Efeito Cinderela: enteados são mais mal tratados do que filhos biológicos?

Por , em 13.11.2013

A crença comum prega que os pais geralmente tratam seus enteados de forma menos favorável do que seus próprios filhos. Até agora, muitos pesquisadores acreditavam no chamado “efeito Cinderela”, que afirma que é biologicamente inevitável que os pais se importem menos com enteados, já que eles não perpetuam seus genes.

Pesquisadores do Instituto Max Planck de Pesquisa Demográfica em Rostock, na Alemanha, no entanto, descobriram uma exceção importante. Se há uma chance razoável de aumento da riqueza no ambiente dos pais, nenhuma diferença é feita entre os próprios filhos e enteados (ah, o dinheiro, sempre se mostrando importante na nossa cultura). Assim, o cuidado parental depende de mais fatores do que simplesmente apenas a relação biológica.

“Estamos agora em condições de provar que o efeito Cinderela não é um reflexo inevitável dos padrastos”, afirma Kai Willführ, um dos cientistas do estudo.

Eles investigaram se e como os pais fortemente negligenciaram seus enteados através da análise de dados da mortalidade de crianças em famílias históricas dos séculos 17 a 19.

Os pesquisadores compararam a região Krummhorn da Frísia Oriental (Alemanha), que era uma área densamente povoada com pouco espaço para o desenvolvimento econômico, com assentamentos canadenses em crescimento no Québec.

Foram analisadas as vidas de milhares de crianças até aos 15 anos de idade: se e quando um pai morreu, se e quando uma madrasta ou padrasto passou a morar com elas, se meio irmãos nasceram durante este período, etc, tudo para calcular a influência de todos esses eventos sobre a taxa de sobrevivência dos meninos e meninas. Datas de nascimentos, batizados, casamentos e funerais foram recuperadas de antigos registros de igrejas. Na região Krummhorn, os pesquisadores analisaram nascimentos de 1720-1859, e em Québec, de 1670-1750.

As conclusões mostraram que somente em Krummhorn, que oferecia menos oportunidades para o crescimento econômico, a madrasta teve uma influência negativa. Crianças de Krummhörn do primeiro casamento de um pai morreram com mais frequência antes dos 15 anos se um padrasto entrava em cena, coisa que não foi observada em Québec. O “efeito Cinderela”, portanto, não ocorre inevitavelmente.

A extensão deste efeito é surpreendente: se uma garota Krummhorn perdesse a mãe cedo, a probabilidade de ela morrer antes da idade de 15 anos mais do que dobrava em relação a uma menina cuja mãe não morreu. Se o pai se casasse novamente e a madrasta se juntasse à família, a mortalidade dobrava novamente. Assim, a chegada de uma madrasta afetou meninas na Frísia Oriental tanto quanto a morte de sua própria mãe. Em Québec, no entanto, o risco de morrer jovem mudava pouco quando uma nova mãe chegava.

“As madrastas em Québec pareciam entender que os filhos do primeiro casamento de seu marido não eram concorrência para os seus próprios filhos”, disse Willführ.

De fato, os meios irmãos canadenses eram considerados aliados dos filhos biológicos, noção contrária ao “efeito Cinderela”, na qual padrastos sempre consideram crianças “de fora” concorrentes aos seus próprios filhos e, portanto, as negligenciam.

Isso realmente ocorreu em Krummhorn porque, de fato, lá os irmãos competiam por necessidades básicas. “Temos todas as razões para supor que madrastas negligenciaram, exploraram ou até mesmo abusaram dos filhos do primeiro casamento de seu marido [em Krummhorn]”, argumenta Willführ.

O fato de que isso só aconteceu na Frísia Oriental mostra que o contexto em que as famílias estão vivendo – se há espaço para o desenvolvimento econômico ou não – influencia fortemente a maneira como os pais alocam seu carinho aos filhos e enteados.

Embora os cientistas tenham usado dados históricos, seus resultados fundamentalmente desafiam a veracidade do “efeito Cinderela”. “É, portanto, também verdade hoje que padrastos nem sempre são maus”, finaliza Willführ. [ScienceDaily]

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