O enigma da percepção do tempo no cérebro dos mamíferos

Por , em 23.07.2023

Por séculos, cientistas e filósofos têm contemplado a natureza subjetiva do tempo, como ele pode voar ou parecer interminável dependendo das circunstâncias.

Recentemente, um grupo de pesquisadores das universidades de Oxford, University College London e da Fundação Champalimaud conduziu um estudo com ratos para identificar uma parte específica do cérebro responsável por esse fenômeno de percepção do tempo.

O foco da investigação foi o estriado, uma região profunda do cérebro associada às habilidades motoras, ao planejamento de ações e à tomada de decisões. Para alterar a atividade neural nessa área, os pesquisadores utilizaram pequenas variações de temperatura.

A manipulação da temperatura tem sido utilizada em estudos anteriores para influenciar dinâmicas comportamentais em animais, como o canto de pássaros. Ao resfriar regiões específicas do cérebro, o canto diminui de velocidade, enquanto ao aquecê-las, ele acelera, mantendo sua estrutura, de acordo com Tiago Monteiro, um ecologista comportamental da Universidade de Oxford.

Por meio de dispositivos implantados, os cientistas puderam controlar a temperatura do estriado dos ratos e observar as mudanças correspondentes na atividade cerebral. Sob anestesia, eles notaram que a atividade do estriado aumentava com temperaturas mais altas e diminuía com temperaturas mais baixas.

Quando os ratos estavam acordados, as alterações na atividade cerebral induzidas pela temperatura estavam correlacionadas com mudanças em sua percepção do tempo durante os experimentos no laboratório. Um estriado mais quente e mais rápido levava os ratos a perceberem o tempo passando mais lentamente, enquanto um estriado mais frio e mais lento levava à percepção de que o tempo passava mais rapidamente.

Curiosamente, essas mudanças na atividade cerebral induzidas pela temperatura não afetaram a velocidade de movimento dos ratos, mas sim o momento em que eles decidiam iniciar movimentos. Isso sugere que diferentes regiões do cérebro lidam com a percepção do tempo passando e a velocidade com que as ações são executadas. Os pesquisadores especularam que o cerebelo, uma região do cérebro associada ao controle motor e coordenação, pode estar envolvido na determinação da velocidade dos movimentos físicos.

Embora dados de ressonância magnética anteriores tenham sugerido o envolvimento do gânglio basal na regulação do comportamento temporal em humanos, mais pesquisas são necessárias para explorar como esses achados se traduzem em diferentes espécies.

A percepção do tempo é fundamental em nosso cotidiano, e alterações nesse aspecto podem afetar significativamente o movimento e a percepção, como observado em condições como a doença de Parkinson. Este estudo lança mais luz sobre os intricados mecanismos do cérebro que governam a percepção do tempo em mamíferos.

No entanto, muitas questões permanecem sem resposta. Os pesquisadores questionam quais circuitos cerebrais criam esses padrões de atividade relacionados à percepção do tempo em primeiro lugar, quais outras funções além da cronometragem esses padrões podem ter e como eles contribuem para nossas respostas adaptativas e inteligentes ao ambiente. Segundo Tiago Monteiro, ainda há muito mistério a ser desvendado nessa área fascinante de pesquisa.

Talvez seja justamente esses resultados tão esperados que possam fazer com que nos aproximemos ainda mais da compreensão sobre o que é a natureza animal, fortalecendo, também, vínculos com eles. [ScienceAlert]

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