Estranhas entidades “obelisco” são encontradas em humanos

Por , em 31.01.2024

Pesquisadores fizeram uma descoberta notável no campo da microbiologia, identificando uma classe inédita de organismos semelhantes a vírus no sistema digestivo e oral humano. Estes elementos, apelidados de “viroides”, podem ter um papel crucial na alteração da atividade genética dentro do microbioma humano, conforme relatado pela revista Science.

O estudo revelou que um dos hospedeiros desses viroides é a bactéria Streptococcus sanguinis, habitualmente encontrada na boca humana. Embora outros hospedeiros ainda não tenham sido confirmados, os cientistas acreditam que uma parcela significativa deles pode ser de origem bacteriana.

Os viroides são estruturas de RNA em forma de anel, semelhantes ao DNA, e são conhecidos principalmente por infectar plantas, como as batatas. Eles diferem dos vírus de RNA maiores em vários aspectos. Por exemplo, os viroides não possuem uma cápsula protetora que envolve seu material genético, ao contrário dos vírus. Além disso, o RNA dos viroides não contém códigos para a construção de proteínas. Em contrapartida, os vírus possuem instruções genéticas para suas cápsulas protetoras e para enzimas essenciais à sua replicação. Os viroides, por sua vez, dependem dos seus organismos hospedeiros para obter essas enzimas.

Anteriormente, acreditava-se que os viroides infectavam apenas plantas. No entanto, pesquisas recentes sugerem que eles também podem afetar outros hospedeiros, como animais, fungos ou bactérias. A pesquisa atual envolveu a busca de entidades semelhantes a viroides no material genético de micróbios que habitam o corpo humano.

Os resultados do estudo, divulgados na plataforma de pré-publicação bioRxiv em 21 de janeiro, introduzem os “Obeliscos”, uma nova categoria de viroides encontrada no intestino e na boca humanos. Os pesquisadores identificaram aproximadamente 29.960 instâncias desses viroides. (Este estudo ainda não passou por revisão por pares ou publicação em um periódico acadêmico.)

O nome “Obeliscos” foi escolhido devido à estrutura tridimensional dos viroides, que se assemelha a uma coluna delgada, formada pelo processo de auto-dobramento.

Para o estudo, foram utilizados dados já publicados para analisar padrões de atividade genética em diversas comunidades microbianas do corpo, conhecidos como “metatranscriptomas”.

Os Obeliscos foram encontrados em cerca de 7% dos metatranscriptomas provenientes de amostras fecais humanas, fornecendo uma visão da atividade genética no microbioma intestinal. Adicionalmente, esses viroides foram identificados em aproximadamente 53% (17 de 32) dos metatranscriptomas orais analisados.

Análises subsequentes permitiram associar um dos Obeliscos ao seu hospedeiro, S. sanguinis. Os pesquisadores sugerem que outros Obeliscos também podem estar associados a hospedeiros bacterianos, conforme mencionado em seu pré-print.

Curiosamente, alguns Obeliscos parecem conter informações genéticas para enzimas necessárias à replicação, indicando uma complexidade superior aos viroides conhecidos anteriormente, conforme reportado pela Science. Contudo, assim como a maioria dos viroides, eles ainda não possuem um código genético para uma camada protetora externa.

A influência desses viroides na saúde humana ainda é uma incógnita, mas eles podem afetar o microbioma humano, especialmente se alguns deles infectarem bactérias. Esta descoberta pode também contribuir para o debate em curso sobre a relação evolutiva entre vírus e viroides, questionando se os vírus evoluíram dos viroides ou o contrário.

Essa pesquisa abre novas perspectivas sobre como entendemos as interações entre microorganismos e o corpo humano. O estudo dos viroides no microbioma humano pode revelar mecanismos inexplorados de regulação genética e interações hospedeiro-patógeno, oferecendo insights valiosos para futuras investigações na medicina e biologia. A descoberta dos Obeliscos, em particular, destaca a complexidade e diversidade do mundo microbiano dentro de nós, um universo ainda largamente desconhecido, mas fundamental para nossa saúde e bem-estar.

Com isso, a ciência dá um passo importante na compreensão da dinâmica do microbioma humano, potencialmente abrindo caminho para novas abordagens no tratamento e prevenção de doenças. Este estudo exemplifica como a pesquisa contínua e a curiosidade científica podem levar a descobertas surpreendentes, mesmo em áreas que pensávamos conhecer bem. [Live Science]

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