Motor espacial interestelar pode utilizar buracos negros para impulsionar espaçonaves

Por , em 19.03.2019

Buracos negros podem ser a chave para a exploração universal e viagens para outros sistemas estelares. Conceitos teóricos para realizar este sonho já foram propostos antes, mas questões de custo, tempo de viagem e combustível permanecem altamente problemáticas. Atualmente, as esperanças dos cientistas concentram-se no uso de energia direcionada e de velas de luz para empurrar minúsculas espaçonaves para velocidades relativísticas – ou seja, velocidades que se igualam a frações consideráveis da velocidade da luz. Porém, um novo estudo propõem que isso também seria possível em espaçonaves grandes.

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Esta nova teoria prevê o disparo de feixes de laser que se curvariam em torno de um buraco negro – ou um par de buracos negros – e retornariam com energia adicional para ajudar a impulsionar uma espaçonave para velocidades perto da velocidade da luz.

“Às vezes, em um jogo, você encontra um ‘exploit’, um truque que permite que você faça algo muito poderoso que, de outra forma, seria proibido pelas regras do jogo. Neste caso, o jogo é o mundo físico, e eu tentei pensar em exploits que permitiriam que uma civilização conseguisse voar relativisticamente para frente e para trás através da galáxia sem a vasta despesa de energia que alguém poderia ingenuamente achar preciso”, explica o autor do estudo, David Kipping, astrofísico da Universidade de Columbia, em Nova York, em entrevista ao site Space.

Um dos principais desafios ao uso de foguetes para voar através do espaço é que o propulsor que carregam consigo tem massa. Viagens longas precisam de muito combustível, o que torna os foguetes pesados, o que, por sua vez, requer mais propulsores, tornando os foguetes ainda mais pesados, e assim por diante. Esse problema fica exponencialmente pior quanto maior for o foguete.

Em vez de transportar toneladas de combustível, no entanto, naves espaciais equipadas com velas espelhadas poderiam contar com o poder dos lasers para impulsioná-las.

Estilingue

As espaçonaves usam regularmente um artifício físico conhecido como “manobras de estilingue”, nas quais a gravidade de um corpo, como um planeta ou uma lua, é utilizada para arremessar as naves através do espaço, aumentando sua velocidade. Em 1963, o famoso físico Freeman Dyson sugeriu que naves espaciais de qualquer tamanho poderiam contar com manobras de estilingue em torno de pares compactos de estrelas anãs brancas ou estrelas de nêutrons para voar a velocidades relativísticas. (Dyson é o físico que criou o conceito que ficou conhecido como esfera de Dyson, uma megaestrutura que encapsularia uma estrela para capturar o máximo de energia possível para desenvolver uma civilização avançada).

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No entanto, um “estilingue Dyson” corre o risco de danificar uma nave espacial através de forças gravitacionais extremas e radiação perigosa desses pares de estrelas mortas. Em vez disso, Kipping sugere que a gravidade poderia ajudar as naves espaciais, aumentando a energia dos feixes de laser disparados nas bordas dos buracos negros.

Os buracos negros possuem campos gravitacionais tão poderosos que nada pode escapar quando chega perto o suficiente deles, nem mesmo a luz. Seus campos gravitacionais também podem distorcer os caminhos dos fótons de luz que não caem dentro deles.

Em 1993, o físico Mark Stuckey sugeriu que um buraco negro poderia, em princípio, agir como um “espelho gravitacional”, na medida em que a gravidade do buraco negro poderia fazer um estilingue com um fóton, de modo que ele voasse de volta à sua fonte. Kipping calculou que, se um buraco negro se movesse em direção à fonte de um fóton, o “fóton bumerangue” iria sugar parte da energia do buraco negro.

Usando o que ele chamou de “energia halo”, em alusão ao halo de luz que seria criado em torno do buraco negro, Kipping descobriu que até naves espaciais com a massa de Júpiter poderiam atingir velocidades relativísticas. “Uma civilização poderia explorar os buracos negros como pontos de referência galácticos”, escreveu ele em seu estudo, aceito pelo “Journal of the British Interplanetary Society”.

Quanto mais rápido um buraco negro se move, mais energia uma unidade de halo poderia extrair dele. Como tal, Kipping concentrou-se principalmente no uso de pares de buracos negros em espiral um em direção ao outro antes de uma fusão.

Buscando civilizações

Um possível próximo passo pode ser a busca por civilizações alienígenas que podem usar alguma tecnologia parecida com esta. Os astrônomos podem procurar sinais de que civilizações estão explorando pares de buracos negros para viajar com esse tipo de motor. Kipping explica que um destes sinais pode estar na velocidade com que estes buracos negros consomem energia. Este tipo de manobra roubaria energia de tais sistemas de buracos negros binários, aumentando as taxas em que esses pares de buracos negros se fundem acima do que se esperaria ver naturalmente.

“Primeiro, se a nossa espécie continuar a expandir sua população e sua tecnologia a uma taxa exponencial, pode chegar um tempo no futuro remoto onde a engenharia em escala astronômica pode ser viável e necessária. Segundo, se estamos procurando sinais de vida tecnologicamente avançada já existente em outras partes do universo, é útil considerar que tipo de fenômeno observável uma tecnologia realmente avançada pode ser capaz de produzir”, já sugeria Freeman Dyson ao propor seu estilingue em volta das anãs brancas.

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Estas propostas foram baseadas em observações de pares de buracos negros orbitando uns aos outros em velocidades relativísticas. Embora haja uma estimativa de 10 milhões de pares de buracos negros na Via Láctea, Kipping observou que poucos deles provavelmente orbitavam em velocidades relativistas por muito tempo, já que eles se fundem rapidamente.

Ainda assim, ele observou que buracos negros isolados e giratórios também poderiam lançar energia halo a velocidades relativísticas, e afirma que os cientistas já sabem de numerosos exemplos de buracos negros supermassivos relativísticos e giratórios.

Pedágio

Só há um único problema nessa ideia toda: para que ela funcione, teríamos que chegar perto de um buraco negro. “É como pagar uma taxa de pedágio para andar no sistema de rodovias. Você tem que pagar um pouco de energia para chegar ao ponto de acesso mais próximo, mas depois disso, você pode andar de graça o quanto quiser”, compara Kipping.

O halo funcionaria apenas a uma distância de cerca de cinco a 50 vezes o diâmetro do buraco negro. “É por isso que você tem que viajar primeiro para o buraco negro mais próximo e como não é possível simplesmente fazer isso dentro de anos-luz de espaço, ainda precisamos primeiro de um meio de viajar para estrelas próximas para montar o sistema rodoviário”, diz o astrofísico ao Space.

“Se quisermos alcançar um voo relativista, é preciso imenso nível de energia, independentemente do sistema de propulsão usado. Uma maneira de contornar isso é usar objetos astronômicos como sua fonte de energia, uma vez que eles possuem literalmente níveis astronômicos de energia dentro deles. Neste caso, o binário do buraco negro é essencialmente uma bateria gigante esperando para ser usada por nós. A ideia é trabalhar com a natureza e não contra ela”, afirma. [Futurism, Phys.org, Space]

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