O que os cientistas já sabem sobre como “apagar” memórias

Por , em 15.02.2016

Apagar ou alterar memórias é algo que soa definitivamente saído de ficção científica. De fato, filmes como “Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças” e “O Vingador do Futuro” há muito têm brincado com essa ideia.

Mas, graças a avanços na tecnologia de digitalização neurológica ao longo das últimas décadas, estamos agora mais perto do que as pessoas imaginam de tornar tal “absurdo” uma realidade.

As lembranças não são permanentes

Todos nós temos memórias ruins que são difíceis de esquecer. Elas podem continuar a nos assombrar, levando a condições como ansiedade, fobias ou distúrbios de estresse pós-traumático.

Essas lembranças podem até parecer irreversíveis, mas não são. Os cientistas têm descoberto que nossas memórias não são tão permanentes quanto pensávamos.

Na verdade, eles já conseguiram excluir, alterar e até mesmo implantar falsas memórias não apenas em animais, mas em seres humanos. E drogas que reprogramam nosso cérebro para esquecer coisas ruins já estão no horizonte.

Como excluir uma memória?

Para entender isso, é preciso compreender primeiro como as memórias se formam e são mantidas vivas em nossos cérebros.

No passado, os cientistas pensavam que as memórias eram armazenadas em um local específico, como um arquivo neurológico. Hoje, eles já perceberam que cada memória que temos é “trancada” em conexões por todo o cérebro.

Uma memória é formada quando as proteínas estimulam nossas células cerebrais a crescer e formar novas conexões, literalmente religando circuitos em nossas mentes.

Quando isso acontece, a memória é armazenada em sua mente e fica lá. Ocasionalmente, nós refletimos sobre ela ou a revisitamos.

Visitar uma memória é amolecê-la

O que muitas pessoas não percebem é que essas memórias não são estáveis. Na verdade, cada vez que revisitamos uma, ela se torna maleável de novo, e pode ficar mais forte e mais viva do que antes.

Este processo é conhecido como reconsolidação, e explica por que nossas memórias às vezes mudam um pouco ao longo do tempo – por exemplo, se você caiu de sua moto, cada vez que você se lembra do assunto e fica chateado, você está reforçando as conexões entre a memória e emoções como medo e tristeza. Eventualmente, apenas o pensamento de uma moto pode ser suficiente para torná-lo aterrorizado.

Alternativamente, a maioria de nós já teve a experiência de uma memória traumática se tornar motivo de riso anos mais tarde.

O processo de reconsolidação é muito importante justamente porque é o ponto no qual os cientistas podem intervir nas nossas memórias.

Na prática

Vários estudos têm mostrado que bloquear uma substância química chamada norepinefrina – que está envolvida na resposta de luta ou fuga do nosso organismo e é responsável por desencadear sintomas como suor nas mãos e coração acelerado -, os pesquisadores podem “amortecer” memórias traumáticas, impedindo-as de ser associadas com emoções negativas.

Por exemplo, no final do ano passado, pesquisadores da Holanda conseguiram tirar o medo de aranhas de pessoas com fobia, usando um medicamento chamado propanolol para bloquear a norepinefrina.

Dois de três grupos viram uma tarântula em um frasco de vidro para acionar suas memórias de medo de aranhas, e receberam em seguida propranolol ou placebo. O terceiro grupo simplesmente recebeu propranolol. Ao longo dos próximos meses, os grupos que receberam placebo ou propranolol sem ser expostos a uma aranha não mostraram nenhuma mudança em seus níveis de medo, enquanto o grupo que acionou a memória e recebeu a droga foi capaz de tocar a tarântula dentro de dias. Em três meses, o temor tinha desaparecido.

A mesma droga também foi testada em 2007 em vítimas de um trauma. Os participantes receberam ou propranolol ou um placebo diariamente durante 10 dias, e foram convidados a descrever as suas memórias do evento traumático. Aqueles que receberam a droga não esqueceram a experiência, mas uma semana depois foram capazes de contá-la com muito menos estresse.

Nos ratos, uma técnica semelhante foi utilizada para fazer os animais “esquecerem” que um som particular era associado com um choque eléctrico, enquanto outras memórias ficaram intactas.

Questões éticas

Até agora, os pesquisadores não tentaram explicitamente excluir uma memória totalmente em seres humanos, devido às implicações éticas.

No entanto, a evidência sugere que isso é algo que seria possível, dada a combinação certa de medicamentos e exercícios de revisitação da lembrança. [ScienceAlert]

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