O debate sobre a autenticidade de um documento maia antigo, chamado de Códice Grolier, durou 50 anos. Agora, uma nova análise concluiu que o manuscrito é de fato genuíno, tornando-o mais antigo sobrevivente da era pré-colombiana.
A polêmica
O Códice Grolier são pedaços de um livro de 20 páginas feito de papel de casca revestido de estuque, dobrado em forma de acordeão. As páginas são pintadas com iconografia típica maia, incluindo deuses, guerreiros, escravos e hieróglifos, além de um calendário que traça o movimento do planeta Vênus.
O manuscrito danificado foi descoberto na década de 1960. De acordo com o relato de um colecionador mexicano chamado Josué Saenz, saqueadores invadiram uma caverna no México, se depararam com o documento, juntamente com uma máscara turquesa, uma faca sacrificial e alguns pedaços de papel de casca de figueira em branco, e decidiram contatar Saenz para vender as relíquias. Eles o levaram de avião até uma pista de pouso remota para recolher os itens, embora pelo menos uma arqueóloga, Donna Yates, tenha chamado esta história de “fantástica”.
A narração questionável de Saenz e ações subsequentes lançaram dúvidas sobre a autenticidade dos fragmentos, mesmo que os outros artefatos tenham sido provados como genuínos.
Cientistas testaram o códice em 2007, mas não conseguiram concluir decisivamente sua autenticidade, em parte porque muitos dos materiais utilizados eram pré-colombianos, mas o desgaste nas páginas parecia artificial. Surgiu a hipótese de que um falsificador talentoso tivesse usado os materiais certos do período certo para despistar arqueólogos. A datação por radiocarbono revelou que as páginas de papel em branco encontradas junto com o códice eram de cerca de 1230 dC.
O estudo
Um dos autores do novo estudo, Stephen Houston, da Universidade Brown, nos EUA, disse em um comunicado que as pessoas meio que aceitaram que o manuscrito era falso. “Decidimos olhar para ele com muito cuidado, para verificar as críticas uma de cada vez. Agora vamos emitir um fac-símile definitivo do códice. Não pode haver a menor dúvida de que o Grolier é genuíno”, afirmou.
Junto com Michael Coe, da Universidade de Harvard (EUA), e Mary Miller e Karl Taube, da Universidade da Califórnia em Riverside (EUA), Houston revisou toda a pesquisa conhecida sobre o documento.
Isso incluiu a avaliação das origens do manuscrito, dos resultados da datação por radiocarbono, as várias divindades representadas, de como o papel de casca foi feito, dos pigmentos azuis e vermelhos debaixo das pinturas, entre outros aspectos.
A equipe concluiu que um falsificador na década de 1960 simplesmente não poderia saber todos os detalhes necessários para criar tal documento. Muitas das divindades mostradas no códice ainda não tinham sido descobertas, e os cientistas não recriaram com sucesso pigmento azul maia em laboratório até os anos 1980.
Raro
Há três outros antigos manuscritos maias autenticados, conhecidos como Códices de Dresden, Madrid e Paris.
Há variações entre eles, mas todos incluem calendários astronômicos acompanhando os movimentos de corpos celestes. A datação por radiocarbono mostra que o Grolier antecede os três.
“Uma ponderação fundamentada das evidências deixa apenas uma eventual conclusão. Quatro códices maias intactos sobrevivem do período pré-colombiano, e um deles é o Grolier”, escreveram os pesquisadores no artigo publicado na revista Maya Archaeology. [Gizmodo]