Os perigosos laços da medicina com a indústria farmacêutica
Nos últimos meses, um tema polêmico tem aparecido mais frequentemente na mídia: o potencial prejuízo que o “inevitável” laço entre medicina e indústria farmacêutica pode causar nos pacientes.
Muitos artigos e estudos têm argumentado que a indústria farmacêutica se utiliza de táticas e estratégias imorais e nada éticas para vender remédios que absolutamente não ajudam os doentes.
O estudo analisou 2.047 artigos sobre pesquisas biomédicas desacreditadas e retraídas de publicações científicas, e constatou que a maior razão para a sua retração não foram erros honestos (não propositais), mas sim pura fraude.
Enquanto isso, um médico inglês, Benjamin Goldcare, denunciou um comportamento condenável da indústria farmacêutica: em busca de proteger os próprios interesses econômicos, os laboratórios farmacêuticos nem sempre liberam os remédios ao mercado com a garantia de que farão bem aos pacientes.
Para vender esses remédios ineficazes, as empresas forjam ou só publicam estudos acadêmicos e resultados de testes favoráveis sobre eles, escondendo totalmente o fato de que alguns apresentam efeitos colaterais perigosos.
Se você acha que já ouviu o suficiente, prepare-se para conhecer a pior parte de tudo isso: tal comportamento não é ilegal.
No Brasil, a entidade que libera remédios para uso comercial é a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), um órgão ligado ao Ministério da Saúde. Existem 23 laboratórios oficiais ligados à Anvisa que fornecem medicamentos para o Sistema Único de Saúde (SUS).
As centenas de laboratórios privados, no entanto, estão sob observação menor (para não dizer sem observação): o único controle rigoroso acontece no momento de permitir que a empresa abra.
Uma vez operantes, os produtores detém o controle sobre os testes, ou seja, os próprios laboratórios atestam a qualidade do medicamento que eles mesmos fabricam. O sistema de teste e aprovação dos remédios coloca controle excessivo nas mãos dos fabricantes, de forma que eles quase sempre podem definir qual o veredicto sobre qualquer medicamento em fase de experimentos.
“Suicídio profissional”
O psiquiatra britânico David Healy, odiado por colegas que até tentaram revogar sua licença médica, argumenta que seus semelhantes estão cometendo “suicídio profissional” ao não abordar sua relação perigosamente íntima com a indústria farmacêutica.
Os conflitos entre medicina e indústria são conhecidos há muito tempo. Um deles são os “presentes” que médicos ganham de fabricantes de remédio, que alguns consideram ser uma tentativa clara de “comprar” o profissional para que ele passe a receitar a medicação.
Nos EUA, por exemplo, só em 2004 as empresas farmacêuticas gastaram cerca de US$ 58 bilhões (cerca de R$ 116 bi) em marketing, 87% dos quais foram destinados diretamente a cerca de 800 mil norte-americanos com o poder de prescrever medicamentos.
Nos EUA, a legislação diz que as empresas farmacêuticas devem revelar quais médicos aceitaram qualquer pagamento ou presente com valor maior de US$ 10, e descrever as quantidades exatas aceitas e seu propósito em um site público. Porém, esse site só vai estar em funcionamento em 2014, talvez.
Healy nem acha que aceitar dinheiro dos fabricantes seja o pior problema (embora já tenha ficado demonstrado que pode ser prejudicial). Para ele, o fato das empresas repetidamente esconderem informações importantes sobre os riscos de seus medicamentos é que é o verdadeiro problema.
Nesse ponto, Healy acha que as publicações científicas têm um pouco de culpa também. Ele disse, por exemplo, que já teve dificuldade em publicar dados anteriormente ocultos: a publicação foi rejeitada.
Embora as revistas médicas obriguem empresas farmacêuticas a registrarem todos os seus ensaios clínicos com o Instituto Nacional de Saúde dos EUA se quiserem publicá-los, essa não é uma exigência legal. Eles ainda podem esconder dados relevantes da Administração de Drogas e Alimentos americana ao não divulgar testes clínicos que eles nunca tentaram submeter a publicação.
“A questão-chave a curto prazo é o acesso aos dados. Temos que insistir nisso”, afirma Healy. “Médicos recebem a indústria e ouvem sobre seus remédios. Eu não acho que seja um problema enorme que sejam pagos para isso. O grande problema é que se você perguntar pelos dados, eles não podem mostrar a você. Isso é não é ciência, isso é marketing”.
No Brasil, o Código de Ética Médica e a Resolução nº 1.595/00 do Conselho Federal de Medicina proíbem aos médicos a comercialização da medicina e a submissão a outros interesses que não o benefício do paciente. Também é proibida a vinculação da prescrição médica ao recebimento de vantagens materiais. A RDC 102/00 da Anvisa ainda proíbe a indústria farmacêutica de oferecer prêmios ou vantagens aos profissionais de saúde envolvidos com a prescrição ou dispensação de medicamentos.
A questão é: em até que ponto essas resoluções são fiscalizadas?
Recentemente, em fevereiro desse ano, um acordo inédito foi firmado entre o Conselho Federal de Medicina (CFM) e a Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma), estabelecendo parâmetros para a relação entre médicos e indústrias.
Entre outras resoluções, ficou decidido que a presença de médicos em eventos a convite da indústria deve ter como objetivo a disseminação do conhecimento técnico-científico, e não pode ser condicionada a qualquer forma de compensação. Também, somente despesas relacionadas ao evento podem ser cobridas pela indústria.
Quanto a brindes e presentes, eles devem estar de acordo com os padrões definidos pela legislação sanitária em vigor, devem estar relacionados à prática médica, e devem expressar valor simbólico (que não ultrapasse um terço do salário mínimo nacional vigente).
Além disso, foram estabelecidas regras para visitação comercial a médicos, que dizem que o objetivo das visitas deve ser contribuir para que pacientes tenham acesso a terapias eficientes e seguras, e que os empresários devem informar os médicos sobre as vantagens e riscos dos remédios.
Esse acordo inédito parece mostrar bastante boa vontade de ambas as partes de agir no melhor interesse do paciente. Mas, como diria o ditado, “de boas intenções o inferno está cheio”. A dúvida que permanece é: o quão a sério profissionais de saúde e empresários estão levando esses parâmetros?
Nós, os pacientes, estamos seguros, ou somos duplamente vítimas: das doenças e dos remédios?[CNN, CFM, CREMESP]
23 comentários
Sr. Costa, gostei dos seus comentários, penso exatamente da mesma forma.
Tomei mais de dez tipos de antidepressivos para depressão e ansiedade generalizada e nenhum funcionou. Gastei muito dinheiro para nada.
Sendo assim fica sendo as práticas “espúrias” bem mais confiáveis.
Essa estória pode até ter sido inventada, mas retrata muito bem a triste realidade.
Não que isso seja novidade para alguém, mas isso me lembrou um pouco do primeiro capítulo de Perception, já foi a época em que ser trabalhar namedicina ou na advocacia era sinal de ser pessoa inteligente e de bom caratér.
Eu sou portador de esquizofrenia paranoide, e hoje, lembrando da minha primeira consulta com um psiquiatra, fico assustado com a rapidez que o mesmo fez o diagnóstico do meu caso. Em menos de dez minutos, saí do consultório com a receita nas mãos, sendo que naquele momento eu já tinha me recuperado do surto, só estava na dúvida sobre o que tinha acontecido comigo, acho que precisava mais de esclarecimentos do que de medicamentos
Ótima matéria, maravilha!
Eu só confio em médicos quando eles tratam de traumas. Fora isso, prefiro as práticas “espúrias” que o César comentou.
Até parece que isso é uma grande novidade. Aliada aos perigosos laços da política com as grandes empresas, essas sujeiras tem no mínimo 500 anos. Leis, fiscalizações, multas e até prisões não vão resolver o problema. O sistema capitalista é podre na sua base e todos os seus caminhos levam à corrupção política e social. A formação de caráter e a honestidade são temas de piadas ou descaradamente fazem parte das figuras de retórica dos discursos de campanhas eleitorais. A ética profissional é sempre subjugada pelos interesses comerciais. Finalmente, tais constatações são tão aviltantes que comentá-las é um penoso exercício de asco.
POR QUE colocar a culpa no Capitalismo?
Pessoas corruptas existem em qualquer sistema econômico ou classe social.
Leônidas Villeneuve,
Você tem razão. Pessoas corruptas existem em qualquer sistema. Entretanto, o capitalismo prima, se esmera e se alimenta da corrupção. O tema é vasto, mas se analisarmos apenas o processo eleitoral, vamos perceber claramente que todos os candidatos vendem a própria alma para se elegerem. Você já percebeu quanto custa uma campanha eleitoral? Quando o candidato se elege, já está comprometido com todos os tipos de falcatruas. E isso é apenas o início. Não podemos abranger neste espaço, todos os caminhos da corrupção que o capitalismo proporciona.
Já leu sobre a corrupção nos países Comunistas?
A censura e a opressão nesses países é tão forte que a população não pode nem mesmo sair deles ou ter a certeza de que a notícia que leram no jornal é verdadeira…
Diante disso, a corrupção é facilmente aplicada pela elite, enquanto a população é obrigada a viver em condições praticamente iguais de pobreza.
Só para complementar, a queda da União Soviética deve-se em grande parte à corrupção existente nos altos cargos do governo…
Portanto, não confere colocar a culpa no capitalismo e nem mesmo no socialismo; repito: a corrupção existe em qualquer sistema econômico e não é “influenciada” pelo capitalismo.
Caro Leônidas,
Nunca existiram países comunistas. O que chamam de países comunistas, sempre foram ditaduras com uma forte influência do capitalismo de estado. É claro que isso é pior do que o nosso capitalismo fantasiado de democracia. Portanto não temos parâmetros para comparar comunismo ou socialismo com capitalismo. E desde quando nós podemos ter certeza que as notícias que lemos nos nossos jornais são verdadeiras?
“O que chamam de países comunistas, sempre foram ditaduras com uma forte influência do capitalismo de estado”
Eu ainda não acredito que li isso. Amigo, por favor, a URSS era o que? Cuba é o que? Estude um pouco mais de geografia.
Caro Leônidas,
URSS e Cuba são exemplos clássicos de ditaduras mescladas com capitalismo de estado. Para saber disso não é necessário estudar geografia. Acontece que esses dois países sempre foram duas grandes pedras nos sapatos dos EE.UU., que querem impor o capitalismo fantasiado de democracia em todos os países para que possam intervir explorar e controlar suas economias. Quando não conseguem, dizem que o país é ‘comunista’, desfecham maciças propagandas e boicotam suas economias para desestabilizá-los. Infelizmente ainda há brasileiros que preferem acreditar nas mentirosas propagandas norte americanas, apesar de sermos uma colônia explorada e subserviente ao Tio Sam.
Amigo, permita-me corrigi-lo, mas a URSS se afirmava socialista sim, não foi nenhum “rótulo” proposto pelos EUA.
E aliás, não sei se já leu, mas Stalin adotou medidas socialistas como a coletivização da agricultura e estatização das empresas. Esse tipo de medida é socialista, derivada do pensamento Marxista de que os meios de produção deveriam ser coletivos. O mesmo ocorre em Cuba e na Coreia do Norte.
Apenas como exemplo, pode-se observar este trecho na Wikipedia: “A Coreia do Norte é oficialmente uma república socialista” [disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Coreia_do_Norte ].
Portanto, não foram os EUA ou outro país que disseram que estes Estados são socialistas, mas sim, uma afirmação do próprio governo destas Nações.
Leônidas Villeneuve,
Sim meu caro. Mas veja bem, se eu disser para você que eu sou um santo, você acreditaria? Acho que não né?
Ora, nenhum regime ditatorial se declara como tal. Eles precisam de um rótulo mais ameno para continuar no poder. Então se declaram comunistas ou socialistas e implementam algumas políticas populistas. Só que isso, até o capitalismo faz quando lança programas que chamam de ‘inclusão social’. Tudo falsidade.
Um médico receitou para meu primo de 8 anos um remédio para a agitação dele.
Mandei minha tia jogar tudo fora,meu primo é absolutamente saudável e a agitação dele é normal para a idade.
Então porque entupir o corpo dele de química ?
E isso não é um caso isolado Rivotril,Antibióticos são vendidos igual pão no Brasil.
Guilherme Daflon,
Além disso, entre antibióticos e pão de padaria cheio de bromato de potássio, ainda não sei qual é o pior.
Tempos difíceis à frente:
1. antibióticos tem sido usados e abusados e a evolução está mostrando por que isto é um erro grave;
2. práticas que se valem do efeito placebo (ou seja, sem medicação alguma) estão ganhando popularidade – acupuntura, homeopatia, florais de Bach, e mais um monte de práticas espúrias;
3. a promiscuidade entre médicos e indústria farmacêutica está minando a pouca confiança que parte da população, a parte mais ilustrada, ainda tinha na eficácia da medicação receitada.
Prevejo o retorno triunfante da pajelança, em meio à explosões de doenças que não matavam mais, ou que pelo menos não tinham mais expressão…
Concordo. Tenho muito medo do que a medicina ira se tornar nos próximos anos e o que mais me frustra é que se esquecessem o dinheiro por dez anos, encontraria-se uma cura para a maioria das doenças “incuráveis” atuais.
Sim, efeito placebo existe, está comprovado e deveria ser pesquisado até exaustão. Mas a qual ciência interessaria as pessoas ter acesso a cura sem uso de medicações tradicionais, que nos escravizam para alimentar a prospera e rentavel indutria farmecêutica…
Evidente, meu caro JHR.
Eu não chamaria de práticas espúrias ou de efeito placebo os tratamentos como acupuntura e homeopatia, que tem sido usadas com ótimo efeito há milhares de anos. Eu mesma faço uso dessa medicina e sempre tratei meus cachorrinhos com ela… e tem resolvido, sem precisar usar química, que sabemos que tem incontáveis efeitos colaterais e acabam causando outras doenças.
Homeopatia e acupuntura equilibram o organismo, elas não tratam só a doença mas sim o doente.
Seria bom conversar com algumas das incontáveis pessoas que tiveram êxito com esses tratamentos antes de chamá-los de práticas espúrias.