“Idade das Trevas”: a difícil pesquisa do início obscuro do universo
Uma das teorias cosmológicas mais aceitas é de que as primeiras estrelas do universo se formaram algumas centenas de milhões de anos após o Big Bang.
Seria ótimo confirmar essa hipótese, mas, nesse período, que terminou cerca de 13 bilhões de anos atrás, nuvens de gás preenchiam o universo e obscureciam a luz visível e infravermelha.
Cientistas tentam pesquisar essa “Idade das Trevas” do universo há anos. Por exemplo, eles acreditam que a luz desse período obscuro pode ser detectável na forma de sinais de rádio muito fracos, e radiotelescópios como o Murchison Widefield Array (MWA) foram construídos exatamente para isso.
Enquanto o instrumento de fato tem gerado os dados de rádio mais precisos do universo inicial até o momento, vasculhá-los é outra tarefa muito difícil.
Agora, uma equipe internacional de pesquisadores obteve sucesso em filtrar dez vezes mais interferência eletromagnética (em comparação com a norma) em mais de 21 horas de dados coletados pelo MWA, e estão atualmente analisando esses dados melhorados em busca de indicadores de um sinal de rádio originado da “Idade das Trevas”.
Big Bang, Idade das Trevas, Reionização
Os modelos cosmológicos indicam que, logo após do Big Bang, o universo ficou cheio de plasma quente e denso. Elétrons e fótons interagiam regularmente nesse período, o que tornou o universo opaco.
Menos de um milhão de anos depois, essas interações se tornaram mais raras e o universo em expansão se tornou cada vez mais transparente. Como ainda não havia galáxias, no entanto, ele continuou escuro.
E assim permaneceu por algumas centenas de milhões de anos, quando o cosmo foi preenchido com hidrogênio neutro (sem carga). Aos poucos, eles se juntaram para formar as primeiras estrelas, começando a Reionização e terminando a Idade das Trevas.
Quando exatamente essa transição ocorreu, no entanto, é complicado de determinar por que seus sinais são basicamente “invisíveis” para os instrumentos que possuímos hoje.
“Para esta Idade das Trevas, é claro que não há sinal baseado em luz que possamos estudar – não havia luz visível! Mas há um sinal específico que podemos procurar. Vem de todo esse hidrogênio neutro. Nunca medimos esse sinal, mas sabemos que ele está lá fora. E é difícil de detectar, porque nos 13 bilhões de anos desde que esse sinal foi emitido, nosso universo se tornou um lugar muito ocupado, repleto de atividades de estrelas, galáxias e até mesmo nossa tecnologia que afoga o sinal do hidrogênio neutro”, explica Miguel Morales, professor de física da Universidade de Washington (EUA) e principal autor do artigo.
Linha de Hidrogênio
De acordo com os cientistas, esse sinal, conhecido como “Linha de Hidrogênio”, corresponde à frequência e comprimento de onda em que o hidrogênio deixa de ser neutro e passa a ter uma carga, um limite encontrado em 21 cm (1.420,4 MHz) no espectro de rádio.
O MWA é a principal ferramenta utilizada pelos pesquisadores para encontrar evidências dessa linha no espaço. O arranjo do radiotelescópio consiste em 4.096 antenas dipolo que podem captar sinais de baixa frequência, como a assinatura eletromagnética do hidrogênio neutro, mas esses sinais são muito difíceis de discernir devido à interferência eletromagnética de outras fontes cósmicas ou terrestres.
O que o pessoal do novo estudo fez foi justamente melhorar nossas chances de detecção eliminando esse “ruído de fundo”, o que inclui, entre outras coisas, técnicas aprimoradas de análise, métodos de controle de qualidade de dados e abordagens de calibração interferométrica.
Próximos passos
Como um próximo passo, a equipe planeja classificar cerca de 3.000 horas de dados adicionais coletados pelo MWA e filtrar ainda mais ruído para que possam finalmente detectar esse misterioso e tão buscado sinal.
Se forem bem-sucedidos, os astrônomos finalmente terão a oportunidade de espiar um pouco desse período mais antigo do universo, bem como testar e confirmar teorias sobre como e quando ocorreram os principais eventos na evolução do nosso universo.
“A época da Reionização e a Idade das Trevas que a precede são períodos críticos para a compreensão das características do nosso universo, por exemplo, por que temos algumas regiões cheias de galáxias e outras relativamente vazias, a distribuição da matéria e potencialmente até da matéria escura e energia escura”, esclareceu Morales.
Um artigo sobre o estudo foi publicado na revista científica The Astrophysical Journal. [UniverseToday]