

Os resultados mostraram que após ajustes por idade, sexo, educação (para análise da demência), ingestão calórica, qualidade da dieta, atividade física e tabagismo, maiores consumos recente e cumulativo de refrigerantes artificialmente adoçados foram associados a um maior risco de AVC isquêmico, todos os tipos de demência e demência pela doença de Alzheimer.

Quando os pesquisadores compararam a ingestão cumulativa diária de 0 bebida por semana (como referência), as taxas de risco foram de 2,96 a mais para AVC isquêmico e 2,89 para a doença de Alzheimer.

“Descobrimos que as pessoas que bebiam pelo menos uma lata de refrigerante diário tinham um risco 3 vezes maior de AVC e demência do que aqueles que não bebiam tais bebidas”, contou Pase, observando que menores ingestões (entre 1 e 6 bebidas dietéticas por semana) ainda estavam associadas com acidente vascular cerebral, mas não com a demência. Bebidas adoçadas com açúcar não foram associadas com AVC ou demência.

Além do menor número de bebidas açucaradas, havia também a possibilidade de que mais daqueles que bebiam bebidas adoçadas com açúcar pudessem ter morrido de doença cardíaca durante o período do estudo e, portanto, não seriam incluídos nos estágios finais de acidente vascular cerebral e demência.

Adoçantes artificiais

Pase disse que não se sabe como refrigerantes dietéticos poderiam estar causando danos, mas há alguns dados sugerindo que adoçantes artificiais podem predispor para o ganho de peso. “Estudos em animais mostraram que os ratos que recebem adoçantes artificiais ganham mais peso do que os ratos recebendo uma dieta idêntica, mas sem adoçantes artificiais”, conta.

O pesquisador relata que adoçantes artificiais também têm sido associados a uma mudança na composição das bactérias intestinais e ao desenvolvimento da intolerância à glicose, segundo análises feitas em ratos. “Há também alguns dados sobre isso em seres humanos, mas é muito mais difícil mostrar causa e efeito em seres humanos”.

“Existe a possibilidade de que a associação de doçura e calorias se torne desacoplada no cérebro quando consumimos adoçantes artificiais”, sugere. “O cérebro é condicionado a esperar calorias quando sente um sabor doce, porém, se isso não acontece, talvez as pessoas tendam a compensar com outros alimentos doces”.

Marcadores de Alzheimer pré-clínico

No estudo publicado em “Alzheimer’s and Dementia”, os pesquisadores, novamente liderados por Pase, usaram dados do estudo Framingham para analisar as possíveis ligações entre a ingestão de bebidas açucaradas e adoçadas artificialmente e os resultados de marcadores da doença de Alzheimer pré-clínica em análises neuropsicológicas e de imagens por ressonância magnética.

Eles descobriram que o maior consumo de bebidas açucaradas totais foi associado com menor volume total do cérebro e menores escores de memória. Relativa à ausência de ingestão destas bebidas, a diferença no volume cerebral total associada ao consumo de 1 a 2 ou mais de 2 bebidas açucaradas por dia foi equivalente a 1,6 e 2 anos de envelhecimento cerebral, respectivamente, e a diferença nos escores de memória foi equivalente a 5,8 e 11 anos de envelhecimento cerebral, respectivamente.

A maior ingestão de refrigerantes foi associada a menor volume total de cérebro e menor desempenho em um dos testes neuropsicológicos.

Investigação a fundo

Em um editorial que acompanha o estudo publicado na “Stroke” abordando os resultados obtidos com as bebidas dietéticas, Heike Wersching, da Universidade de Munster, Alemanha, e Hannah Gardener, e Ralph L. Sacco, da Faculdade de Medicina Miller da Universidade de Miami, reiteram que é difícil elucidar se as associações observadas entre bebidas artificialmente adoçadas e acidente vascular cerebral e demência são causais ou refletem o viés de causação reversa, e estudos adicionais são necessários.

Adoçantes podem engordar: estudo

Eles sugerem que estudos epidemiológicos futuros poderiam incluir requisitos para dados sobre flutuações de peso prévias, comportamento de dieta, mudanças no consumo de bebidas adoçadas com açúcar e artificialmente adoçadas ao longo do tempo e razões para a escolha de bebidas artificialmente adoçadas.

“O trabalho de Pase e equipe incentiva mais discussões e mais pesquisas sobre essa questão, pois até mesmo pequenos efeitos causais teriam efeitos enormes sobre a saúde pública devido à popularidade do consumo de bebidas artificialmente adoçadas e adoçadas com açúcar”, apontam.

Eles acrescentam que o corpo atual da literatura científica é inconclusivo sobre a natureza causal das associações entre o consumo de bebidas artificialmente adoçadas e o risco de acidente vascular cerebral, demência, diabetes mellitus e síndrome metabólica.

O número crescente de estudos epidemiológicos mostrando forte associação entre o consumo frequente de bebidas artificialmente adoçadas e consequências vasculares, no entanto, sugere que pode não ser sensato substituir ou promover essas bebidas como alternativas mais saudáveis ​​para bebidas adoçadas com açúcar. “Tanto refrigerantes adoçados artificialmente quanto os adoçados com açúcar podem ser prejudiciais para o cérebro”, concluem. [Medscape]

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