Este gelo é quase tão quente quanto o sol e agora cientistas conseguiram criá-lo aqui na Terra

Por , em 24.04.2018

Imagem do experimento de alta pressão a laser usado para produzir gelo superiônico

Pela primeira vez, cientistas conseguiram criar gelo superiônico em laboratório.

Além de ser sólido e líquido ao mesmo tempo e 60 vezes mais denso que o gelo comum, ele se forma a temperaturas quase tão quentes quanto a superfície do sol.

Acredita-se que essa forma de gelo de alta pressão exista no interior de Urano e Netuno. Até agora, sua existência era apenas teórica.

Um artigo sobre a pesquisa foi publicado na prestigiada revista Nature Physics.

O bizarro gelo

Segundo o principal autor do estudo, Marius Millot, físico do Laboratório Nacional Lawrence Livermore, na Califórnia (EUA), o novo trabalho fornece evidências experimentais do gelo superiônico, previsto pela primeira vez há 30 anos.

Ele é muito mais denso que o gelo comum porque se forma apenas sob calor e pressão extremos, como as condições encontradas dentro de planetas gigantes.

Além disso, durante a fase superiônica, o hidrogênio e o oxigênio dentro das moléculas de água se comportam de forma bizarra; os íons de hidrogênio se movem como líquido, dentro de uma rede cristalina sólida de oxigênio.

Fazer o gelo, então, não é uma tarefa nada simples.

O método

Para alcançar o feito, a equipe primeiro comprimiu água em um gelo cúbico ultracongelado e cristalino – uma forma cristalina diferente daquela que vemos em cubos de gelo comuns.

Os pesquisadores aplicaram então 2,5 gigabits por polegada quadrada (GPa) de pressão no gelo, o que é equivalente a cerca de 25.000 vezes a pressão atmosférica na Terra. Em seguida, aqueceram e comprimiram ainda mais o material, usando choques a laser. Cada estrutura de gelo recebeu até seis raios laser de mais de 100 vezes essa alta pressão.

Esse método permitiu que os pesquisadores acessassem estados mais frios em alta pressão do que em estudos anteriores de compressão por choque.

Assim que o gelo superiônico ficou pronto, a equipe precisou analisar suas propriedades óticas e termodinâmicas muito rápido: eles tinham apenas 10 a 20 nanossegundos para realizar esse trabalho, antes que as ondas de pressão liberassem a compressão e a água se dissolvesse.

Sucesso

Os resultados foram bizarros. Os cientistas descobriram que o gelo derrete a extraordinários 4.725 graus Celsius a 200 GPa de pressão. Essa pressão é cerca de 2 milhões de vezes a pressão atmosférica na Terra.

“É espantoso que o gelo esteja presente em milhares de graus dentro desses planetas, mas é o que os experimentos mostram”, disse Raymond Jeanloz, físico planetário da Universidade da Califórnia (EUA) e um dos autores do estudo.

Ciência planetária

As descobertas podem nos oferecer um insight sobre o interior de planetas como Urano e Netuno. Estudos anteriores sugeriram que estes planetas tinham núcleos “totalmente fluidos”, mas a adição de gelo superiônico muda essa imagem.

A nova pesquisa propõe que o interior de tais mundos seja formado por uma camada fluida relativamente fina e um grande “manto” de gelo superiônico.

Essa ideia inclusive confirmaria uma simulação de computador realizada há uma década para tentar explicar os estranhos campos magnéticos de Urano e Netuno. O campo magnético de Urano está inclinado a 59 graus do eixo do planeta. Os polos magnéticos de Netuno têm uma inclinação de aproximadamente 47 graus. Isso é extremo em comparação com a Terra, que tem uma inclinação de apenas 11 graus. Seus campos magnéticos também podem se comportar de maneira diferente; por exemplo, o campo de Urano parece “ligar e desligar” como um estroboscópio.

Felizmente, a NASA está propondo uma sonda para estudar Urano e/ou Netuno nas próximas décadas, o que pode elucidar se a hipótese levantada pelo estudo está correta. [LiveScience]

Deixe seu comentário!