O físico Gaurav Khanna, da Universidade de Massachusetts em Dartmouth (EUA), teve uma ideia brilhante: usar consoles de PlayStation 3 para criar um supercomputador eficiente e barato.
O primeiro supercomputador que ele criou foi em 2007, composto de 16 consoles PlayStation 3 em rede. O objetivo era criar modelos de colisões de buracos negros.
Agora, ele já possui um supercomputador feito de 200 videogames!
Sua pesquisa é focada em ondas gravitacionais, vibrações que se propagam através do espaço-tempo. As ondas se formam após um evento astrofísico particularmente violento, como dois buracos negros colidindo e se fundindo. Como buracos negros não podem ser observados através de telescópios, o Dr. Khanna usa supercomputadores para criar simulações dessas colisões.
Os supercomputadores se tornaram uma ferramenta muito importante para cientistas e engenheiros, que dependem deles para resolver cálculos demasiado grandes para um processador comum. De acordo com o Dr. Khanna, um supercomputador é 10 vezes mais potente que um único computador.
No entanto, eles são caros. Fazer um supercomputador requer um grande número de processadores e uma maneira de conectá-los. Assim, Dr. Khanna decidiu ser criativo e criar um usando o PlayStation 3, por conta de sua viabilidade e custo – atualmente, cerca de US$ 250 a US$ 300 nas lojas (R$ 675 a 810).
Ao contrário de outros consoles de videogame, o PlayStation 3 permite aos usuários instalar um sistema operacional preferido, tornando-o atraente para programadores e desenvolvedores. O modelo mais recente, PlayStation 4, não tem este recurso.
O projeto inicial
O primeiro projeto de Khanna envolveu apenas 16 videogames, porque a compra de grandes quantidades de consoles não pareceu um uso responsável de financiamento científico, para a Fundação Nacional da Ciência nos EUA. Sendo assim, Khanna pediu a ajuda da Sony, a empresa por trás do PlayStation 3, que por sua vez doou quatro consoles para o experimento. A Universidade pagou por mais oito, e o Dr. Khanna comprou sozinho mais quatro.
Em seguida, o físico instalou o sistema operacional Linux em todos os 16 consoles, conectou-os na internet e executou seu supercomputador.
“O Dr. Khanna foi capaz de combinar suas duas áreas de especialização, ou seja, a relatividade geral e a ciência da computação, para inventar algo novo que permitiu não apenas uma nova máquina, mas também o progresso científico que de outra forma levaria muitos mais anos para alcançar”, disse Lior Burko, professor de física na Georgia Gwinnett College (EUA) e colaborador do Dr. Khanna, que elogiou sua ideia de obter a função de um supercomputador sem a alta despesa.
Em 2009, Dr. Khanna publicou um artigo na revista Parallel and Distributed Computing and Systems demonstrando como o processador do supercomputador de PlayStation 3 foi capaz de acelerar os cálculos científicos de um processador tradicional por um fator de cerca de 10.
No mesmo ano, os primeiros resultados de simulações feitas usando o supercomputador, detalhando o comportamento de ondas gravitacionais decorrentes de buracos negros rotativos, foram publicados na revista Classical and Quantum Gravity.
Os 200 PlayStation
A engenhosidade do Dr. Khanna chamou a atenção do Laboratório de Pesquisa da Força Aérea americana, cujos cientistas estavam investigando processadores PlayStation 3.
Em 2010, o laboratório construiu seu próprio supercomputador usando 1.716 consoles para realizar processamento de imagem para a vigilância urbana. “Nosso supercomputador PS3 é capaz de processar os cálculos complexos necessários para criar uma imagem detalhada de uma cidade inteira a partir de dados de radar”, disse Mark Barnell, diretor de computação no Laboratório.
Eles entraram em um acordo de pesquisa e desenvolvimento com a equipe do Dr. Khanna, doando 176 PlayStation 3.
A equipe do físico conectou os consoles, os alojou em um contêiner refrigerado projetado para transportar leite, e o supercomputador resultante ficou com um poder computacional de cerca de 3.000 processadores de laptops, custando apenas US$ 75.000 (R$ 202 mil) – cerca de um décimo do custo de um supercomputador comparável feito com peças tradicionais.
Desde então, o Dr. Khanna publicou mais dois artigos sobre colisões de buracos negros com os resultados de simulações do supercomputador.
Ainda este ano, mais 220 consoles do Laboratório da Força Aérea devem chegar. Por enquanto, o plano é usá-los para realizar simulações mais precisas de sistemas de buracos negros, mas outros departamentos da Universidade também devem aproveitar a máquina para seus próprios projetos. Uma equipe de engenharia, por exemplo, assinou um contrato para realizar simulações que ajudarão em projetos de moinhos de vento e conversores de energia das ondas do oceano mais eficazes.
Limitações
O supercomputador PlayStation 3 não é adequado para todas as aplicações científicas. Sua maior limitação é a memória: os consoles têm muito pouco em comparação com supercomputadores tradicionais, o que significa que não podem lidar com cálculos de grande escala. Uma alternativa é mudar para um processador melhor ainda, como placas gráficas de PC.
“O próximo supercomputador que vamos construir provavelmente será feito inteiramente destas placas”, disse Khanna. “Também não vai funcionar para tudo, mas certamente vai cobrir um grande conjunto de aplicações científicas e de engenharia”. [NYTimes]