Alguns tratamentos alternativos deixam o paciente com uma vaga sensação de bem estar. Então, por que não deixar que eles sigam estes tratamentos?
Esta discussão está acontecendo nos Estados Unidos, onde existe um mercado florescente para a medicina alternativa, e alguns cientistas acham que a desculpa de que os pacientes se sentem bem não é suficiente para justificar a prática.
Afinal de contas, o que há de errado em uma medicina não ortodoxa, milenar e não comprovada pela ciência moderna? Pergunte isto para os rinocerontes, que estão sendo levados à extinção pelo uso supersticioso de seus chifres na Medicina Tradicional Chinesa.
Mas este é um caso extremo. A maioria dos tratamentos alternativos envolve cheirar perfumes, deitar pedras nas costas, sofrer picadas de agulha, contorcer todas as juntas e músculos do corpo, ou beber um “remédio” que é praticamente água pura (e cara).
Mal não faz?
Muitos céticos podem até pensar “mal não faz, então não tem problema algum”. Além do mais, estas medicinas alternativas são usadas, no máximo, como tratamento alternativo, então por que não?
O oncologista e professor de cirurgia na Wayne State University, David Gorsky, acredita que este tipo de permissividade está abalando os fundamentos da ciência e medicina acadêmica. Mais ainda: esta indiferença estaria abalando os fundamentos do método científico e atacando a integridade da profissão médica.
Gorsky não poupa adjetivos ao descrever o que ele pensa da integração da medicina baseada em ciência com a medicina alternativa, baseada em pseudociência: “Integrar pseudociência com medicina baseada em ciência não vai tornar melhor a medicina baseada em ciência. Um dos autores do nosso blog, Mark Crislip, tem um ditado fantástico para isto: ‘Se você misturar esterco com uma torta de maçã, o esterco não vai melhorar de sabor, mas a torta de maçã vai ficar com gosto ruim”.
Um dos problemas que incomoda Gorsky são os testes clínicos feitos com “medicina alternativa”, como os testes feitos com Reiki e homeopatia. A medicina baseada em evidências tem várias etapas que devem ser cumpridas antes de um teste clínico. De forma bem resumida, antes de um novo tratamento ser aprovado para testes clínicos (sim, a medicina ocidental também tem “medicina alternativa”), ele tem que primeiro passar por testes com culturas de célula e estudos in vitro, depois para testes com animais, e finalmente em testes clínicos, que também são feitos em pelo menos três etapas.
Passando por todas estas etapas, O medicamento ou tratamento é submetido para os órgãos de saúde para que seja liberado seu uso pela comunidade médica. O que antes era uma hipótese, sem nenhuma comprovação, se torna um medicamento ou tratamento clínico com eficácia, efeitos colaterais, indicações e contra-indicações conhecidos.
Fazer um teste clínico de uma terapia alternativa que não tem um princípio científico claro, ou pior, tem princípios que claramente violam as leis da natureza. Isso equivale a destinar a escassa verba de pesquisas em testes com pessoas a um tratamento que não passou por nenhuma outra etapa de estudo, caindo “de paraquedas” na etapa final, aquela em que o suposto medicamento sem comprovação nenhuma é testado em pacientes, em gente doente que está precisando mais de um tratamento do que de um hocus-pocus.
E os resultados?
O curioso é que, de todos os testes que foram feitos até agora na medicina alternativa, os resultados são inconclusivos ou negativos. Não há nenhum claro indício que consiga superar a chamada “hipótese nula”, ou seja, a hipótese de que o tratamento não funciona.
Todo tratamento é testado partindo do princípio que ele não funciona, a “hipótese nula”, e os pesquisadores devem procurar indícios que refutem esta hipótese.
Tomando como exemplo a homeopatia, até hoje, depois de mais de 3.000 testes clínicos, nenhum pesquisador conseguiu refutar a hipótese nula em relação à ela. Com a acupuntura, o Reiki, florais de Bach e mais um monte de outros tratamentos pseudocientíficos dá-se o mesmo.
Outro problema que Gorki aponta é o uso de “coisas mundanas” como se fossem medicamento, medicalizando o que não era considerado medicina. A massagem é apontada como um exemplo. Segundo ele, não há nada intrinsecamente errado com a massagem, mas quando se começa a fazer alegações terapêuticas sobre ela, isso é medicalizá-la.
Josephine Briggs, diretora do National Center for Complementary and Alternative MedIcine – NCCAM (“Centro Nacional para Medicina Complementar e Alternativa”), do National Institutes of Healt – NIH (“Instituto Nacional de Saúde”) concorda em parte com Briggs. “Eu fico horrorizada quando leio ou ouço sobre terapias alternativas que são empurradas a pacientes quando existe uma outra terapia efetiva”.
Um exemplo que ela aponta é o do câncer, com terapias alternativas, herbais ou outras besteiras sendo frequentemente empurradas para pessoas doentes e vulnerabilizadas. Apesar disso, ela mesma tenta salvar as aparências com a acupuntura, dizendo que o NCCAM financiou vários estudos e que, apesar de não serem muito fortes, há evidências que a acupuntura sirva como um estímulo.
Gorki contrapõe apontando que, embora adultos competentes possam escolher o que querem fazer, poucas vezes eles recebem informações completas e verdadeiras sobre o hocus-pocus que lhe está sendo oferecido.
E no Brasil?
O uso de medicina alternativa, aquela medicina que, lembramos, não tem comprovação científica de sua eficácia (com exceção de alguns produtos fitoterápicos que já foram analisados e que podem ser conferidos na RESOLUÇÃO – RDC Nº 10, DE 9 DE MARÇO DE 2010), é bastante avançado no Brasil.
Há, aqui, pelo menos um Hospital de Medicina Alternativa e o governo federal investiu em 2008 R$ 2.953.480,00 em consultas homeopáticas, R$ 84.649,00 em moxabustão (queimar uma folha em cima de um ponto de acupuntura), e R$ 3.960.120,00 em acupuntura. Foram R$ 6.998.249,00 (praticamente R$ 7 bilhões) aplicados em uma medicina que, em todos os testes feitos, apresentou resultados negativos ou dúbios.
Além de toda esta verba gasta com a medicina alternativa, ainda temos o problema do uso de medicina alternativa em casos onde já existe tratamento com bases científicas com eficácia conhecida, como no caso do tratamento de dengue hemorrágica com homeopatia feito pela Prefeitura de São José do Rio Preto. [io9, Portal Educação, Diario da Saude]