Pela primeira vez, podemos ter detectado a colisão de um buraco negro com uma estrela de nêutrons
No último dia 14 de agosto, cientistas dos observatórios Virgo e LIGO (Observatório de Ondas Gravitacionais por Interferômetro Laser), na Itália e nos Estados Unidos, podem ter detectado, pela primeira vez na história, um buraco negro engolindo uma estrela de nêutrons. Caso seja confirmada, a descoberta, anunciada no dia 16, pode ser mais uma vitória para a astronomia de ondas gravitacionais.
O evento – uma onda gravitacional registrada às 22h11 (horário de Brasília), na última quarta-feira – foi batizado de S190814bv. Com base em análises iniciais, há uma chance de 99% de ser realmente uma colisão entre buraco negro e estrela de nêutrons. Esta seria a primeira detecção consistente desta fonte de ondas gravitacionais.
As ondulações no espaço foram registradas a 900 milhões de anos-luz de distância e, no momento, astrônomos estão procurando outras evidências para comprovar que os dados registrados realmente são do evento que eles acreditam ser. A esperança é de que telescópios consigam enxergar algum tipo de resíduo de explosão, o que indicaria a presença do material da estrela de nêutrons.
Ondas gravitacionais podem revelar dimensões extras
Até agora, não foram encontrados sinais óbvios dessa contraparte óptica. A ausência dessa evidência significa que a identificação dos objetos que causaram as ondas gravitacionais deverá ser feita usando apenas suas massas – o que pode ser estimado a partir das ondas. Segundo o porta-voz do LIGO, o cientista Patrick Brady, contou à revista “Science”, um dos objetos pesa mais do que cinco massas solares e o outro – a suposta estrela de nêutrons – pesa menos de três massas solares.
Ondulações no espaço
Ondas gravitacionais são pequenas vibrações (perturbações) no espaço-tempo causadas por massas aceleradas. Elas são emitidas quando objetos extremamente massivos colidem no espaço. Propostas em 1905 por Henri Poincaré e previstas em 1916 por Albert Einstein, elas só foram observadas diretamente pelas primeira vez no século XXI.
Para detectar ondas gravitacionais, físicos desenvolveram instrumentos ópticos gigantescos, com vários quilômetros de extensão, em formato de L – os interferômetros. Em 2015, pesquisadores do LIGO identificaram uma explosão de radiação gravitacional a 1,3 bilhões de anos-luz de distância. A fonte era a colisão entre dois buracos negros com dezenas de massas solares e, em 2016, os cientistas confirmaram a primeira observação de ondas gravitacionais da história.
Buraco negro massivo da nossa galáxia emitiu uma luz fortíssima
Em 2017, o Virgo se junta à busca pelas ondulações e, em questão de dias, seus três detectores encontram outro evento: a fusão de duas estrelas de nêutrons. Estrelas de nêutrons são, essencialmente, imensos núcleos atômicos, de cerca de 10 quilômetros de diâmetro, que sobram da implosão de estrelas um pouco menores do que as que geram buracos negros.
Tanto estrelas de nêutrons quanto buracos negros são restos ultra densos de uma estrela morta. Um buraco negro menor que cinco vezes a massa do Sol, ou uma estrela de nêutrons maior que 2,5 vezes a massa do Sol nunca foram vistos.
Já que são apenas campos gravitacionais, sem matéria ou radiação visíveis, a colisão dos buracos negros não deixa vestígios ópticos. A fusão das estrelas de nêutrons, por outro lado, gerou uma explosão imensa que foi vista por telescópios convencionais através do espectro eletromagnético. São restos como esses que os cientistas estão procurando para auxiliar na comprovar a natureza do S190814bv.
Descobrindo exoplanetas com ondas gravitacionais: estudo
A nova descoberta poderia levar a um maior entendimento sobre as estrelas de nêutrons, que são feitas da matéria mais densa no cosmos. “Este é um grande marco – caso se sustente”, afirmou Brady à “Science”.
Observar o choque entre apenas um buraco negro e uma estrela de nêutrons pode nos ajudar a entender o quão rígida é a matéria destas estrelas. De acordo com a astrofísica Vicky Kalogera, integrante do LIGO, essas informações são essenciais para compreender a estrutura destes corpos celestes. À “Science”, Kalogera ela explicou que teóricos ainda não sabem ao certo o quão comuns são ou como pares de estrelas de nêutrons e buracos negros se formam. Modelagens sugerem que há mais propensão de que eles se formem a partir de estrelas que nascem em pares orbitais e então entram em colapso – ao invés de se encontrarem, de alguma maneira, vagando pelo espaço. [Science, Science News, Science Alert]