Perigo: O Tinder e o seu cérebro
Estamos na era da internet, disso não há dúvida. Tanta acessibilidade e conectividade têm transformado vários aspectos da nossa vida. Alguns acreditam até que aplicativos como o Tinder estão mudando a forma como encaramos encontros amorosos e namoros.
Os usuários do Tinder entram em um “jogo” para encontrar um parceiro potencial, caso gostem da aparência deles. É bem simples: você vê a foto da pessoa, desliza para a direita na tela se gostar, e para esquerda se não gostar. Duas pessoas que se “gostaram” são em seguida colocadas em contato.
Responsável por oito bilhões de conexões entre 196 países, o Tinder é o mais popular aplicativo de seu tipo no mundo. Usuários fazem escolhas 97.200 vezes por minuto e gastam, em média, 11 minutos por dia olhando os perfis de outras pessoas.
Tinder: Lado bom x lado ruim
Parece uma excelente oportunidade – só são reunidas pessoas que gostaram uma da outra, elas podem se conhecer e se dar bem, e tudo isso pode acabar em um romance. Hoje em dia, bastante gente conhece alguém que está namorando ou vai casar graças ao Tinder.
Mas há também outras facetas do aplicativo. O Tinder parece ser mais usado para relacionamentos curtos e descompromissados, e muitas vezes os usuários o utilizam de maneira errada. Por exemplo, muitas mulheres se queixam de receber imagens não solicitadas e indesejadas de pênis de estranhos.
Os seres humanos evoluíram mais de dois milhões de anos a fim de desenvolver o sistema cerebral mais complexo que existe no mundo, e essa evolução também nos levou a ser em grande parte monogâmicos.
Então, quão bem equipados estamos para lidar com o “anonimato” da internet e a gama de aplicativos de namoro que estão por aí?
Só olha uma foto e pronto?
Não há nada de novo em olhar fotos para decidir sobre um parceiro, diz Lucy Brown, professora na Faculdade Einstein de Medicina, em Nova York, nos EUA, e autora de vários trabalhos sobre a neurobiologia do amor romântico. Ela adverte, no entanto, que esta não é uma forma particularmente eficaz de escolher alguém.
Os cérebros dos seres humanos estão preparados para julgar as pessoas depois de vê-las “em movimento”, em vez de uma mistura de imagens fixas e mensagens em uma tela.
“É muito perigoso – você não pode dizer muito de uma fotografia”, explica Brown. “O cérebro humano está configurado para recolher informações sobre a forma como alguém se move ou a forma como sorriem”.
Portanto, faz sentido conhecer o potencial parceiro o mais rápido possível. Mas, a partir daí, o ainda há muito trabalho pela frente.
Emoção x comprometimento
Em média, é preciso passar três anos da vida com alguém antes que ela se revele totalmente e você possa dizer que a conhece de fato. De acordo com Brown, aplicativos como Tinder e Happn, porém, são mais conhecidos por facilitar relacionamentos de curto prazo.
E este é um dos medos mais comumente expressos sobre o impacto social dos aplicativos de namoro – que a promessa de escolha interminável incentive as pessoas a perseguir a emoção de múltiplos flertes de curto prazo ao invés de trabalhar em um comprometimento de longo prazo.
O vício do “lance”
Há evidências que sugerem que mudanças químicas dramáticas ocorrem dentro do cérebro durante os primeiros dias de um relacionamento.
Um estudo realizado pela Universidade de Pisa, na Itália, em 1999, descobriu que os níveis de serotonina no cérebro de pessoas que atravessam a fase inicial do amor romântico eram comparáveis com os níveis de pessoas com transtorno obsessivo compulsivo (TOC).
Em 2007, cientistas da Universidade de Basel, na Suíça, sugeriram que a fase inicial da paixão é comparável a hipomania – um estado de energia elevada, inibições mais baixas e uma diminuição da necessidade de sono.
Bianca Acevedo, pesquisadora da Universidade da Califórnia em Los Angeles, nos EUA, afirma que uma onda de dopamina – substância química que transmite sinais no cérebro – é liberada nos primeiros estágios de um relacionamento, o que torna as pessoas mais animadas. Este sistema de recompensa inconsciente é o mesmo ativado no caso de vícios, como de drogas.
Então, calma lá
Assim, uma conclusão a que podemos chegar é que aplicativos de namoro não estão transformando as pessoas em avessas a compromissos. Fugir de uma relação séria rapidamente após um período de intensidade é provavelmente um traço de personalidade.
É, no entanto, um traço de personalidade que o namoro online privilegia e reforça.
Assim, se você não quiser ficar em um loop eterno de flertes que não dão em nada, é melhor apostar suas fichas na vida real, ao invés da virtual.
Brown recomenda cautela em aplicativos como Tinder. “As pessoas podem ter três ou quatro outras pessoas com quem estão conversando”, diz.
Nesta fase de uma relação – o início de um potencial romance – seu cérebro pode ficar muito empolgado, mas é preciso levar em conta que a natureza está te deixando um pouco fora de controle. [BBC]