Para salvar o planeta: controle de natalidade
Muitos conservacionistas tendem a gastar seu tempo se preocupando com a proteção das florestas, a prisão de caçadores ilegais ou com a diminuição da emissão de carbono. Mas todas estas coisas (e mais) são causadas por seres humanos. Dado que é mais fácil e mais barato reduzir a taxa de natalidade humana do que abordar estas outras questões, por que os conservacionistas não estão mais preocupados em manter a nossa população sob controle?
Esse questão é levantada por Laura Kehoe, doutora e pesquisadora de conservação da vida selvagem e uso da terra da Universidade Humboldt, de Berlim, e Niki Rust, doutoranda em conservação carnívora na Universidade de Kent, no Reino Unido. Afinal, estima-se que mais de três quartos da terra (sem gelo) do mundo tenha sido modificada por pessoas. “Nós já estamos ultrapassando os limites do planeta e nossas ações estão causando a mudança climática e a sexta extinção em massa”, apontam em um artigo para site “The Conversation”.
Em 2050, o crescimento da população humana por si só ameaçará mais de 14% das espécies do planeta. Isso se somará ao declínio de 52% no número de mamíferos, aves, répteis, anfíbios e peixes ao longo das últimas quatro décadas.
Apenas 13 anos atrás, éramos 6 bilhões; apenas sete anos depois, batemos 7 bilhões e em 2100 poderíamos ter até 12,3 bilhões de pessoas. “A cada criança que uma mulher tem, o seu legado de emissões de carbono é aumentado em seis vezes”, afirmam. “Não se pode negar que o nosso tamanho, densidade e taxa de crescimento aumentam as extinções de animais selvagens”.
Nem tudo está perdido
Mesmo com esses números estarrecedores, as cientistas garantem que podemos encontrar uma solução para esse problema. Taxas de fertilidade recuam quanto mais tempo uma menina passa na escola, por isso, simplesmente ao fornecer melhor educação às garotas poderíamos reduzir em 1 bilhão a projeção da população mundial para 2050.
Isso porque mulheres empoderadas por meio da educação têm menos filhos e fazem isso quando estão mais velhas, tendo, portanto, mais recursos para cuidar deles. Junto com isso, uma em cada cinco mulheres em todo o mundo – 800 milhões – não usam contraceptivos modernos – em países em desenvolvimento, esta taxa pode chegar a 60%.
“Nós não estamos sugerindo quaisquer regimes malignos de controle populacional – [estamos falando] sobre fornecer recursos para as meninas que querem uma educação e mulheres que querem ter acesso ao planejamento familiar”, dizem. Os benefícios podem ser vistos de forma relativamente rápida: entre 1960 e 2000, o uso de anticoncepcionais por mulheres casadas nos países em desenvolvimento aumentou de 10% para 60%, reduzindo o número médio de filhos por mulher de seis para três.
No entanto, de acordo com Laura e Niki, nós prestamos “surpreendentemente pouca atenção” ao que tudo isso significa para a vida selvagem do mundo.
O papel das ONGs conservacionistas
Um pequeno mas crescente número de organizações estão começando a integrar a conservação da vida selvagem com o planejamento familiar. Blue Ventures, uma organização de conservação marinha em Madagascar, tem treinado mulheres locais para fornecer contracepção em aldeias rurais próximas de áreas protegidas. Em três anos, o projeto reduziu a sua própria pegada ecológica por 267 hectares globais puramente através do acesso ao planejamento familiar.
Uma abordagem um pouco diferente foi tomada pelo Centro para a Diversidade Biológica, nos EUA. No Dia Mundial da População no ano passado, a organização distribuiu 40 mil preservativos embrulhados em embalagens que descrevem espécies ameaçadas e slogans de conscientização. “Não está claro se isso teve qualquer efeito sobre o comportamento humano, mas a ênfase em trazer a questão para um país desenvolvido com uma taxa de consumo elevada é louvável, dado o foco típico no crescimento populacional apenas em países em desenvolvimento”, explicam as pesquisadoras.
Uma abordagem mais holística combina planejamento familiar e outros serviços de saúde com opções de subsistência alternativas, o que foi implementado em algumas áreas-chave de alta biodiversidade que têm uma necessidade não atendida de contracepção e atendimento à saúde. Um programa no Nepal levou a um aumento do uso de preservativos e redução equivalente no uso de combustível de madeira, salvando cerca de 9 mil árvores por ano.
Desafios a superar
Porém, a contracepção não custa tão pouco e a demanda aumenta cada vez mais. Segundo as cientistas, responder à necessidade não atendida de planejamento familiar em todos os países em desenvolvimento custaria US$ 8,1 bilhões anualmente e, obviamente, este montante não irá simplesmente cair do céu. Além disso, o uso de contraceptivos e o acesso das mulheres à educação são afetados por fortes problemas culturais e religiosos. “Não podemos simplesmente advogar por mais acesso ao planejamento familiar e educação sem abordar as barreiras ao acesso”, escrevem.
“O crescimento populacional não parece ser uma grande preocupação para os conservacionistas, mas deve ser. Os pesquisadores devem investigar os efeitos das intervenções da população humana sobre a vida selvagem, enquanto os conservacionistas poderiam formar alianças com outros setores da sociedade, como grupos de escolha reprodutiva e de direitos das mulheres”, ponderam. Como as organizações ambientais muitas vezes já integram aspectos educacionais em seus programas, não seria difícil disponibilizar outros materiais educacionais em relação às mulheres e meninas.
“Agora temos provas para mostrar as ligações entre o tamanho, o crescimento e a densidade da população humana sobre o meio ambiente, mas precisamos aumentar nossos esforços de pesquisa sobre como a contracepção e as políticas de educação feminina afetam a biodiversidade”, afirmam. Segundo Laura e Niki, cientistas conservacionistas não podem desconsiderar os efeitos do consumo excessivo sobre o mundo natural, mas também não podem ignorar o efeito que a nossa população crescente tem sobre o planeta.
Abordar o crescimento da população humana pode ser um remédio relativamente rápido e barato para a perda de vida selvagem, que pode ajudar a reduzir o consumo e nos deixar mais perto de alcançar a verdadeira sustentabilidade. “Quanto mais cedo começarmos a puxar os freios, mais fácil será para, eventualmente, pararmos”, concluem as estudiosas. [The Conversation, Science 20]
4 comentários
Até que enfim. Eu já venho dizendo isso desde o final do século passado.
A riqueza é o controle de natalidade mais eficaz que tem. É só ver, quanto mais rico o país, menor a taxa de natalidade.
Em minha humilde opinião, acredito que “a [educação] é o controle de natalidade mais eficaz […]” e não a riqueza…
…apesar de estarem associados.