No Pacífico Sul, fica um lugar remoto chamado de Ilhas Trobriand, localizadas ao largo da costa leste de Papua-Nova Guiné.
Nenhum homem branco tinha posto os pés lá até o final de 1700. Durante a Primeira Guerra Mundial, no entanto, as ilhas foram visitadas por uma lenda do campo da antropologia, o cientista Bronislaw Malinowski.
Malinowski, um observador atento da humanidade, notou algo estranho sobre os tobriandeses. Quando os habitantes da ilha pescavam, seu comportamento mudava dependendo de onde eles estavam. Se estavam pescavam perto da costa, onde as águas eram calmas, a pesca era consistente e o risco de desastre era baixo, eles não eram supersticiosos.
Mas, quando os pescadores navegavam pelos mares abertos, onde ficavam muito mais vulneráveis e as suas perspectivas muito menos seguras, eles se tornavam muito supersticiosos, às vezes se engajando em rituais elaborados para “garantir o sucesso”.
Em outras palavras, uma falta de controle da situação havia produzido uma grande necessidade de superstição.
E a superstição não existe só na pesca. Um dos campos mais cheios de supersticiosos é o esporte – não sem coincidência, por ser também algo que é difícil de controlar, afinal, fazemos o possível em busca de certo resultado em um jogo, mas são tantos os fatores envolvidos, que muito escapa de nossas mãos.
O futebol é particularmente recheado de rituais. O mais famoso exemplo é sem dúvida Zagallo, ex-jogador e ex-treinador da Seleção Brasileira, que cultiva uma relação especial com o número 13.
Não são só técnicos e jogadores que são chegados a um truque para criar confiança. Diz-se que durante a Copa do Mundo de 1962, os jornalistas brasileiros é que desenvolveram uma superstição. Na tribuna de imprensa, todos os profissionais eram obrigados a trabalhar com a roupa que haviam utilizado depois da vitória do time na primeira partida e, se alguém mudasse de peça, era impedido pelos colegas de entrar no local.
Comportamento estranho? Sem dúvida. Mas a atitude supersticiosa dessas pessoas é voltada quase que totalmente para o aspecto do esporte em que elas não têm controle: o resultado. Tanto é que são as pessoas que menos podem fazer algo para mudá-lo que mais se apegam a crendices (como o técnico, que não vai estar literalmente em campo, ou os jornalistas. E aqui arrisco dizer que jogadores de ataque são provavelmente mais supersticiosos que os da defesa, já que também possuem menos controle da partida. Ao observar estatísticas de diversos esportes, incluindo o futebol, é fácil perceber que ocorrem mais desarmes que finalizações, mais defesas que gols).
Em resumo, é precisamente nestes momentos de vulnerabilidade, quando sentimos que fizemos tudo o que podíamos fazer e o objetivo final está fora de nossas mãos é que a força da superstição torna-se quase irresistível. Soldados em batalha são muito conhecidos por criar superstições, e nós, pobres mortais civis, quando lutamos nossas próprias batalhas diárias, não somos diferentes.
Quando a superstição aparece, ela ajuda
Quando uma pessoa chega ao fundo do poço, a superstição aparece para deixá-la melhor. Naquele instante em que parece que não temos controle de nada, simplesmente acreditar que temos algum tipo de vantagem pode ser o suficiente para realmente nos dar uma vantagem, quer percebamos ou não.
Por exemplo, em um experimento, estudantes tinham que resolver diferentes problemas, alguns solucionáveis, outros não. Depois de trabalhar neles por um tempo, os alunos foram presenteados com um novo conjunto de problemas para resolver – anagramas.
Os alunos também receberam um questionário que permitiu que os pesquisadores determinassem quem era supersticioso e quem não era.
Depois de serem desafiados pelos problemas insolúveis, os estudantes com um alto nível de crença supersticiosa resolveram mais anagramas do que os alunos com um baixo nível de crença supersticiosa. Ou seja, às vezes, a superstição nos dá um “impulso” para chegar até o fim da linha, para alcançarmos nossos objetivos – ou simplesmente para continuarmos em pé.
Em 2006, durante a guerra entre o exército israelense e as forças do Hezbollah no sul do Líbano. Por 34 dias, mais de mil pessoas foram mortas, a maioria no Líbano. Muitas pessoas, compreensivelmente, fugiram para áreas mais seguras, mas nem todas puderam.
Entre as que ficaram, uma equipe de pesquisadores dos Estados Unidos se focou em um subgrupo: mulheres judias ortodoxas na cidade israelense de Safed. Como os pescadores de Trobriand em águas abertas, as mulheres de Safed se encontravam em uma situação perigosa sobre a qual tinham pouco controle.
E como elas lidaram com a incerteza de ser morta por um míssil a cada instante do dia?
A resposta, em parte, foi criando um ritual de recitar o Livro dos Salmos. Embora recitá-los não seja obrigatório por lei judaica, muitos judeus o fazem, porque consideram os 150 poemas que compõem o livro uma fonte de força e proteção.
Ao submeter as mulheres a uma escala de transtorno de humor, os pesquisadores foram capazes de determinar que recitar o Livro dos Salmos não só produziu um benefício psíquico nelas, como um mensurável: o comportamento supersticioso literalmente baixou o nível de ansiedade das mulheres, permitindo-lhes continuar com sua vida diária no meio de uma zona de guerra. Como os alunos confrontados com o problema insolúvel, elas foram capazes de perseverar. [DiscoverMagazine, GuiadosCuriosos]