Transistores, ciborgues e imortalidade

Por , em 3.06.2012

DO TRANSISTOR AO CIBORGUE

Descobertas recentes no campo da bioeletrônica indicam que a tão esperada interface neuronal entre a mecatrônica e a biônica já foi encontrada. Entre outras implicações o termo “ciborgue” deixa de frequentar os livros de FC e se torna um expediente corriqueiro na ciência médica.

Para exemplificar essa tese vamos abordar o recente artigo da Nature “Logic gates based on ion transistors” dos pesquisadores Klas Tybrandt, Robert Forchheimer e Magnus Berggren que numa tradução livre leríamos: “Portas lógicas fundamentadas em transistores iônicos”.

PORTAS LÓGICAS

Quando mencionamos portas lógicas estamos geralmente nos reportando a microprocessadores como estes que figuram em nossos computadores e smartphones. Grosso modo estamos nos referindo a circuitos eletrônicos capazes de realizar operações lógicas de acordo com a álgebra booleana.

Com o avanço da tecnologia dos semicondutores foram criados microcircuitos compostos por milhares (e mais recentemente milhões) de componentes discretos como resistores, indutores, capacitores e transistores capazes de realizar tais operações e que correspondem ao “coração” e ao “cérebro” de nossa eletrônica.

Evidentemente se destaca nos circuitos lógicos a ação do transistor (que alguns chamam de transístor devido à pronúncia anglófona). Tal componente pode atuar como uma válvula que controla o sentido e a vazão das cargas elétricas. Nesse controle de vazão, podemos intuir a redução e também – o que é mais significativo – o aumento do fluxo de cargas, correntemente denominado em jargão técnico “ganho de sinal”, coisa fácil de ser observada nos amplificadores de áudio.

Enfim, todos esses componentes, do resistor ao transistor, funcionam pelo princípio da condução ou não-condução de cargas elétricas, tais como “elétrons” (portadores de carga negativa) e “lacunas” ou “holes” (portadores de carga positiva); tudo isso percorrendo a trama intricada de cristais de silício “dopados” com impurezas controladas que fazem variar sua condutividade e/ou resistividade.

TRANSISTOR IÔNICO

Em nossas aulas de Química aprendemos que existem partículas formadas por um ou mais átomos que podem portar carga positiva ou carga negativa. São denominadas íons.

Os íons estão presentes em diversos materiais: por exemplo, na água que bebemos, no soro fisiológico, no plasma sanguíneo e também no citoplasma de cada célula dos seres vivos, sejam animais ou vegetais.

Aliás, é através de correntes iônicas que se dá o comportamento elétrico de nosso sistema nervoso.

Pois bem, em 2010 foi criado pelo trio de cientistas citados no início deste artigo, um transistor que funciona pelo mesmo princípio. Ou seja, ao invés de se fundamentar em correntes elétricas portadas por elétrons e lacunas, como ocorre nos transistores de silício, esse transistor iônico opera com correntes de íons, seguindo princípio análogo ao que se dá em um neurônio, por exemplo.

Criado o transistor iônico, o próximo passo foi dado: a criação de processadores lógicos (chips) que utilizam estes transistores iônicos.

Quais as implicações?

São inumeráveis. Desde a criação de computadores orgânicos, menores, mais rápidos, mais baratos e mais duráveis até o desenvolvimento de supermedicamentos com ação inteligente e próteses bioativas perfeitamente controladas pelo cérebro.

Numa palavra:

CIBORGUE.

Usada aqui com o conceito literal de sua concepção, um pouco aquém do que preconiza Ray Kurzweil.

Todos sabemos que o termo “ciborgue” cunhado por Manfred E. Clynes e Nathan S. Kline em 1960 é um aportuguesamento de “cyborg” que deriva da junção das palavras inglesas cyber(netics) organism, ou seja, “organismo cibernético”.

É empregado atualmente para se referir a todo organismo vivo com implantes artificiais ativos. Uma fusão harmônica entre o material natural “vivo” e o material sintético.

IMORTALIDADE?

Muitos pesquisadores consentem em antever um futuro (talvez não muito distante) no qual se possa prolongar a vida indefinidamente, algo que tangencia mais uma vez a ficção científica – a tão sonhada imortalidade.

Seja pela tecnologia da célula tronco, seja pela tecnologia dos transistores iônicos, pelas quais de forma isolada ou combinada se torne exequível substituir partes de nosso corpo que não mais funcionam ou foram perdidas ou até melhorar as que já existem, incluindo agora o próprio cérebro.

A comunidade científica considera tudo isso uma boa notícia. E você meu caro leitor? O que pensa a respeito?

-o-

[Fonte: Logic gates based on ion transistor]

[Leia os outros artigos de Mustafá Ali Kanso]

 

LEIA SOBRE O LIVRO A COR DA TEMPESTADE do autor desse artigo

Navegando entre a literatura fantástica e a ficção especulativa Mustafá Ali Kanso, nesse seu novo livro “A Cor da Tempestade” premia o leitor com contos vigorosos onde o elemento de suspense e os finais surpreendentes concorrem com a linguagem poética repleta de lirismo que, ao mesmo tempo que encanta, comove.

Seus contos “Herdeiros dos Ventos” e “Uma carta para Guinevere” juntamente com obras de Lygia Fagundes Telles foram, em 2010, tópicos de abordagem literária do tema “Love and its Disorders” no “4th International Congress of Fundamental Psychopathology.”

Foi premiado com o primeiro lugar no Concurso Nacional de Contos da Scarium Megazine (Rio de Janeiro, 2004) pelo conto Propriedade Intelectual e com o sexto lugar pelo conto Singularis Verita.

7 comentários

  • Harley Eugênio Moura:

    Se tiver a imortalidade, quero ver qual crente vai querer ir para o ceu!

  • aguiarubra:

    P.: “…Seja pela tecnologia da célula tronco, seja pela tecnologia dos transistores iônicos, pelas quais de forma isolada ou combinada se torne exequível substituir partes de nosso corpo que não mais funcionam ou foram perdidas ou até melhorar as que já existem, incluindo agora o próprio cérebro…”

    Comentário: são bem-vindas tais tecnologias e NECESSARIAMENTE precisaremos dela quando o meio-ambiente entrar em total colapso, por causa dos abusos político-econômicos que são impetrados irresponsavelmente pelas nações de hoje em dia.

    Só não sei que cérebro “cyborg” será esse que, num futuro de médio prazo, terá mais componentes “artificiais” que naturais, pois duvido muito que esteja “vivo” além de um certo nível de substituição das partes vivas!!!

    P.: “…A comunidade científica considera tudo isso uma boa notícia…”
    Comentário: não tenho mais respeito pela comunidade “científica”, desde que a Ciência se tornou “produtora de tecnologia” para “comunidades multinacionais”, composta por gente gananciosa, que apenas pensa em lucro e alta concentração de renda para eles mesmos.

    Escrevo isso por causa da série “CONTINUUM”, cuja sinopse vou postar abaixo:

    Descrição: Com dez episódios em sua primeira temporada, a série canadense Continuum conta a história de Kiera Cameron (Rachel Nichols, de Alias), uma policial que viaja 65 anos ao passado com a missão de caçar criminosos fugitivos que voltaram no tempo para mudar a história e evitar que, NO FUTURO, O MUNDO SEJA DOMINADO POR GRANDES E OPRESSIVAS CORPORAÇÕES. Nos dias de hoje Kiera passa a trabalhar com o policial Carlos Fonnegra (Victor Webster, de Mutant X), e através de um chip implantado em seu cérebro ela também é capaz de se conectar com Alec Sadler (Eric Knudson, de Jericho), um gênio da informática com dezessete anos. No elenco também estão Brian Markinson (Caprica), Jennifer Spence (Stargate Universe), Olivia Ryan Stern, Caitlin Cromwell, Richard Harmon, Stephen Lobo (Smallville), Roger Cross, Lexa Doig (Andromeda), Omari Newton e Luvia Petersen. A série, criada por Simon Barry e com o episódio piloto dirigido por Jon Cassar (Terra Nova), começa a ser transmitida no Canadá no dia 27 de maio (2012) pelo canal Showcase, e ainda não há previsão de estreia em outros países.

    A perspectiva é terrível. Enquanto a comunidade científica “dispensar consciencia ético-moral” de suas boas notícias, a tecnologia é uma grande ameaça á privacidade de cada ser vivo desse planeta.

    Os filmes “O Preço do Amanhã” e “Invasão de Privacidade” (além de clássicos como “Zardoz”, “Admirável Mundo Novo”, “Gatacca – A Experiência Genética”, “A Ilha” e “A Ilha do Dr. Moreau”) dão bem conta do que pode significar esse futuro cheio de “boas notícias” que a tal da comunidade tecno-científica tem para nós outros, “ingênuos” consumidores alienados.

    No entanto, sou muito otimista, apesar de tudo! Os meios de manipulação aumentam, mas os meios de auto-defesa do indivíduo também aumentam, até em maior proporção!!!

    Por isso, dou um “viva” para os heróis hackers do futuro, que saberão como evitar que sejamos todos engolidos pela “máquina-do-juizo-final” que estão construindo contra nós.

  • Marcelo Carvalho:

    Eu como estudante de Engenharia Eletrônica entendo um pouco a respeito do funcionamento desses transistores iônicos, e concordo com a evolução que isso vai causar na humanidade, mas ao mesmo tempo que me fascina me preocupa, acho que salvando algumas exceções, não devemos modificar nossa estrutura ou tentar melhorar o que já temos. Isso pode ser um pensamento um tanto quanto cristão, mas acho que não devemos brincar com a natureza principalmente com a nossa natureza, isso pode trazer conseqüências inimagináveis na nossa sociedade pois todos nós sabemos do que nós somos capazes.

  • joserios:

    Espero que aconteça,porque viver é a melhor coisa que existe,sou apaixonado por tecnologia e gosto de ver novidades sobre os avanços da ciências.

  • Marcelo Ribeiro:

    Há quem considere que já somos todos ciborgues, não apenas por causa dos aparelhos auditivos, marcapassos ou membros artificiais robóticos por aí, mas por causa dos smartphones. Indícios estão na nossa dependência crescente à informação instantânea através da internet, GPS e diversos sensores instalados nestes aparelhos. Agora está sendo lançado o Google Goggles que exibirá tudo que você enxerga e ouve com realidade aumentada incluindo informações úteis, parecido com a visão do Exterminador do Futuro. A interface neuronal, a tomada na nuca, será uma maneira muito mais eficaz de trocar informações com dispositivos similares.

    Talvez um dia eu possa pilotar o meu carro usando um blue tooth neuronal!

    • aguiarubra:

      O termo técnico para isso é FYBORG…

      Vide na wikipédia o verbete “Cyborg” e encontre o trecho abaixo:

      “…Alexander Chislenko, defeniu o termo fyborg – termo que resulta da junção de funcional e cyborg – para distinguir o cyborg na ficção científica do ser humano como organismo biológico, que se complementa com extensões tecnológicas como suplemento funcional (ex: lentes de contacto, aparelhos auditivos, telemóveis, etc). Tal como acontece com os sistemas computadorizados, em que há uma contínua extensão e integração de novas funções, também o corpo humano tem sido marcado pelo uso de novos instrumentos de apoio, aumentando as potencialidades do corpo…”

    • Marcelo Ribeiro:

      Bacana, obrigado.

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