Procrastinação: a verdadeira natureza desse comportamento e como contorná-lo
Em algum momento da vida, todo mundo já adiou tarefas importantes para ficar à toa. Isso é normal.
No entanto, pesquisadores dizem que a procrastinação crônica é uma estratégia emocional para lidar com o estresse, e pode levar a problemas significativos nos relacionamentos, na profissão, nas finanças e na saúde.
Se você quer – ou precisa – parar de procrastinar, estudos recentes reúnem algumas dicas que podem te ajudar.
O que é procrastinação
Cientistas definem a procrastinação como o atraso voluntário de uma ação, apesar das consequências negativas futuras previsíveis. É optar pelo prazer ou humor de curto prazo às custas do longo prazo.
O comportamento não deve ser confundido. Por exemplo, se você não terminou de preparar uma apresentação no fim de semana porque recebeu hóspedes em sua casa, isso é apenas atraso intencional com base em uma decisão racional, explica Timothy Pychyl, professor de psicologia na Universidade de Carleton, nos EUA, que estudou extensivamente o tema.
“A procrastinação é: ‘Eu sei que eu deveria estar fazendo isso, eu quero fazer isso, me irrita quando eu não faço’”, explica Pychyl.
Em vez de procurar um novo emprego, um procrastinador pode, por exemplo, ir para a academia, em uma atitude que os pesquisadores chamam de “compensação moral” – fazer algo para se sentir bem ou produtivo, a fim de evitar a tarefa que realmente precisa ser feita.
Por que isso acontece
Procrastinadores crônicos geralmente se equivocam sobre por que procrastinam e o que isso significa. Muitos acreditam que não podem começar uma tarefa porque querem fazê-la perfeitamente e não sabem por onde iniciar.
No entanto, de acordo com Piers Steel, professor de comportamento organizacional na Universidade de Calgary, no Canadá, estudos mostram que a procrastinação crônica não é realmente ligada ao perfeccionismo, mas sim à impulsividade, que é uma tendência de agir imediatamente. Pessoas altamente impulsivas “desligam” quando sentem ansiedade. Elas têm dificuldade em lidar com emoções fortes e querem fazer algo para se livrar dos sentimentos ruins.
Algumas pessoas afirmam que propositadamente deixam as coisas para a última hora porque trabalham melhor sob estresse, mas os verdadeiros procrastinadores ficam estressados pelo atraso. É discutível se a qualidade de seu trabalho é realmente melhor do que se tivessem começado mais cedo, segundo Pychyl.
Especialistas dizem que as consequências da procrastinação crônica ou extrema podem ser sérias: casamentos acabam, pessoas perdem seus empregos e muitas vezes se sentem como impostoras.
Terapia online
Em agosto, pesquisadores da Universidade de Estocolmo, na Suécia, publicaram um dos primeiros ensaios clínicos randomizados sobre o tratamento da procrastinação. Constatou-se que terapias online podem reduzir significativamente o comportamento.
Os cientistas testaram se uma terapia de autoajuda poderia ter um efeito sobre as formas mais graves de procrastinação.
Cerca de 150 participantes que se diziam procrastinadores participaram da pesquisa, liderada por Alexander Rozental, psicólogo clínico e estudante de doutorado. Eles foram aleatoriamente designados para completar a intervenção de três modos: por iniciativa própria, com a orientação de um terapeuta ou ficaram em uma lista de espera que serviu como grupo de controle. O tratamento consistiu em 10 módulos semanais.
Como funciona
Um componente do programa focou na definição de objetivos, tais como quebrar metas de longo prazo em objetivos menores e mais concretos. Por exemplo, os participantes foram instruídos a serem específicos ao criarem metas gerenciáveis, como “trabalhar em um artigo durante uma hora às 11:00 da próxima terça-feira”.
A intervenção também empregou um sistema de recompensa. Os participantes podiam se dar uma xícara de café ou uma pausa após realizar minimetas, ao invés de esperar até terminar o objetivo global.
Outro módulo envolveu expor procrastinadores a sentimentos ou pensamentos estressantes em breves períodos, gradualmente mais longos. O objetivo é ajudá-los a sentir que são capazes de gerir as suas emoções, e que não devem segui-las instintivamente.
Os resultados mostraram que, após as intervenções guiadas e não guiadas, as pessoas melhoraram sua procrastinação, embora a terapia guiada pareceu mostrar maior benefício. Os pesquisadores pretendem olhar para os resultados um ano mais tarde para ver se eles foram mantidos.
Saúde física
Fuschia Sirois, professora de psicologia na Universidade de Sheffield, na Inglaterra, recentemente começou a estudar os efeitos da procrastinação em doenças crônicas.
Os efeitos de saúde mental da procrastinação são bem documentadas: procrastinadores habituais têm taxas mais altas de depressão e ansiedade e pior bem-estar. Pouco é conhecido sobre os efeitos físicos, entretanto, especialmente graves problemas de saúde.
Dra. Sirois e seus colegas descobriram que procrastinadores com hipertensão e doenças cardíacas eram menos propensos a se envolver em estratégias ativas para o enfrentamento da doença, tais como encontrar um significado ou tomar medidas para melhorar. Eles eram mais propensos a adotar comportamentos desajustados, como culpar-se pela a doença e tentar esquecê-la.
Visão do futuro
Os psicólogos também estão estudando outras maneiras pelas quais as pessoas podem ser capazes de reduzir a procrastinação, tais como melhores estratégias de regulação da emoção e visões do futuro.
Procrastinadores muitas vezes parecem incapazes de ver claramente suas escolhas e comportamentos no futuro, um fenômeno chamado de “miopia temporal”. A visão de seus “eus futuros” muitas vezes é mais abstrata e impessoal, e eles são menos ligados emocionalmente aos seus futuros. Miopia temporal pode ser em grande parte devido a seus altos níveis de estresse que mudam seu foco para preocupações mais imediatas, em vez de distantes.
A Dra. Sirois, o Dr. Pychyl e outros pesquisadores estão testando intervenções para ajudar os procrastinadores a melhor prever e se conectar com seus eus futuros. Focalizar na gestão do tempo irá ajudá-los, mas o componente emocional deve ser abordado também.
Outro problema é a reparação do humor de curto prazo como uma estratégia antiprocrastinação. Isso envolve ensinar as pessoas a reconhecer que elas podem ter fortes emoções, como ansiedade, no início de um projeto, e que não devem julgar-se por isso.
Pequenas ações, grandes resultados
O Dr. Steel está ajudando a desenvolver um novo software com uma empresa de Hong Kong, Saent, destinado a atrasar o carregamento de sites como o Facebook por 15 segundos ou mais, além de criar a necessidade de uma senha antes de navegar na web, por exemplo.
Às vezes, esses pequenos “esforços” são tudo o que é preciso para dissuadir os procrastinadores de procurar uma distração.
“Se você é um procrastinador ocasional, pare de pensar sobre seus sentimentos e pule para a próxima tarefa”, diz o Dr. Pychyl. “Mas se você é um procrastinador crônico, pode precisar de terapia para entender melhor suas emoções e como você está lidando com elas através do adiamento de tarefas”. [WSJ]
1 comentário
Mas com saber se não é apenas preguiça?