Um dia, no outono de 1981, oito homens na casa dos 70 anos entraram em um mosteiro em New Hampshire, nos EUA. Aquela seria sua casa pelos próximos cinco dias.
E que casa: ao passar pela porta, eles entraram em um túnel do tempo. Perry Como cantava em um rádio vintage. Ed Sullivan recebia hóspedes em uma TV preto-e-branco. Tudo dentro do mosteiro, incluindo os livros nas prateleiras e as revistas, foi projetado para evocar os EUA de 1959.
Os homens estavam participando de uma experiência radical inventada por uma psicóloga chamada Ellen Langer, da Universidade Harvard (EUA).
O experimento
Antes de chegar na casa, os homens foram avaliados em medidas como destreza, força de preensão, flexibilidade, audição, visão, memória e cognição, entre outros biomarcadores testáveis de idade.
A teoria de Langer era que as pessoas precisavam de uma “melhora psicológica” para se curar fisicamente; algo da mente que acionasse o corpo para tomar medidas curativas por si só.
Os homens do grupo experimental foram orientados a não apenas falar sobre a época anterior de sua vida, e sim a habitá-la, ou seja, fazer uma tentativa psicológica de ser a pessoa que eram há 22 anos.
“Nós temos boas razões para acreditar que, se você for bem sucedido nisso, você vai se sentir como se sentia em 1959”, ela disse aos participantes.
A partir do momento em que eles atravessaram as portas, foram tratados como se fossem mais jovens. Inclusive, tiveram que levar seus pertences sozinhos ao andar de cima, mesmo que tivessem que levar uma camisa por vez.
No ambiente, não havia nenhum espelho, nenhuma roupa moderna ou fotos recentes, apenas retratos dos próprios homens mais jovens.
No final de sua estadia, os participantes foram testados novamente. Em várias medidas, eles superaram um grupo de controle que veio mais cedo para o mosteiro, e não se imaginou de volta na pele de seus eus mais jovens, apesar de serem encorajados a relembrar a época.
Os homens que realmente “viveram no passado” mostraram maior destreza manual e andavam mais eretos. Talvez o mais improvável, sua visão melhorou. Juízes independentes também disseram que eles pareciam mais jovens.
O estudo fez sucesso, mas como a amostra era pequena e o estudo durou apenas cinco dias, Langer não tentou publicá-lo, dizendo que os resultados iriam parecer extraordinários demais. Mas certamente os divulgou. “As pessoas não estavam falando de medicina mente-corpo [naquela época]”, disse ela.
O seriado
Anos depois, em 2010, a BBC transmitiu um programa de TV chamado “The Young Ones”, uma espécie de recriação desse estudo. Langer foi uma consultora, e seis ex-celebridades envelhecidas foram as cobaias.
Os participantes foram levados em carros da época para uma casa de campo meticulosamente adaptada a 1975. Depois de uma semana, eles estavam aparentemente rejuvenescidos e mostrando uma melhora acentuada em várias medidas de teste. Um dos homens, que tinha chegado em uma cadeira de rodas, saiu usando apenas uma bengala. Outra mulher, que não podia nem colocar meias sozinha no início, foi a anfitriã do jantar da última noite, deslizando ao redor energizada.
Todos os participantes andavam mais eretos e de fato pareciam mais jovens. Langer crê que tal melhora teve muito a ver com seus egos reacendidos, ponto fundamental para a recuperação de seus corpos.
A teoria e as evidências
Segundo Langer, se as pessoas pudessem aprender a estar atentas e sempre perceber as opções disponíveis para elas, iriam entender o seu potencial e melhorar a sua saúde.
A técnica para atingir esse estado de consciência plena que Langer sugere tem sua ênfase em perceber mudanças de momento a momento em torno de você, desde as diferenças na face de sua esposa no café da manhã a variabilidade de seus sintomas de asma. “Quando estamos ativamente fazendo novas distinções, em vez de depender de habituais categorizações, estamos vivos; e quando estamos vivos, podemos melhorar”, explicou a psicóloga.
Langer chegou a acreditar que uma forma de melhorar o bem-estar era usar todos os tipos de placebos.
Para ela, placebos não são apenas pílulas de açúcar disfarçadas de medicina: são qualquer intervenção benigna que o destinatário acredita ser potente, e que produz mudanças fisiológicas mensuráveis.
O efeito placebo é um fenômeno impressionante e ainda não tão bem compreendido. A medicina tradicional apenas reconhece por cima o papel do efeito placebo e o contabiliza em seus experimentos. Mas Langer vai muito além. Ela acha que esses efeitos são enormes, tão grandes que, em muitos casos, podem realmente ser o principal fator a produzir os resultados.
Enquanto o primeiro experimento de 1981 não foi publicado, ela e seus colaboradores já fizeram inúmeros outros estudos nos quais a mente teve um poder excepcional na melhora de um indivíduo.
Um dos mais interessantes foi publicado na revista Psychological Science. Dois grupos de indivíduos entraram em um simulador de voo. Um grupo foi orientado a pensar em si mesmo como pilotos da Força Aérea e usaram trajes especiais para guiar um voo simulado. O outro grupo foi dito que o simulador estava quebrado e que eles deviam fingir pilotar um avião.
Depois, Langer deu a cada grupo um teste de visão. O grupo que pilotou o voo se saiu 40% melhor do que o outro grupo. Claramente, “a manipulação de mentalidade pode neutralizar limites fisiológicos presumidos”, concluiu Langer. “Se um determinado tipo de solicitação pode mudar a visão, não há nenhuma razão para pensar que isso não se aplica a qualquer coisa”.
O próximo passo de pesquisa de Langer será explorar as dimensões da psicologia na saúde de mulheres com câncer.
O estudo audacioso irá testar se voltar ao tempo e fazer mulheres com câncer de mama de estágio 4 (o tratamento de tais casos é geralmente estruturado em cuidados de conforto, uma vez que o mundo da medicina já não pode fazer mais nada por essas pacientes) se sentirem mais jovens e saudáveis pode melhorar de alguma forma sua condição física, por exemplo, diminuir seu tumor ou parar a metástase.
Caso um resultado positivo seja encontrado, vai ser difícil ignorar o poder soberano da mente sobre o corpo. [NYTimes]