Porque as músicas grudam na sua cabeça (e como fazer isso parar)

Por , em 3.08.2014

A lista é longa: de “Lepo Lepo” a “Friday”, passando por “Festa no Apê” e chegando até “Total Eclipse of the Heart”, o que não falta na cultura pop são músicas chiclete. Este tipo de canção gruda no seu cérebro por dias e não há simpatia de avó que cure este mal.

Relatos deste tipo de situação foram registrados antes mesmo dos equipamentos modernos de gravação serem inventados. Entre outros indivíduos históricos famosos, Mark Twain publicou uma reportagem em 1876 sobre “um maldito jingle cativante que fica preso em repetição mental”, um ano antes de Thomas Edison inventar o seu fonógrafo.

A natureza involuntária deste fenômeno o torna notoriamente difícil de estudar e, por isso, o mecanismo exato do cérebro que faz com que ele aconteça ainda não é totalmente compreendido. Alguns cientistas acreditam que a antiga prática da humanidade de passar o conhecimento adiante através da música é uma possível fonte para essa disposição.

Na maior parte dos 200 mil anos da evolução humana moderna, fatos, história, métodos e outras informações foram transmitidas e lembradas através de palavras faladas e cantadas. Isso levou alguns cientistas a argumentar que o cérebro humano se equipou com uma rede que codifica a informação falada e cantada, e a recupera sob demanda. Considere que, ainda hoje, muitos acham mais fácil memorizar algo que seja em forma em rima ou ritmado – vide cursinhos pré-vestibular.

Se já estávamos fortemente predispostos a esse tipo de coisa ou foi um desenvolvimento relativamente recente na história da humanidade, esta teoria do cérebro baseia-se no fato de que a música é “multissensorial” e afirma que, apesar de as notas e letras serem memorizadas, os sentimentos e ideias que a música também desencadeia são armazenadas junto com elas. Então, mais tarde, quando esse sentimento ou ideia é lembrada, às vezes traz também uma parte cativante da música, o que é chamado de “memória involuntária”.

A partir daqui, nossos cérebros parecem configurados a terminar o que começaram com as partes das canções. Na verdade, quando pesquisadores da Universidade de Dartmouth (EUA) tocaram pequenos trechos de músicas conhecidas para participantes de uma pesquisa, descobriram que o córtex auditivo do cérebro continuou a música na cabeça dos sujeitos, mesmo depois de o som ter sido desligado. Levando isso em consideração, talvez não seja surpreendente que quanto mais você ouvir uma música, mais provável é que em algum momento ela vai ficar no seu cérebro. Além disso, pessoas com Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) têm se mostrado mais propensas a ficar com canções presas em suas cabeças.

De acordo com os Anais da 10ª Conferência Internacional sobre Percepção Musical e Cognição, realizada em 2008 em Sapporo, no Japão, mais de 90% de nós “pega” uma canção pegajosa (também conhecida como “earworm” – “verme de orelha”, em tradução livre) pelo menos uma vez por semana. Calcula-se também que aproximadamente 98% das pessoas passam por essa experiência em algum momento da vida.

Estopins

Cientistas identificaram dois estopins principais que comumente desencadeiam a repetição de uma música chiclete na cabeça. O primeiro deles é o excesso de exposição. Como já mencionamos, talvez esta seja a razão mais comum para que fragmentos de uma canção se alojem em sua cuca. Isso inclui o quão recentemente você a escutou e quantas vezes ela foi repetida – por isso que músicas “da moda” que tocam direto no rádio são grandes candidatas a músicas chiclete.

Outra possível causa das músicas chiclete é associação. Às vezes, um aspecto de seu ambiente desencadeia o fenômeno, incluindo palavras, pessoas, ritmos, situações e sons. Por exemplo, ao fazer as tarefas domésticas, “Ensaboa”, de Marisa Monte, pode começar a tocar dentro da sua cabeça. Da mesma forma, associações mais indiretas podem aparecer, como algo que acontecia ao seu redor quando você ouviu determinada música, fazendo com que seu cérebro a associe a fatores externos que nada teriam a ver com ela. Mais tarde, quando você estiver neste mesmo ambiente, o seu cérebro pode desenterrar a música e começar a repetir a parte mais memorável dela em sua mente.

Características

Há, ainda, certas características, tanto de canções, como de pessoas, que tornam muito mais provável que uma música fique presa na sua mente. No primeiro caso, as músicas que têm maior tendência a desencadear o fenômeno possuem geralmente notas com durações mais longas e intervalos de tom menores. Estas também são as duas principais características que tornam algumas músicas mais fáceis de cantar, mesmo para os musicalmente destreinados.

“Fundamentalmente, uma música chiclete é o seu cérebro cantando”, explica Victoria Williamson, professora visitante na Universidade de Ciências Aplicadas e Artes de Lucerna (Suíça) e pesquisadora da Universidade de Sheffield (Inglaterra), que analisou mais de 50 características musicais diferentes e descobriu estas especificidades relacionadas às notas e ao tom. Um bom exemplo que apresenta estas características é “Poker Face”, de Lady Gaga.

Já no caso das pessoas, há mais fatores relacionados com esta situação incômoda. Em pelo menos um estudo, foi encontrada uma ligação forte entre as pessoas que “colocaram um alto grau de importância na música” e a frequência, duração e irritação causada por uma música chiclete. Isto pode, porém, apenas estar ligado ao fator de excesso de exposição, já que os apaixonados por música simplesmente tendem a ouvir músicas com mais freqüência do que a maioria das pessoas.

Além disso, como mencionado, as pessoas que tendem a ser mais obsessivas (mas não clinicamente neuróticas) são mais propensas a ficar com músicas na cabeça. Elas também relatam frequentemente que sentem que têm menos controle sobre o fenômeno. Além disso, estudos têm mostrado que certos medicamentos usados ​​para tratar o TOC podem reduzir a frequência que as canções ficam presas na cabeça de alguém com a condição.

Por último, músicas pegajosas também ficam mais presas em pessoas ociosas, cansadas e estressadas. Nestas situações, as defesas estão baixas e o cérebro não está ocupado o suficiente, por isso a música chiclete toma posse. Isto é precisamente o que aconteceu com o alpinista Joe Simpson que, preso em uma geleira e temendo que pudesse morrer, não conseguia parar de pensar na música “Brown Girl in the Ring”, de Boney M.

Curas

Existem diversos truques que você pode tentar para se livrar deste incômodo. Em um recente estudo britânico, um dos tratamentos favoritos usados por quem sofre com estes “vermes de ouvido” foi combater fogo com fogo, pensando em outra música. Entre as canções mais popularmente listadas pelos participantes como antídoto foram “God Save the Queen”, “Kashmir”, do Led Zeppelin e “Karma Chameleon”, do Culture Club.

Há, ainda, quem recomenda usar suas palavras para matar um verme de ouvido. Apenas ao falar com outra pessoa ou pensar em palavras de um jogo de palavras cruzadas, a letra da canção pode ser suplantada com novos termos.

Outros dizem que qualquer coisa que absorva sua atenção funciona. “A chave é encontrar algo que vai lhe dar o nível certo de desafio”, diz Ira Hyman, psicólogo de música na Universidade de Western Washington, que conduziu uma pesquisa sobre músicas chiclete. “Se você está cognitivamente engajado, limita a capacidade de canções intrusivas entrarem em sua cabeça”.

Se tudo mais falhar, você pode tentar vencê-l pelo cansaço. Escute a música completa, em vez de apenas o trecho repetitivo que está corroendo seu cérebro. [Gizmodo, Telegraph, Science Friday]

2 comentários

  • Yazmin Gatti:

    Para mim é muito facil me livrar disso, simplesmente escuto outra musica que eu realmente goste ou “cantarolo” mentalmente outra coisa.

  • Luis Mendes:

    Campanha política começando agora.
    Prevejo muito sofrimento de gente com musicas na cabeça e que para piorar são só números.

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