Chimpanzés lembram os rostos de velhos amigos e familiares por décadas

Por , em 22.12.2023

Louise, uma bonobo, havia passado mais de duas décadas e meia separada de sua irmã e sobrinho. Contudo, ao avistá-los em uma tela digital, ela imediatamente os reconheceu, fixando-se atentamente em seus rostos. Esse reconhecimento é notável, especialmente considerando que Louise é uma bonobo que passou a maior parte de sua vida em um santuário diferente do de seus parentes.

Relatado recentemente nos Anais da Academia Nacional de Ciências, esse achado ilumina o fato de que primatas próximos aos humanos possuem a habilidade de lembrar-se dos rostos de parentes e amigos por longos períodos, às vezes estendendo-se por anos ou até décadas. Este estudo aponta que a capacidade de memória social duradoura não é exclusiva dos humanos, contrariando crenças anteriores.

Frans de Waal, um especialista em primatologia da Universidade Emory que não participou do estudo, considera isso uma descoberta extraordinária. Ele observa: “Tenho dúvidas se nós, humanos, conseguimos recordar muitas pessoas que não vemos há duas décadas.” Ele sugere que a pesquisa abre a possibilidade de que outros animais possam ter essa habilidade e podem estar recordando muito mais do que normalmente atribuímos a eles.

Descobrir se primatas não humanos conseguem lembrar rostos não é uma tarefa simples. Não é possível simplesmente perguntar a eles, então, no estudo recente, o psicólogo comparativo Christopher Krupenye, da Universidade Johns Hopkins, e sua equipe utilizaram tecnologia de rastreamento ocular. Isso envolve câmeras infravermelhas que monitoram de forma não invasiva para onde o sujeito está olhando enquanto visualiza imagens de indivíduos ou objetos.

Os pesquisadores envolveram 26 chimpanzés e bonobos de três zoológicos ou santuários na Europa e no Japão. Esses animais foram expostos a fotografias em uma tela, mostrando os rostos de dois primatas lado a lado por três segundos. Algumas fotos eram de primatas desconhecidos; outras, de amigos, adversários ou familiares de seus círculos sociais passados, que eles não viam há anos.

Os chimpanzés e bonobos passavam aproximadamente um quarto de segundo, ou 11% a 14%, mais tempo olhando para os rostos de primatas que conheciam anteriormente e com os quais tinham associações positivas, em comparação com rostos desconhecidos. Em alguns casos, o sujeito não via o primata na imagem há 5 a 10 anos e, no caso de Louise, por mais de 25 anos.

Essa rápida, mas consistente, reação de reconhecimento reflete descobertas em pesquisas semelhantes envolvendo bebês, que também tendem a olhar mais tempo para rostos familiares. “É como quando você encontra alguém na rua que não via há anos e fica surpreso”, explica a investigadora principal do estudo, Laura Lewis, antropóloga evolutiva da Universidade da Califórnia, Berkeley.

Os animais focaram mais tempo nas imagens de primatas com os quais compartilharam experiências positivas, como ex-membros do grupo que se engajaram em atividades de grooming ou brincadeiras com eles. Eles não demoraram tanto observando os rostos de antigos parceiros sexuais, conhecidos distantes ou indivíduos que os haviam machucado ou assustado.

Vários animais, incluindo golfinhos, elefantes e cães, reconhecem indivíduos familiares por meio de pistas auditivas ou olfativas. No entanto, a habilidade de lembrar visualmente o rosto de um amigo após anos de separação era considerada uma característica única dos humanos, crucial para a sobrevivência de nossos ancestrais, observa de Waal. Reconhecer um amigo ou inimigo permitia aos humanos renovar alianças e trocar recursos em tempos difíceis. Ele acrescenta que, uma vez que os chimpanzés formam sociedades complexas e hierárquicas que frequentemente se dividem em grupos menores, a habilidade de lembrar aliados é provavelmente vantajosa para eles também.

Rachna Reddy, uma antropóloga biológica da Universidade de Utah que não participou do estudo, nota que jovens primatas passam por períodos intensos de aprendizado social, semelhantes aos adolescentes humanos. Esse aprendizado pode ajudá-los a discernir quais indivíduos são confiáveis, especialmente importante para jovens fêmeas que se preparam para deixar seus grupos natais. Reddy acredita que este estudo oferece uma visão sobre a vida emocional intensamente rica dos chimpanzés. [Science]

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