Guerra na Síria leva ao primeiro pedido de “saque” do “Banco de Sementes do Apocalipse”

Por , em 1.10.2015

A crescente preocupação a respeito da capacidade dos países do Oriente Médio cultivarem alimentos levou à primeira solicitação para a retirada de um depósito do “Banco de Sementes do Fim do Mundo” – o Svalbard Global Seed Bank, localizado em um canto gelado da Noruega. Graças à guerra civil da Síria, o principal banco de sementes da região, em Aleppo, foi danificado e desativado em meio a combates que deixaram centenas de milhares de mortos e forçaram um número estimado de 11 milhões de pessoas a virarem refugiados. Com o Estado Islâmico controlando parte da Síria e os refugiados se espalhando pela Europa, a destruição de antiguidades e infraestrutura continua.

O banco de Aleppo

Com o início da guerra civil da Síria, em 2012, os pesquisadores do Centro Internacional para Pesquisa Agrícola em Áreas Secas (Icarda, do inglês International Center for Agricultural Research in the Dry Areas), na cidade de Aleppo, sabiam que precisariam transferir seu material de estudo para um lugar seguro. Mais de 80% – aproximadamente 140 mil pacotes de sementes – das valiosas sementes de culturas, algumas muito antigas, mantidas no Icarda foram transferidos para o Banco Global de Sementes, em Svalbard, na Noruega.

O banco de sementes em Aleppo é uma importante estação internacional de pesquisa para culturas agrícolas de terras secas há muitos anos e é único por guardar muitas variedades antigas de culturas como feijão, fava, trigo e cevada. Estas variedades são estudadas por sua resistência à seca e capacidade de crescer em solos com um teor mais elevado de sal. Isso as torna vitais para a preparação para as alterações climáticas.

O coordenador do banco de Svalbard, Ola Westengen, disse que os problemas enfrentados pelo banco de germoplasma sírio ressaltaram a importância de manter um banco de sementes em um local tão remoto e seguro quanto o ártico. O “Banco de Sementes do Apocalipse” fica escondido em uma montanha no arquipélago ártico de Svalbard, a cerca de 1.300 quilômetros do Pólo Norte.

Diversidade de culturas da Guerra na Síria

Os cientistas sírios restabeleceram o Icarda em Beirute e, nesta semana, pediram algumas de suas sementes que estão em Svalbard de volta para que possam reiniciar seu acervo. Essas sementes são necessárias para pesquisadores de plantas que estão trabalhando nas próximas culturas a serem plantadas no Oriente Médio, a fim de tentar ficar um passo à frente de pragas e da seca e aumentar a produção para alimentar uma população em crescimento. Os cientistas pediram especificamente por sementes de trigo, cevada e gramíneas que são resistentes à seca.

O banco de sementes de Svalbard, na ilha norueguesa de Longyearbyen, foi inaugurado em 2008 e contém cerca de 860 mil amostras, de países de todo o mundo. Ele foi projetado para servir como uma rede de segurança alimentar em caso de guerra nuclear, colisão com um asteroide ou outros cenários apocalípticos. Na maior parte subterrâneas, as instalações foram projetadas para proteger até 2,25 bilhões de sementes.

“Eu diria que o fim do mundo está acontecendo todos os dias para variedades de culturas”, afirmou, em uma entrevista anterior à National Geographic, Cary Fowler, diretor executivo da Global Crop Diversity Trust, que ajuda a gerenciar a instalação. “Muita gente acha que este lugar está esperando pelo juízo final antes de podermos usá-lo. Mas ele é, na verdade, um plano de backup para sementes e culturas. Estamos perdendo diversidades de sementes a cada dia e esta é a apólice de seguro para isso”, explica, referindo-se ao fato de que muitas variedades de culturas estão desaparecendo graças a mudanças no clima, preferências sociais e pressões do mercado.

A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) estima que três quartos da biodiversidade de culturas do mundo não estão mais sendo plantados em campos de agricultores. Quando as culturas são consolidadas, se tornam mais vulneráveis ​​a doenças, pragas, secas ou outras ameaças. A diversidade genética encontrada no cofre é uma garantia.

Backup de segurança

Mesmo uma cultura aparentemente simples, como o trigo, pode ter 200 mil variedades diferentes. E cada uma tem um conjunto de características individuais que determinam como se sai em temperaturas altas ou baixas, durante as secas, ou contra determinadas doenças ou pragas.

“Mesmo projeções conservadoras das mudanças climáticas agora indicam que até a metade deste século enormes áreas de alguns países, na África, por exemplo, passarão por climas que são diferentes de qualquer outro que já existiu desde o início da agricultura”, explicou Fowler. “Como eles vão se adaptar a climas futuros? Uma maneira possível é recorrer a este rico tesouro da diversidade e cultivar novas plantações com características que lhes permitam ter sucesso nesses climas. [O banco] é essencial para a segurança alimentar no futuro”, disse Fowler.

Por causa da guerra na Síria, os cientistas têm aproveitado esse recurso pela primeira vez. Reservas de sementes já tinham sido previamente destruídas no Iraque e no Afeganistão, e uma foi gravemente danificada por uma inundação nas Filipinas. [National Geographic, CNN, Digital Journal]

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